Decisão de maternar ainda é tabu para mulheres
"Trabalhamos para que a decisão de
maternar seja única e exclusivamente da mulher, e não por conta do ambiente no
qual ela está inserida", afirma Michelle Terni, CEO da Filhos no Currículo
São Paulo, 07 de março
de 2022 - “Não
tenho vontade de ser mãe e, mesmo assim, sou uma rede de apoio para as mulheres
que decidirem pela maternidade dentro da minha empresa, pois acredito que ter
filhos não é fragilidade e, sim, potência no mercado de trabalho”, afirma Talita Braga, 37,
executiva da Corteva Agriscience.
Talita, que é líder de
inclusão feminina da empresa do setor agro, deixa bem claro: “quero
intensificar o diálogo para que a mulher se sinta acolhida em qualquer cenário,
escolhendo ou não ser mãe. E isso passa por um diálogo também com os homens
sobre o papel deles como pais, gestores ou colegas de trabalho”, explica.
No Brasil, 37% das
mulheres não querem ter filhos. No âmbito mundial, o índice sobe para 72%. Os
dados são de uma pesquisa realizada pela Bayer, com apoio da Federação
Brasileira de Ginecologia e do Think about Needs in Contraception (Tanco).
O degrau quebrado
Michelle Terni, CEO da Filhos no Currículo, consultoria focada em
criar programas de parentalidade nas empresas e que desenvolve um projeto de
sensibilização na empresa na qual Talita trabalha, acredita que o receio de não
performar na carreira é um dos motivos que levam muitas mulheres a postergar ou
desistir da maternidade, e que a construção de uma cultura parental dentro das
organizações vai incentivar a mudança desse cenário.
Michelle explica que,
na trajetória profissional, as mulheres ainda encontram uma espécie de “degrau
quebrado”, uma metáfora para representar a dificuldade de muitas mulheres em
evoluir para cargos gerenciais em suas carreiras. “Quando elas estão subindo,
um “degrau” se quebra. E não é coincidência que isso acontece, na maioria das
vezes, durante sua idade fértil”, destaca.
Segundo a pesquisa
Women in the Workplace / Mckinsey 2021 sobre representação feminina no mercado
de trabalho, esse degrau fica explícito quando se percebe que 48% dos cargos de
entrada nas empresas são ocupados por mulheres, enquanto nos cargos de gerência
e diretoria elas são 35%. Para cargos C-Suíte, o índice é ainda menor, 24%.
“Propomos uma troca do OU para o E. Não é filhos OU carreira,
é filhos E carreira. Trabalhamos para que a decisão de maternar seja única e
exclusivamente da mulher, e não por medo da falta de acolhimento no seu
ambiente de trabalho. Cabe às organizações colaborarem na desconstrução desses
vieses repetidos na sociedade, entre eles o de que a mulher precisa justificar
escolhas”, explica.
Para Júlia Facure, 26,
gerente de contas estratégicas da Ambev, principalmente nos últimos anos,
mulheres que, como ela, não pensavam em ter filhos, começaram a se planejar
para isso ao notarem uma mudança de mentalidade na cultura empresarial de suas
organizações. “Acredito que a
decisão de não ser mãe deve partir muito mais de outros fatores e não do medo
de não conciliar maternidade com carreira”, conta Júlia, que
assistiu as trilhas de conteúdo contidas no programa de parentalidade da Ambev,
realizado pela Filhos no Currículo, logo após descobrir que estava grávida, o
que ocorreu pouco depois de ter se tornado a primeira mulher da companhia a
gerenciar uma operação própria no interior.
Outro ponto levantado
pela porta-voz da Filhos é a necessidade desses programas de parentalidade
reforçarem a isonomia e a equidade de gênero. “A maioria dos gestores enxerga
de forma bem diferente quando é um homem ou uma mulher da equipe que anuncia
que terá um filho. Para esse homem, a chegada de um filho representa um
“passaporte” para o mundo da responsabilidade, enquanto, para muitas mulheres,
filhos representam uma barreira na progressão de suas carreiras”, salienta
Michelle.
Para começar a tratar dessa questão estrutural, ela sugere uma primeira mudança de mentalidade por parte das organizações: “As empresas que repensarem as suas políticas com mais isonomia e levarem em consideração as novas configurações familiares e a vontade de muitos homens em construir uma relação de vínculo com seus filhos, estarão permitindo que muitos profissionais com filhos, sejam eles homens ou mulheres, sejam protagonistas em suas carreiras.”, completa.
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