O posicionamento do Brasil na crise Rússia X Ucrânia
por Francisco Gomes Júnior
Depois de semanas de tensão, houve uma
escalada no clima bélico entre Rússia e Ucrânia, com o reconhecimento por parte
do Governo Putin da independência das regiões separatistas da Ucrânia, as
autoproclamadas “repúblicas” de Donetsk e Lugansk.
Com o reconhecimento da independência, o
governo russo diz que enviará tropas para essas regiões, com a missão de
“preservação da paz”. Na prática é uma invasão do território ucraniano pelas
forças de Putin.
A Rússia invadiu a Ucrânia em 2014 e
anexou a Criméia (região sul da Ucrânia) a seu território. Na ocasião firmou-se
um cessar fogo, inclusive estabelecendo-se uma linha geográfica que não poderia
ser ultrapassada pela Rússia, que se comprometeu a respeitar a soberania
ucraniana.
A Ucrânia desde então vem se aproximando
da Europa ocidental e dos Estados Unidos e manifestou interesse em integrar à
OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). A Rússia não admite a adesão
da Ucrânia à OTAN alegando que isso representaria uma ameaça à sua segurança,
pela possibilidade de tropas e equipamentos militares da OTAN serem instalados
próximos a sua fronteira.
A invasão da Ucrânia teve início e resta
observar se será intensificada gerando uma expansão do conflito. Mas qual deve
ser o posicionamento do Brasil? Temos a liberdade de escolher a qual lado
aderir ou mesmo manter a neutralidade?
O Brasil possui uma tradição de
incentivar a resolução de conflitos pela via diplomática e muitas vezes em
conflitos em fronteiras prefere manter uma posição de neutralidade. Entretanto,
este caso é diferente, o que se tem é a violação das fronteiras de um país e de
sua soberania através da evidente invasão territorial pelo exército russo. E a
Constituição brasileira determina o respeito à autodeterminação dos povos e o
respeito das fronteiras dos países que tem sua independência reconhecida.
Acompanhamos recentemente que o Brasil
se insurgiu contra determinadas falas mundiais que sugeriam que a Amazônia
deveria ser um patrimônio mundial, gerido globalmente. Na ocasião, o Brasil
reafirmou sua soberania e foi taxativo de que não aceitaria nenhuma
interferência em seu território, com base nas convenções internacionais e no
direito internacional.
Mas o Brasil pode simplesmente não se
manifestar ou ficar neutro na questão ucraniana? A questão constitucional
parece clara. O Brasil pode não se envolver no mérito das discussões, pode
manter-se neutro em relação a se a Ucrânia deve ou não aderir a OTAN. Mas a
obediência aos ditames constitucionais sugere a defesa da soberania da Ucrânia.
Não se trata de preferência política, mas sim de seguir o texto constitucional.
O Presidente Bolsonaro esteve em visita
à Rússia na última semana e na ocasião expressou que o Brasil defende a paz
entre todos os países. Vimos até declarações depois transformadas em memes de que
o presidente impediu a guerra. Ao que tudo indica, a guerra é cada vez mais
iminente. Pelo relacionamento estabelecido com a Rússia e com Putin, não se
sabe se o Presidente e o Itamaraty adotarão algum posicionamento. Há alguma
consequência caso o Presidente não se posicione?
Não acredito em consequência ao
Presidente, pois isso demandaria uma vontade política do Parlamento brasileiro
que parece não existir. Mas a lei nº 1079/50 define como crime de
responsabilidade atos do Presidente que atentem contra a Constituição. E como
vimos, a norma constitucional é pela manifestação a favor da soberania dos
países e no caso a Ucrânia está tendo sua soberania violada.
Aguardemos o posicionamento oficial.
Francisco Gomes Júnior - Advogado e Sócio da OGF Advogados. Presidente da Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor (ADDP). Instagram: https://www.instagram.com/franciscogomesadv/
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