A nova moda é sustentável: já imaginou vestir celulose?
*Fernando Scucuglia
Em 2021, entrou em operação na América
do Sul a primeira linha de fabricação de celulose de mercado sem utilização de
combustíveis fósseis. Essa fábrica foi desenhada no conceito fóssil fuel free, e é uma das
maiores plantas do mundo não necessitando de nenhum outro combustível que não
biomassa proveniente de florestas certificadas.
O feito é um marco histórico, e ouso
afirmar que é uma questão de tempo até que outras empresas introduzam
tecnologias similares em suas unidades industriais já em operação, visando não
só eliminar o expressivo impacto ambiental proveniente da emissão de carbono em
suas operações, mas também a dependência e incertezas relacionadas às
oscilações de preços de mercado de óleo combustível e derivados.
O setor de celulose e papel acompanha o
movimento com relevantes conquistas históricas como, por exemplo: processos de
cozimentos de alto rendimento, fechamento do circuito de efluentes hídricos,
eliminação do cloro elementar no branqueamento, sistemas de tratamento de gases
odoríferos, dentre outros. Todos esses feitos de aplicação de novas tecnologias
ocorreram nas últimas três décadas e posicionaram a indústria brasileira em um status privilegiado de
competitividade não apenas com custos, mas em uma posição de vanguarda no
quesito sustentabilidade.
O processo de fabricação de celulose no
Brasil é reconhecido pelas melhores práticas de manejo florestal do mundo.
Produzimos 100% de nossa celulose por meio de florestas sustentáveis e
certificadas. Dados recentes da Embrapa apontam que apenas 1,2% da área
disponível no país é utilizada para florestas plantadas.
Em termos de processos industriais,
dispomos de circuitos bem fechados, com aproveitamento dos principais fluxos
internos de processo. O consumo de água para fabricação de celulose, assim como
a geração de efluentes, tem diminuído significativamente ao longo dos últimos
anos, com o desenvolvimento de equipamentos e processos mais eficientes em
termos ambientais.
O impacto das emissões gasosas também
tem sido reduzido, por meio dos sistemas de abatimento de alta eficiência e
aproveitamento desses fluxos para fabricação de outros subprodutos, tais como
metanol e ácido sulfúrico.
Hoje, podemos dizer que a fabricação de
fibras celulósicas produzidas no Brasil é o “estado da arte” em termos de
qualidade, custo competitivo e práticas sustentáveis.
Em um mundo hiperconectado, consciente e
com consumidores cada vez mais influentes nos rumos das economias e empresas,
não é difícil prever que as fibras celulósicas irão expandir suas aplicações de
uma maneira e velocidade que nunca vimos antes.
Em conjunto com a substituição do
plástico, um dos grandes potenciais para crescimento da indústria de papel e
celulose está relacionado com a substituição de fibras para fabricação de
tecidos, que hoje tem produção mundial estimada em cerca de 300 milhões de
toneladas.
No passado, as fibras mais utilizadas
pela indústria têxtil eram de origem vegetal ou animal. Com o aumento da
demanda global, mas com as limitações de capacidade produtiva desses materiais
e seus altos custos de obtenção, o mercado buscou alternativas e as fibras
sintéticas, provenientes da indústria petrolífera, tais como acrílico,
poliamida, poliéster, polipropileno, aramida e elastano, são responsáveis por
cerca de 70% do consumo industrial mundial.
Em 2017, um relatório da Fundação Ellen
MacArthur intitulado “A new textiles economy: Redesigning fashion's
future” (“Uma nova economia têxtil: Redesenhando o futuro da moda”) apontou que
essa indústria pode ser considerada a segunda mais poluente do planeta, não só
pelos atuais meios de obtenção de matéria-prima, processos de fabricação, mas
também devido ao desperdício, ao baixo índice de reciclagem e à falta de
alternativas de disposição final do lixo têxtil. Por exemplo, é mencionado no
estudo que a cada segundo uma quantidade equivalente a um caminhão de lixo
têxtil é incinerada ou descartada em aterros.
Neste contexto extremamente complexo e
urgente de soluções sustentáveis, a fibra proveniente de celulose está se
tornando um elemento importante da produção têxtil em todo o mundo.
A tecnologia de fabricação de tecidos a
partir de fibra celulósica não é nova, mas os recentes desenvolvimentos
resultaram em uma espécie de ressurgimento. Assim como no caso do plástico, a
indústria têxtil já apresenta alternativas viáveis para substituição da
matéria-prima atualmente utilizada por fontes renováveis celulósicas.
Em 2022, a LD Celulose iniciou as
operações no Brasil da primeira unidade de fabricação de fibras celulósicas com
o propósito único de fornecer matéria-prima para a indústria têxtil. Reforço:
não é pouco!
Considerando nossa história e
conquistas, a demanda prevista para o consumo de fibras, atual maturidade das
tecnologias disponíveis, apelo ambiental e potencial de crescimento competitivo
do setor de papel e celulose no país, não há como não ser otimista com um
futuro promissor, limpo e sustentável para todos.
E não se surpreenda se na etiqueta da
próxima roupa importada que comprar estiver escrito “100% natural cellulose fibers made in
Brazil from certified forests and sustainable processes”.
*Fernando Scucuglia é Diretor de Celulose e Energia da Valmet na América do Sul.
Nenhum comentário