Reforma Administrativa: busca pela eficiência ou desprestígio ao servidor de carreira?
Por Dr. Felipe Anderson Gomes da Silva*
Desde a Emenda Constitucional nº 19/1998
que consagrou o modelo gerencial de administração pública, a corrida pela busca
de efetivação do princípio constitucional da eficiência tornou-se uma máxima
dos governos. Sai governante, entra governante, cada um busca reformar as bases
da Administração Pública em prol de uma pretensa eficiência de gestão.
Administração Pública gerencial é aquela
“construída sobre bases que consideram o Estado uma grande empresa cujos
serviços são destinados aos seus clientes, outrora cidadãos; na eficiência dos
serviços, na avaliação de desempenho e no controle de resultados, suas
principais características. A Administração gerencial seria conseqüência dos
avanços tecnológicos e da nova organização política e econômica mundial, para
tornar o Estado capaz de competir com outros países”¹.
Contudo, a busca pela eficiência estatal
não pode se tornar uma medida autofágica, minando a força motriz da própria
Administração Pública, que são os servidores públicos.
Em uma medida que busca alterar as
estruturas da Administração Pública do Estado de São Paulo, o Governador João
Dória propôs sua própria reforma Administrativa por meio do Projeto de Lei
Complementar nº 26 de 2021, que se converteu na Lei Complementar nº 1.361/2021,
que foi publicada no Diário Oficial no dia 22 de outubro do presente ano.
Os principais pontos da Lei são a
criação da Bonificação por Resultado (BR), criação da Controladoria Geral do
Estado e diversas alterações no regime jurídico do servidor público que os
afetam diretamente.
Apresentaremos nesse texto algumas
alterações relativas à vida funcional do servidor público, a título
exemplificativo, haja vista que não comportaria neste artigo todas alterações
trazidas pela Lei Complementar nº 1.361/21.
Inicialmente, precisamos destacar uma
medida muito sentida pelos servidores, que foi a revogação total das faltas
abonadas.
Na antiga redação do Estatuto dos
Funcionários Públicos civis do Estado de São Paulo, as faltas abonadas eram
consideradas, para todos os fins, efetivo exercício legal, nos termos do art.
78.
O servidor podia se ausentar até o
máximo de 6 (seis) dias por ano, não excedendo a uma falta por mês, em razão de
moléstia ou outro motivo relevante, desde que requerida a seu superior imediato
no primeiro dia útil subsequente ao da falta. Contudo, com a reforma
administrativa que entrou em vigor no fim de outubro, tal proposição foi totalmente
abolida, restando aos servidores apenas as faltas justificadas ou
injustificadas em caso de ausência ao trabalho.
Ainda em relação à Lei 10.261/68, houve
alteração no instituto da licença-prêmio, que se trata de prêmio de assiduidade
que garante ao servidor o direito à licença de 90 (noventa) dias a cada período
de 5 (cinco) anos de exercício ininterrupto.
A lei considerava exercício ininterrupto
as faltas justificadas dentro deste período de 5 anos, desde que não excedesse
a 30 dias, com a nova redação dada pela Lei Complementar nº 1.361/2021, o
limite de faltas justificadas caiu para 25 dias no período de 5 anos.
Ainda em relação à licença-prêmio, a
Reforma Administrativa alterou a Lei nº 432/1985, revogando o inciso IX do
artigo 4º, que garantia o direito ao recebimento do adicional de insalubridade
por parte dos servidores que se encontrassem em gozo da licença prêmio.
Sendo assim, ao ser licenciado, o
servidor não receberá mais seu adicional de insalubridade caso o recebesse em
decorrência de suas atividades normais, o que gera uma queda considerável nos
vencimentos dos servidores, contrariando, inclusive o artigo 209 em seu
parágrafo único do Estatuto do Servidor, que dispõe que “ o período da licença
será considerado de efetivo exercício para todos os efeitos legais, e não
acarretará desconto algum no vencimento ou remuneração.”
Essas juntamente com outras medidas
decorrentes da reforma administrativa, como uma maior complexidade na concessão
do abono permanência, e ampliação das possibilidades de contratação de servidor
temporário, demonstra uma desvalorização do Governo com os servidores de
carreira, ao minar seus direitos e facilitar o ingresso no serviço público fora
do concurso público.
Diante disso, verificamos, conforme
posto inicialmente, que se trata de uma reforma que mexe bastante na vida
funcional dos servidores que são o sustentáculo da Administração Pública, o que
denota um entendimento da atual gestão que a garantia de direitos de servidores
vai de encontro a uma noção de gestão equilibrada e/ou eficiente.
Das conclusões expressas por esta
reforma, nos restam mais dúvidas do que certezas. Até onde os direitos dos
servidores públicos terão de ser solapados para garantir essa pretensa
eficiência?
¹ MAFRA FILHO, Francisco de Salles Almeida. Administração pública burocrática e gerencial. Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. 21, n. 31, p. 05, 2005.
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