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Desafios do crescimento e do emprego em 2015

Clemente Ganz Lúcio*

O Brasil enfrenta severas dificuldades para sustentar o desenvolvimento, entenda-se, promover um tipo de crescimento econômico de mercado que gere bem-estar e qualidade de vida para todos que vivem neste vasto território, recuperando e preservando o meio ambiente.

O último ciclo de crescimento foi acionado pelas exportações e pelo mercado interno. De um lado, a crescente demanda externa de minérios e alimentos com preços em alta, de outro, uma engenhosa política distributiva e de geração de emprego que acionou um vigoroso mercado interno de consumo. Resultado: dobrou o mercado formal de trabalho, com a geração de milhões de empregos, redução do desemprego, crescimento dos salários e recolocação da centralidade da perspectiva igualitária para o projeto de nação. O Estado ampliou a receita e pode fazer mais gastos sociais e retomar investimentos. Animado o consumo, o capitalismo brasileiro acionou a resposta empresarial de atender a demanda para auferir ganhos. O espírito animal do empresário, que só se manifesta quando há segurança da demanda e apoio ao investimento, novamente emergiu.

Em 2008, eclodiu a gravíssima crise internacional que reduziu a demanda mundial. Os preços internacionais caíram e o mercado interno passou a consumir cada vez mais produtos importados. Desde longe, início dos anos 1990, o país descuidou do desenvolvimento industrial, primeiro com a abertura comercial muito mal conduzida, segundo, com uma longa valorização cambial com alta volatilidade, acrescida de déficit educacional, fragilidade em ciência, tecnologia, inovação, baixa agregação de valor em setores intensivos no emprego etc. A indústria despencou quando deveria ser a alavanca do crescimento e a base do desenvolvimento.

Agora, a economia patina, com redução do nível de atividade e dos ganhos da atividade produtiva, o que promove queda de arrecadação pública, agravada pelas grandes desonerações feitas para compensar distorções e segurar empregos, pelo aumento de necessários gastos sociais, pela queda na criação dos empregos, pelo novo aumento de dispêndio com a dívida pública etc. A insegurança coloca os agentes econômicos na defensiva. Começa um ciclo restritivo. Este ciclo levará rapidamente ao desemprego, à queda dos salários, do consumo, da receita pública e dos ganhos das empresas, que geram sucessivos ciclos restritivos. Isso é a recessão: fácil de entrar, dificílimo de sair!

Por isso, como nos disse João Guilherme nesta semana na mesma coluna, nossa primeira prioridade é dizer não à recessão!

Para isso, é preciso construir uma política econômica cuja estratégia seja promover uma rápida transição para um novo ciclo (intencionalmente longo!) de crescimento sustentado no emprego e no incremento da produtividade do capital, do trabalho e do estado.

Do lado sindical, o emprego deve ser a prioridade fundamental e o centro da estratégia de crescimento. Há um ajuste fiscal a ser feito para animar a economia e não derrubá-la ainda mais. Precisa estar orientado para o crescimento, para a ampliação da capacidade do estado de articular o investimento e os gastos que animam a demanda, seja pela sustentação da renda das famílias, pela proteção dos empregos e, principalmente, pelo aumento do investimento e incremento da produtividade.

A política econômica deve vigorosamente retomar o desenvolvimento industrial com uma política cambial competitiva, que esclareça a sociedade sobre os custos de curto prazo (inflação, salários etc.) e os ganhos estruturais de médio e longo prazo (crescimento, indústria, emprego etc). É preciso que, na “pátria educativa”, o cidadão que daí emerge seja capaz de produzir ciência, criar tecnologias que se transformam, no chão da empresa, em inovação. É necessário agregar valor nas nossas vocações econômicas que nos permitam participar do comércio mundial em condições de equilíbrio e atender à demanda interna gerando empregos de qualidade aqui.

Nesse caminho, é urgente a atenção prioritária para as micro, pequenas e médias empresas; considerar que a reforma do espaço urbano, que já recepciona mais de 80% da população brasileira, é uma oportunidade de sustentar demanda industrial, gerar milhões de empregos; melhorar o espaço coletivo e a qualidade de vida, com habitação, transporte, água, saneamento, creches, entre tantos outros investimentos; aprofundar o desenvolvimento rural.

Não se pode deixar, de maneira nenhuma, que a Operação Lava Jato destrua a engenharia nacional e as empresas nacionais de ponta (Petrobras e construtoras). É urgente construir uma ação de reestruturação que preserve nosso patrimônio nacional de engenharia, grande parte assentado nos milhões de empregos que tornam vivas a capacidade de construir o nosso desenvolvimento.

Assim pensam muitos dirigentes e intelectuais. É imperioso unir forças, reunir propostas e projetos, construir acordos e compromissos. É urgente um novo protagonismo econômico que exija um entendimento político que oriente as escolhas e sustente os custos da transição. Fazer da crise econômica uma oportunidade para a disputa política poderá resultar em uma tragédia para o crescimento, com conflitos e custos sociais incalculáveis e a irreparável perda do sentido da igualdade e da democracia para o nosso desenvolvimento.

*Sociólogo, diretor técnico do DIEESE, membro do CDES – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

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