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Tik Tok: uma rede mortal?

 Prof. Dr. Jack Brandão ressalta como a instantaneidade das imagens presentes nas redes pode nos tornar cada vez mais manipuláveis

Em 2020, ele foi baixado mais de 2 bilhões de vezes pelo mundo, batendo um novo recorde, segundo informações da Senso Tower: trata-se do aplicativo Tik Tok, lançado pela empresa chinesa Byte Dance, considerada a startup mais valiosa do mundo, com um valor de mercado estimado em 100 bilhões de dólares. Conhecido como uma plataforma de vídeos curtos, o Tik Tok vem atraindo público de todas as idades e transformando os minutos dedicados a ele em horas e até dias, já que muitos acabam se viciando na plataforma e não conseguem permanecer nela por pouco tempo.

Diante disso, o quanto ela pode ser prejudicial, especialmente para os mais jovens, ao fomentar a cultura do instantâneo, tão característica do meio virtual? Para o professor Dr. Jack Brandão, especialista no emprego da imagem na sociedade, a instantaneidade imagética, apresentada em aplicativos como o Tik Tok, habitua os consumidores a consumirem cada vez mais imagens, em menores intervalos de tempo. “Nós somos seres iconotrópicos, ou seja, necessitamos de imagens e, quanto mais o fazemos vorazmente, menos desenvolvemos nosso senso crítico para analisá-las.”

Dessa forma, o pesquisador ressalta que tal panorama contribui para uma sociedade apática e manipulável pelo conteúdo que lhe for apresentado. Outra questão ressaltada pelo professor são as estratégias utilizadas pelas empresas de tecnologia quanto ao emprego imagético, a fim de que possam, cada vez mais, influenciar o público de acordo com os próprios interesses. “No caso do Tik Tok, por exemplo, o curto período dos vídeos e a possibilidade de usuários assistir a eles ou descartá-los, a partir de notificações que recebem em seus celulares, configuram informações valiosas, para a empresa responsável, sobre os gostos do público.

Essa estratégia, aliada ao recurso de rolagem infinita do aplicativo, foi apontada pelo especialista em tecnologia da China, Matthew Brennan, em seu livro Fábrica de Atenção, como mecanismos essenciais para que o Tik Tok seja um dos aplicativos mais viciantes do mundo. Outra característica da plataforma apontada por Brennan é o fato de ela possuir um dos algoritmos mais sofisticados do planeta, o que a coloca à frente de várias outras plataformas virtuais.

Para Brandão, as redes sociais anteriores ao Tik Tok, como o Facebook, tinham o intuito de conectar grupos específicos. No decorrer do tempo, no entanto, os responsáveis por tais plataformas começaram a compreender o valor econômico que elas poderiam gerar a partir da criação de determinados algoritmos. “Já o Tik Tok foi criado, estrategicamente, com o intuito de filtrar informações de seus usuários de modo muito mais aprimorado, pois foi criado dentro de um contexto diferente, em que seus responsáveis já detinham muito conhecimento sobre o poder do algoritmo”, completa.

Assim, de acordo com o pesquisador, a plataforma, à medida que “conhece”, cada vez mais, os interesses de seu usuário, vai fornecendo mais e mais conteúdos coerentes com sua realidade, de modo que ele já não consiga mais se desvencilhar daquele universo, bombardeado por uma infinita quantidade de imagens.

Mas esse bombardeamento incontrolável também configura outro problema: o descontrole dos comentários feitos nos vídeos. No dia 3 de agosto, por exemplo, um adolescente de 16 anos, chamado Lucas Santos, cometeu suicídio após receber uma série de comentários ofensivos em um vídeo gravado por ele e seu amigo, postado no Tik Tok. O intuito da gravação era apenas uma brincadeira que foi mal interpretada por muitos usuários. O ocorrido acabou despertando ainda mais curiosidade sobre o vídeo que passou a ser mais compartilhado na internet.

Brandão considera tal compartilhamento uma falta de respeito com a família e conhecidos do garoto, incluindo o amigo, que é mais exposto. “As pessoas, muitas vezes, se esquecem de que por trás da imagem, há um ser humano. Nós estamos tão habituados com o consumo imagético que, muitas vezes, diante de uma tragédia, por exemplo, nossa maior preocupação é registrar o ocorrido e não se compadecer com a dor do próximo, ou mesmo, tentar ajudá-lo.” O pesquisador também ressalta que, embora seja impossível controlar todo o conteúdo postado nas redes, é possível estabelecer determinadas punições para comentários ofensivos e publicação de vídeos que exponham outras pessoas em situações delicadas.

Enfim, apesar de todos os mecanismos e manipulações imagéticas, é possível se divertir e aproveitar as redes sociais de forma saudável. Para isso, é necessário ter prudência. Afinal, é impossível negar os benefícios da tecnologia, porém é preciso usufruí-la com sabedoria e senso crítico, caso contrário, seremos meros internautas manipuláveis, à mercê de grandes empresas, e completamente dissonantes do mundo real.

Para saber mais acesse o link abaixo, com mais informações trazidas pelo pesquisador em seu canal no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=JPzmTIUkIIY

Sobre o Prof. Dr. Jack Brandão:

Doutor em Literatura pela Universidade de São Paulo (USP). Diretor do Centro de Estudos Logo-imagéticos CONDES-FOTÓS Imago Lab, editor da Lumen et Virtus, Revista interdisciplinar de Cultura e Imagem, pesquisador sobre a questão imagética em diversos níveis, como nas artes pictográficas, escultóricas e fotográficas.

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