Dia Nacional da Ciência: Governo do Brasil vai na contramão do mundo, corta verbas para pesquisas e menospreza o conhecimento científico.
Por Élcio Abdalla*
O Dia Nacional da Ciência e do
Pesquisador (a) Científico (a) foi criado em 2001 com o objetivo de
conscientizar a sociedade civil sobre a importância da inovação científica para
todos, estimular pesquisas e o interesse da população. O dia 8 de julho foi
escolhido por ser também a data de criação, no ano de 1948, da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). A ciência vem mudando o mundo e
a forma como vivemos há milhares de anos, mas, a partir do século XIX as
invenções e descobertas tomaram um novo rumo e aceleraram diversos processos,
como maquinários, remédios, experiências espaciais, formas de cultivo na
agropecuária, entre outros inúmeros avanços.
Se a importância de se investir em
ciência e tecnologia foi fundamental para o desenvolvimento e progresso da
humanidade, a partir de 2020 essa percepção ficou ainda mais evidente. E,
talvez em um dos poucos momentos da nossa história, a ciência foi vista como
palpável, parte das discussões de pessoas de fora do ambiente acadêmico,
assunto de mesa do bar a jantares de família. O aparecimento da Covid-19, que
levou a uma pandemia global, fez com que as sociedades consultassem os
cientistas para entender o que acontecia e como poderíamos amenizar a situação.
A criação das vacinas em tempo recorde, que vêm sendo fundamentais no controle
do coronavírus em todo mundo, sacramentaram aquilo que já era real: investir,
estimular e valorizar a ciência é essencial para o progresso.
Note-se que, após o advento da ciência
moderna, sobreveio a civilização moderna. Reis e imperadores em séculos
anteriores, mesmo em países importantes e ricos da época, sofriam as agruras do
subdesenvolvimento. Mesmo Luis XIV, o Rei Sol, vivia na época pior que um
cidadão moderno.A ciência Moderna nos trouxe o desenvolvimento, a saúde, a
educação, a riqueza material, a tecnologia. Do GPS à melhor alimentação, em
tudo temos as mãos da ciência em atividade.
No Brasil, porém, vamos caminhando para
o exato oposto. O Governo Federal não só vem, desde o início da crise de saúde,
desmerecendo o conhecimento científico como vem tomando ações efetivas para
acabar com a produção científica no Brasil, cujo setor vem resistindo de forma
resiliente, mas que não sobreviverá sem investimentos.
Em maio, o governo federal oficializou
um bloqueio de R$ 1,8 bilhão no orçamento da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Pouco tempo depois, anunciou que esse valor subiria para R$ 2,5 bi, o que deve
ser decretado agora em julho. Todo esse valor deve ser retirado do FNDCT,
dinheiro arrecadado de impostos destinado especificamente para pesquisa. Ele
cairá de R$ 4,5 bi para R$ 2 bi, o que significa 55,5% menos recursos do que o
orçamento efetivado em 2021. Levantamento do Conselho Nacional das
Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica
e Tecnológica (Confies) aponta pelo menos 52 projetos que serão altamente
prejudicados com esses bloqueios. Entre eles, estão os programas Ciência no Mar
e Ciência Antártica, além de pesquisas em bioinformática, mitigação de mudanças
climáticas e nutrição e defensivos agrícolas sustentáveis, entre outros.
Para o futuro do Brasil, esse desprezo
pela ciência vai custar caro. Os quatros países que mais investem em pesquisa
estão na frente em inovação. Eles são Coreia do Sul e Alemanha, que investem
quase 4% em pesquisa; e Japão e Estados Unidos, que repassam cerca de 3%. No
Brasil, esse montante é um pouco maior que 1%. E vale lembrar: essas quatro
nações têm PIB maior que o nosso. Ou seja, elas direcionam mais dinheiro não só
percentualmente, mas também, e principalmente, em valores absolutos.
A pandemia da Covid-19 deixou ainda mais
claro o gap entre os países líderes em ciência. Nos EUA, só para pesquisas
envolvendo a Covid-19 foram destinados mais de 6 bilhões de dólares. No Brasil,
apenas US $100 milhões. As vacinas vêm se mostrando efetivas na preservação de
milhares de vidas e, graças à ciência, foram desenvolvidas em tempo
recorde.
E, embora o cenário atual tenha mostrado
a importância do investimento em pesquisa, a ciência está presente além da
medicina.
Como no caso do radiotelescópio BINGO,
inédito no país e que conta com pesquisadores do Brasil, da China, África do
Sul, Reino Unido, Coréia do Sul, Portugal e França. O objetivo é explorar novas
possibilidades na observação do Universo a partir do céu brasileiro. Entender e
conhecer o nosso céu traz conhecimentos importantes e estratégicos sobre o que
acontece em cima de nós, quais fenômenos, que tipo, por exemplo, de satélites,
estão passando por aqui. É informação importante para toda a sociedade.
*Elcio Abdalla é físico teórico brasileiro com reconhecimento internacional e importante liderança na pesquisa de física teórica no Brasil. Com doutorado e pós-doutorado pela Universidade de São Paulo, é atualmente professor titular do Instituto de Física dessa universidade, além de coordenador do Projeto Bingo, radiotelescópio brasileiro que está sendo construído no interior da Paraíba que fará o mapeamento da parte escura do universo e estudará sua estrutura intrínseca.
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