Programa para criação de filhos antirracistas é lançado para organizações brasileiras
Novembro 2022 - De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Instituto ETHOS, apenas 8% das companhias brasileiras promovem ações para afrodescendentes.
A Filhos
no Currículo, consultoria que auxilia empresas na
criação e na revisão de políticas parentais, e o coletivo Pais Pretos Presentes,
rede de apoio para todos que lidam com o desafio de criar ou educar
pessoas pretas, se unem para criar o primeiro programa sobre a criação de filhos antirracistas nas
organizações. A parceria inclui programas que capacitam lideranças e seus
colaboradores a não só refletirem sobre a diversidade
dentro do ambiente de trabalho, mas também dentro de suas casas.
Para Camila Antunes,
cofundadora da Filhos no Currículo e especialista em parentalidade, criar filhos antirracistas é formar
pessoas e futuros profissionais que terão a diversidade e a inclusão
internalizadas desde sua formação.
Entre as propostas do
programa está a criação de pautas que sejam sustentadas no ambiente de
trabalho, que incitem os colaboradores a transmitir para seus filhos ou
enteados assuntos como a ancestralidade africana, oportunidades de acesso e
permanência em cargos para negros, espaços e oportunidades de poder, decisão e
crescimento profissional, além do envolvimento de pessoas não negras na luta
contra comportamentos, expressões e posicionamentos racistas. Segundo Camila,
pesquisas, trilhas de conteúdo e rodas de conversas com especialistas serão
utilizados para trabalhar o conteúdo.
Para Humberto Baltar, cocriador do Pais
Pretos Presentes, a palavra de ordem é intencionalidade. “Uma empresa que dá
palco para esse tipo de discussão está trazendo essa intencionalidade para a
vida dos colaboradores, principalmente os brancos, que talvez nunca tenham
considerado o assunto dentro de suas casas”, destaca.
Criar NA diversidade
Baltar frisa a relevância de criar
filhos NA diversidade e não PARA a diversidade. Ele conta que é comum aos pais
abordar o racismo apenas quando a criança presencia alguma situação de
preconceito, quando o caminho seria estimular a conversa no dia a dia.
“Os pais não sabem onde buscar material
e referências sobre o racismo, que sejam base para uma conversa em casa, e nem
se sentem preparados para dialogar sobre isso. Também não buscam orientação
diretamente com pessoas pretas de como tratar o assunto. Inclusive, muitos pais
pretos ou de crianças pretas jamais receberam informações sobre ancestralidade
africana em suas vidas”, explica.
De acordo com os parceiros da Filhos no Currículo e
do coletivo Pais
Pretos Presentes, um dos objetivos da iniciativa será
motivar esses pais de crianças, sejam elas brancas ou pretas, a estimular o
acesso delas a conteúdos que trazem personagens pretos em papel de protagonismo
já que, quando aparecem, normalmente são em papéis secundários ou menos
importantes.
“Tratar o assunto por meio de músicas,
livros, filmes, peças de teatro ou de uma história antes de dormir vai permear
o imaginário dos nossos filhos, principalmente até os seis anos de idade,
quando eles ainda não têm criticidade para uma conversa mais aprofundada. A partir
dessa idade, já é possível expor que existem diferenças na forma em que
brancos e pretos são tratados pela sociedade, além disso, tornar claro para as
crianças pretas seu espaço de poder e decisão no mundo, e ensinar filhos
brancos a questionarem e a defenderem abordagens racistas quando acontecerem
com seus amigos pretos”, destaca Camila.
Baltar aponta a necessidade de
verificar se a escola do seu filho possui temáticas étnico-raciais e de
diversidade na grade escolar, sobretudo sobre a história e a cultura
afro-brasileira e africana, e outras
referências, que não sejam apenas a escravidão – a Lei
10.639/03, de 2003, estabelece
obrigatório o ensino de "história e cultura afro-brasileira" nas disciplinas
dos ensinos fundamental e médio, oficiais e particulares.
“Cerca de 72,9% de desempregados no
Brasil e 71,7% dos jovens fora da escola são negros (IBGE). Isso precisa
ser mais abordado como uma pauta dos gestores. Um problema estrutural e multifatorial, como o
racismo, demanda uma
solução interdisciplinar e intersetorial, envolvendo as
famílias, escolas, órgãos independentes e as empresas. Temos expectativas altas
quanto ao interesse das lideranças em tratar o tema com um olhar abrangente,
envolvendo os colaborados e a responsabilidade delas na criação de futuros
brasileiros antirracistas”, frisa ele.
"Parentalidade é um caminho para tratar todos os assuntos e dilemas que permeiam a sociedade, afinal, quem não tem filhos, é filho de alguém, ou convive com crianças. Portanto, é um assunto que toca todas as pessoas. Estamos falando de um dos caminhos pelo qual as empresas podem tratar pautas sensíveis como machismo, equidade de gênero, inclusão de pessoas com deficiência, além, é claro, de racismo - tema ainda pouquíssimo presente nas pautas corporativas já que apenas 8% das empresas brasileiras promovem ações voltadas para afrodescendentes, segundo a pesquisa BID. São temáticas fundamentais que precisam ser levantadas dentro das organizações”, completa Camila.
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