Investigacões fronteiriças: principais desafios são discutidos em evento
Entender e respeitar as diferenças legais e
culturais dos países contribui para o melhor andamento das negociações, segundo
especialistas ouvidos em webinar sobre o assunto
“Não se sabe a
dimensão, até onde é possível chegar em uma investigação fronteiriça. Por isso,
é fundamental saber fazer as perguntas certas, ter um plano de investigação. É
importante evitar erros, controvérsias, conflitos, diferenças entre estrutura
jurídica em diversos países”. É o que destacou em sua apresentação no webinar
“Investigações Transfronteiriças: Implicações de Conformidade para Empresas
Multinacionais” o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do Brasil e atual
sócio-diretor na área de Disputas e Investigação da Alvarez & Marsal,
Sergio Moro.
Além dele, também
estiveram presentes no encontro, realizado no dia 28 de outubro de 2021, a
sócia-diretora e chefe de Investigações Forenses e Inteligência da Kroll
Brasil, Fernanda C. Barroso; a diretora global de Compliance da AML &
Sanctions Compliance – Visa, Sandra Gonoretske; a parceira sênior e chefe de
Compliance da Azevedo Sette Advogados, Isabel Franco; e o parceiro em Litígio,
Crime de Colarinho Branco e Investigações Governamentais da Akerman LLP,
Douglas B. Paul.
A organização do evento
ficou a cargo da Brazil-Florida Business Council, Inc. (BFBC), em parceria com
a Duff e Phelps, empresa da Kroll Business e patrocinadora do conselho
empresarial da BFBC. De acordo com a presidente da Brazil-Florida, Sueli
Bonaparte, uma das principais missões da BFBC é justamente oferecer uma
plataforma para que especialistas de diversos setores da economia possam
apresentar ideias e trocar experiências sobre temas de relevância para os
negócios de ambos os países.
CONDUÇÃO DAS
INVESTIGAÇÕES NO BRASIL E NOS EUA
Como mediadora do
encontro, Fernanda Barroso direcionou as perguntas aos convidados do webinar.
Ela questionou Isabel
Franco e Douglas Paul sobre os maiores desafios enfrentados em investigações
fronteiriças.
Para Isabel, as
investigações no Brasil seguem os mesmos padrões dos EUA, porém, no território
norte-americano existem leis que oferecem mais bases para a investigação.
“Os desafios são
principalmente no aspecto cultural. No Brasil, a denúncia às autoridades não é
prática comum. Brasileiros não aceitam delatores no arcabouço legal. Já nos
EUA, uma das primeiras medidas é a preservação dos documentos relacionados às
investigações. Destruição de provas é crime. No Brasil e em outros países da
América Latina, porém, não há essa percepção”, contou a especialista.
Complementando as
informações, Douglas Paul salientou que, nos EUA, não cooperar pode causar
punições. “No Brasil, no entanto, existem direitos trabalhistas e aspectos da
privacidade que precisam ser levados em conta. É fundamental ter consciência
das diferenças e saber contorná-las. Outro aspecto a ser considerado são as palavras
mais coloquiais e gírias que eventualmente são usadas nos documentos
analisados, elas devem ser entendidas. Por isso, a importância de ter pessoas
locais participando da investigação”, ressaltou Douglas.
Sandra Gonoretske
abordou as principais preocupações em investigações fronteiriças. A
especialista em compliance apontou que, em uma investigação pública, é
necessário enviar mensagens para todos os funcionários e orientá-los para não
vazarem informações para familiares ou amigos. Também é recomendável criar um
grupo específico para comunicar os fatos à imprensa e às autoridades.
“Quando se inicia uma
averiguação, é fundamental saber quais são os países envolvidos, as restrições
trabalhistas e dificuldades culturais, se tem a extensão geográfica definida, e
comunicar os procedimentos a todos os interessados ao mesmo tempo. Precisamos
ter respeito por quem está sendo entrevistado, é indiscutível que o investigado
seja entrevistado em sua língua nativa. Temos que ser ágeis e eficientes logo
no início”, detalhou Sandra.
Moro acrescentou que é
primordial entender as leis de bloqueio, pois em alguns países não se pode
conduzir entrevista privada, pode acarretar problemas. “É crucial um bom plano
de investigação, com objetivos definidos, sabendo-se que tudo pode mudar
dependendo dos achados”, afirmou o ex-ministro.
INVESTIGAÇÃO INTERNA E
EXTERNA
Em relação à
possibilidade de as investigações agora poderem ser conduzidas no Brasil por
escritórios externos e internos, Isabel Franco esclareceu que o país segue o
sistema jurídico do direito romano. “No Brasil, é direito e dever jamais
revelar o que o cliente comenta com o advogado. Esse direito varia nos países.
Por esse motivo, recomendo que as investigações sejam conduzidas por advogados
internos”.
Sergio Moro pontuou que
nos casos de investigação menos complexos, como fraudes de funcionários contra empresas,
é possível fazer as mediações sem advogados.
O ex-ministro ainda
respondeu se houve melhora no processo de obtenção de informações nos acordos
entre países. “Ocorreram diversas melhorias na cooperação internacional nos
últimos 20 anos”, disse. “De qualquer forma, a melhor maneira de coordenar as
averiguações é dirigir-se às autoridades dos outros países, a fim de verificar
se não existem restrições, se é necessário ter cooperação”.
Segundo Douglas Paul, é
sempre bom analisar dados privados. “Muitos países têm legislações que são
empecilhos. Vamos ver como será nos próximos anos. Alguns países acabarão
desenvolvendo acordos para facilitarem essas investigações fronteiriças”,
ponderou.
No final da reunião,
todos os palestrantes fizeram suas considerações a respeito do que pode
acontecer com a empresa que não segue os passos de uma investigação.
Segundo Douglas Paul,
nos EUA, existem políticas para remediar problemas e fornecer treinamento para
os funcionários. “O governo americano espera proatividade para treinamento dos
funcionários”, reforçou.
Para Sergio Moro, é
essencial corrigir erros internos que acontecem na empresa, dar respostas
claras aos funcionários, e sempre avaliar os riscos.
Na opinião de Sandra
Gonoretske, vale a pena focar nos controles e criar políticas de treinamento
para proteger a reputação da empresa.
Por fim, Isabel Franco assinalou que é imprescindível começar a remediar assim que identificar um problema que possa gerar um processo investigativo. Além disso, favorece bastante a situação, se a empresa se posicionar dizendo que identificou complicações, mas que está trabalhando para resolvê-las a contento.
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