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Veta, Paes! O Rio não quer o título de ‘Capital Mundial da Mendicância’

Lei aprovada pelos vereadores quer proibir que se crie obstáculos para que os moradores de rua durmam ou morem neste ou naquele local público. O Diário do Rio apóia que se tire as pessoas das ruas em vez de facilitar que mais e mais indivíduos percam sua dignidade nelas.

Foi aprovado na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro um projeto de lei do vereador Chico Alencar (PSol) que – se sancionado pelo Prefeito Eduardo Paes – impedirá o que alguns chamam de “arquitetura hostil“, que seria o uso de pedregulhos, pedras, cacos de vidro e outras construções feitas com a finalidade de impedir que um determinado local público seja usado por moradores de rua para dormir, ou habitar de forma mais permanente. Inclusive, a crescente glamurização dos que habitam as ruas já foi motivo de editorial aqui no DIÁRIO DO RIO, que teve resposta de Alencar. A tal lei, se aprovada, dá, virtualmente, ao Rio o título – nada desejado pelo mundo, mas aparentemente aqui considerando uma maravilha – de CAPITAL MUNDIAL DA MENDICÂNCIA.

É claro que ao vereador psolista não faltam boas intenções. Mas a verdade é que lugar de ser humano não é na rua. Em vez de querer promover que a cidade se transforme na primeira capital “homeless friendly” do mundo, e dispute algum tipo de prêmio no estilo “cidade amiga do morador de rua“, o ideal é que se lute por melhores acomodações para os sem-teto e adictos em geral que perambulam, como zumbis, por algumas de nossas praças e espaços púbicos – e, óbvio, que trabalhemos juntos pela existência de cada vez menos pessoas nessas degradantes condições.

A atual secretária de assistência social Laura Carneiro tem trabalhado por isso, buscando que a municipalidade mantenha abrigos que respeitem a dignidade de quem realmente precisa, e que não sejam meros depósitos de gente. Mas ela está meio que de mãos atadas. Se não realiza os “acolhimentos” que a sociedade deseja com a rapidez que todos queremos é porque, infelizmente, há 9 anos, a prefeitura assinou com o Ministério Público um Termo de Ajustamento de Conduta no qual aceitou a tese de que o ingresso dos moradores de rua adultos na rede socioassistencial da Prefeitura pressupõe a sua livre adesão. Ou seja, basicamente essas pessoas teriam o direito de morar nas ruas, escolher um ponto que acham mais bacaninha, se estabelecer nele, e lá permanecer. Na época, o secretário que foi o principal responsável pela assinatura deste documento que acabou por transformar a cidade numa versão piorada do filme Mad Max misturada com os piores capítulos de The Walking Dead, foi Rodrigo Bethlem, então responsável pela pasta da Assistência Social. Pressionado pelo MP na época, amarelou.

Pois é. Chega de falácia da esquerda e também de falácia da direita. A tomada de assalto de nossa cidade pelos mendigos, moradores de rua, cracudos e pedintes de todo o gênero não foi crise econômica nenhuma. Não foi o petê. Não foi o Bolsonaro. Foi a assinatura deste TAC, que teve efetivamente um efeito de SENTENÇA DE MORTE para a ordem, a limpeza, a ambiência e a organização da cidade. O Rio desde então passou a sofrer mais das mesmas mazelas de sempre, só que multiplicadas exponencialmente, graças a uma decisão referendada por Bethlem – então uma espécie de Xerife da cidade, que se tornaria no futuro o estrategista de campanha do pior prefeito da história do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella.

O Rio vem passando por um sério, grave e crescente problema com os que moram nas ruas, e este problema precisa ser resolvido, e não (ainda mais) acentuado. Se parte deste problema é resultado da completa ausência de Poder Público, especialmente na desastrada gestão Crivella, que esteja bem claro que o agravamento desta nossa ferida crônica é resultado direto da assinatura do maldito TAC e da pressão do MP. É claro que há que se reconhecer que parte do problema é decorrente do nível de desemprego que abate nossa sociedade, da desigualdade social, e tudo o mais que já sabemos e estamos cansados de saber – isso já havia antes; qualquer cidade do mundo tem moradores de rua. Seu crescimento exponencial aqui, todavia, é consequência do TAC. Mas as dificuldades destas pessoas não serão eliminadas permitindo que durmam ao relento onde bem entendem, façam suas necessidades à frente de todos ou sujem nossos espaços públicos.

Faz-se necessário também que Prefeitura e Governo do Estado se unam para recriar os Restaurantes Populares, criados durante as gestões Garotinho, que na época também criaram o Hotel Popular, uma outra iniciativa excelente e que mantinha as pessoas longe das ruas. Um lugar pra sentar e comer além de ser limpo, higiênico e contribuir para a ordem pública, dá dignidade às pessoas. Doar quentinhas, cujas embalagens são jogadas pelas ruas e calcadas e entopem bueiros e sujam toda a cidade, enquanto os moradores de rua se alimentam no chão, como porcos, pode parecer uma caridade bacana, mas na realidade desumaniza essas pessoas. Nada é mais edificante do que sentar para comer.

Deixar a cidade ficar mais suja, permitir que a sensação de insegurança aumente, fechar os olhos para os furtos de cabos e metais em geral que são vendidos a peso para receptadores em plena luz do dia, passar pano para pequenos e grandes crimes por eles cometidos, são coisas que não irão melhorar em nada sua situação. E de quebra, destruir a economia do Rio, e contribui para deixar mais e mais pessoas cada dia mais pobres; fechar cada dia mais comércios; desvalorizar cada dia mais imóveis e pontos comerciais; eliminar a chance que muitas pessoas que ainda não são moradores de rua têm de terminar assim! Quanto menos empregos, quanto mais prejuízo, quanto mais desordem, quanto mais sensação de insegurança, mais gente vai morar nas ruas. Essa equação não tem Fim. Quanto pior uma cidade aparenta ser, pior ela efetivamente será.

O que é necessário, e sobre isso é preciso que o carioca abra os olhos, é tratar o problema crescente dos usuários de drogas e adictos de todo o gênero, que são parte relevante dos que moram nas ruas. Em Copacabana, por exemplo – que não tem mais importância que nenhum outro lugar, mas é nosso principal bairro turístico, e turismo gera riqueza e emprego para todos – drogados usam seu crack livremente pelas ruas, urinam e defecam junto aos prédios, quiosques e lojas, e até cometem ato sexual na frente de todos. Recebemos inúmeros relatos. A cidade, desde a assinatura do maldito TAC, parece querer privilegiar pessoas que cometem crimes, usam drogas, sujam as ruas, emporcalham as praças, em detrimento do cidadão médio, que paga impostos e ainda tem um emprego e um teto para chamar de seu. Ainda.

Outro dia um verdadeiro Centro de Reciclagem de Lixo, em escala industrial, funcionava em plena rua Dias da Rocha no coração do bairro, com direito a caminhões e mais caminhões recolhendo e pagando a peso pelo que catam e – por favor, português claro! FURTAM essas pessoas. Muita gente está claramente ENRIQUECENDO à base da exploração dos que vivem à margem da sociedade; por exemplo, os ferros velhos que funcionam nas barbas das autoridades que fecham os olhos para isso, muitas vezes em imóveis INVADIDOS, como ocorre no Centro, na rua Senador Pompeu, ou na rua da Gamboa. Sem falar os itinerantes (caminhões e kombis), que circulam livremente pela cidade só recolhendo o objeto destes crimes, e pagando no ato, em espécie, pelo que receptam.

Enquanto isso nossos vereadores – em que mundo essa gente vive? – aprovam mais uma iniciativa que quer transformar o Rio de Janeiro na Capital Mundial da Mendicância. A criação de anteparos e obstáculos à ocupação e ao emporcalhamento do que restou em ordem na cidade é a única forma de evitar que os moradores de rua se tornem os únicos donos do Rio de Janeiro. A chamada “arquitetura hostil” na verdade é a única barreira entre o que restou da ordem, da organização e da beleza arquitetônica da Cidade Maravilhosa e a sua completa e absoluta degradação. Talvez sem volta. Hostil é viver numa cidade que precisa deste tipo de arquitetura.

Todos reconhecemos a situação de fragilidade destas pessoas. Todos concordamos que merecem dignidade, tratamento, reabilitação. Acho também que todos sabemos que estas três coisas não vão vir se permitirmos que mais e mais gente se sinta no direito de habitar a porta da sua casa, do seu comércio, do seu trabalho. Há caso de colchões de casal colocados na porta de lojas e edifícios de moradia! Todos reconhecemos que a sociedade deve acolher os necessitados, criar abrigos que não sejam apenas nas periferias – sim, você morador da Zona Sul tem que aceitar que haja uma estrutura para acolher essas pessoas na sua região também – e trabalhar para que o Poder Público atue para tirá-los das ruas e não para mantê-los nelas!

Aprovado por “votação simbólica” – que significa que os vereadores nem sequer se dignaram a registrar seus votos individualmente, à exceção dos votos contrários de RogérioAmorim, Dr. João Ricardo e da abstenção de Pedro Duarte – agora o projeto vai à sanção do prefeito Eduardo Paes (PSD), que precisa vetar o projeto! Caso nada faça, ele será sancionado tacitamente, e isso não pode acontecer. Este projeto coloca os últimos pregos no caixão da ordem urbana, preparado há anos com a rendição em forma de TAC assinada com o MP pelo ex-secretário Rodrigo Bethlem e outros. Se o prefeito de fato quer preparar o Rio de Janeiro para o futuro, trazer de volta e fazer renascer o orgulho de ser carioca, e restabelecer a ordem no município, ele não pode permitir que apenas devido às boas intenções de alguns vereadores, se sacrifique a absoluta maioria dos cidadãos em nome de uma prioridade completamente invertida, sem contar a flagrante inconstitucionalidade do projeto. Que se tire as pessoas das ruas, em vez de facilitar que mais e mais indivíduos percam sua dignidade nelas.

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