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Do Racismo e Suas Formas de Manifestação


Diante do atual momento, é cada vez maior a manifestação social racista, preconceituosa, discriminatória e desigual em âmbito mundial.Nesse sentido serve o presente texto de munição protetiva e didática aos nefastos tipos de atos racistas.Antes de aprofundarmos no tema, interessante revelar uma diferença importante entre preconceito, discriminação racial, e desigualdade racial.O preconceito é um despacho ou julgamento premeditado a respeito de um grupo ou pessoa em uma certa situação, gerador de desigualdade.Com relação a discriminação racial, flagrante é a infração ao princípio humano da igualdade, sendo "toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada”, conforme o Estatuto da Igualdade Racial.O mesmo Estatuto define desigualdade racial como "toda situação injustificada de diferenciação de acesso e fruição de bens, serviços e oportunidades, nas esferas pública e privada, em virtude de raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica."

 

Com as definições apresentadas podemos dizer que o racismo se apoia ou pode ser entendido como uma intersecção entre o preconceito, a discriminação racial e a desigualdade racial, que ofende os mínimos direitos de personalidade da população negra de inúmeras formas.Diante deste simples conceito podemos afirmar que o racismo se manifesta de várias formas, como por exemplo nas hipóteses de racismo estrutural, de racismo institucional e quando há discriminação direta racial ou crime de ódio.A lei nº 7716/89, mais conhecida como lei antiracismo tipifica esse crime como qualquer manifestação que exclua ou discrimine pessoas em função de sua cor, etnia ou raça e imputa penas de prisão a quem cometer crimes de ódio ou intolerância racial.

 

Outrossim, o mesmo diploma legal, ensina que pessoas não podem ser discriminadas em contratações de empresas, concursos públicos, acesso a lojas, estádios ou quaisquer outros estabelecimentos em função de sua cor e é  proibido a divulgação de mensagens racistas e de símbolos que remetam a qualquer teoria supremacista.Em 28 de junho de 2021, a alta-comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, emitiu um apelo urgente aos Estados para que adotem uma “agenda transformadora” para erradicar o racismo sistêmico.O apelo foi feito após a publicação de um relatório sobre violações de direitos humanos, no âmbito do direito internacional, sofridas pelas pessoas afrodescendentes diariamente e em diferentes Estados e jurisdições.

 

Michele Bachelet também ditou a importância de “desmascarar as falsas narrativas que permitiram a persistência de uma sucessão de políticas e sistemas racialmente discriminatórios e possibilitaram que as pessoas e os governos negassem tanto o que ainda está acontecendo agora, quanto o que aconteceu no passado” e que “os Estados devem mostrar uma vontade política mais forte para acelerar a ação por justiça, reparação e igualdade racial por meio de compromissos específicos e com prazo determinado para alcançar resultados. Isso envolverá a reinvenção do policiamento e a reforma do sistema de justiça criminal, que sempre produziu resultados discriminatórios para pessoas afrodescendentes”, sendo “essencial que finalmente ajamos para garantir que ciclos e padrões problemáticos não continuem se repetindo. Não há desculpa para continuar evitando mudanças verdadeiramente transformadoras. Meu escritório está pronto para ajudar os Estados a buscarem mudanças transformadora em direção à justiça e igualdade”.


Na mesma esteira da Comissária, em Assembleia Geral das Nações Unidas realizada às vésperas do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial em 2022, disse o secretário-geral que, o preconceito continua a envenenar instituições, estruturas sociais e a vida cotidiana em todas as sociedades.
Nesse sentido, percebe-se que o mundo está aparentemente doente e essa doença tem que ser erradicada, pois o racismo, além de gerar sofrimento desnecessário, gera muitas das vezes perda de pessoas por violência racial.
Indispensável um novo diploma ou sinalágma social mundial visando uma justiça restaurativa, com normas e fortalecimento da igualdade entre os povos e etnias, combatendo o racismo e suas formas de manifestação através do preconceito, da discriminação racial, da desigualdade racial, do racismo estrutural, do racismo institucional e quando há discriminação direta racial ou crime de ódio.
Assim, mais do que imprescindível o Brasil cumprir com as regras da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, devidamente ratificada pelo país como norma constitucional.


De rigor, ou melhor, é obrigação da República Federativa do Brasil, face a ratificação desta Convenção Internacional, prevenir, eliminar, proibir e punir, de acordo com suas normas constitucionais, todos os atos e manifestações de racismo, discriminação racial e formas correlatas de intolerância mais especificamente no sentido de adotar medidas ou políticas especiais e ações afirmativas “necessárias para assegurar o gozo ou exercício dos direitos e liberdades fundamentais das pessoas ou grupos sujeitos ao racismo, à discriminação racial e formas correlatas de intolerância, com o propósito de promover condições equitativas para a igualdade de oportunidades, inclusão e progresso para essas pessoas ou grupos.”, bem como formular e implementar políticas cujo propósito seja proporcionar tratamento equitativo e gerar igualdade de oportunidades para todas as pessoas. Entre elas, políticas de caráter educacional, medidas trabalhistas ou sociais, ou qualquer outro tipo de política promocional, e a divulgação da legislação sobre o assunto por todos os meios possíveis, inclusive pelos meios de comunicação de massa e pela internet.


Cabendo ainda ao Brasil garantir às vítimas do racismo, discriminação racial e formas correlatas de intolerância um tratamento equitativo e não discriminatório, acesso igualitário ao sistema de justiça, processo ágeis e eficazes e reparação justa nos âmbitos civil e criminal.

 

Marcelo Válio - graduado em 2001 PUC/SP,  é especialista em direito constitucional pela ESDC, especialista em direito público pela EPD/SP, mestre em direito do trabalho pela PUC/SP, doutor em filosofia do direito pela UBA (Argentina), doutor em direito pela FADISP, pós doutor em direito pelo Universidade de Messina (Itália) e pós doutorando em direito pela Universidade de Salamanca (Espanha), e é referência nacional na área do direito dos vulneráveis (pessoas com deficiência, autistas, síndrome de down, doenças raras, burnout, idosos e doentes).

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