Adoção de crianças não funciona no Brasil
Especialista explica como as leis do país
atrapalham processo
Uma reportagem da Veja desta semana
informou que muitos brasileiros estão indo até o continente africano para
realizar a adoção de crianças. Muitos países são procurados como Guiné Bissau,
Malawi e Etiópia dentre outros onde as adoções internacionais são realizadas.
O que leva brasileiros a atravessarem o
oceano e buscarem a adoção em outro continente é basicamente a burocracia das
leis de adoção no Brasil. Com tantas dificuldades, os agentes estatais
encarregados de aplicar as leis e efetivar as adoções no país mostram-se
ineficazes.
Enquanto a adoção no continente africano
levará entre quatro e oito meses, com muitas providências tomadas por meio
online daqui do Brasil, uma adoção por aqui pode levar até sete ou oito anos
para se efetivar.
Como a realidade geralmente suplanta a
formalidade das leis, a solução prática para muitos casais que pretendem adotar
passa a ser a adoção internacional, fenômeno que se encontra em crescimento. Se
essa tendência permanecer, parece evidente o prejuízo para nossas crianças
adotáveis, que já permanecem por longos anos em abrigos.
Como se sabe, casais adotantes no Brasil
preferem crianças recém-nascidas ou de até 4 anos de idade. Infelizmente, com o
avançar da idade torna-se mais difícil para uma criança ser adotada, ou seja,
as leis deveriam propiciar menor tempo de espera para adotantes e adotáveis,
mas se perde em providências burocráticas.
Quando se estabelece um encadeamento de
atos burocráticos (pedido inicial, recebimento, entrevistas, cursos, laudos e
relatórios) é necessário um aparelhamento estatal ágil, caso contrário,
mergulha-se em processo kafkiano sem fim. Como são muitos agentes públicos no
procedimento, ainda que algum deles (juízes, por exemplo) esforcem-se para
agilizar atos de sua competência, a remessa do processo para diferentes
instituições prorroga o trâmite por muitos anos.
Para alterar tal cenário, seria
necessário buscar uma reforma na legislação, eliminando série de atos burocráticos,
treinar todos os agentes públicos que atuam no processo e estabelecer um tempo
máximo para o procedimento. Caso não se mude a mentalidade atual, nada mudará.
Tem-se aproximadamente 5 mil crianças que aguardam em abrigos para serem
adotadas e há cerca de 38 mil pessoas na fila para adotar.
Enquanto isso, todos os anos nos
deparamos com prêmios concedidos a mutirões e iniciativas para agilizar a
adoção legal no Brasil. Iniciativas pontuais não mudam um problema estrutural
e, caso o cenário permaneça o mesmo, o número de adoções internacionais deve
aumentar, bem como as adoções à brasileira, aquela em que quem quer adotar
assume a guarda da criança (muitas vezes doadas pelas mães sem condições de
criá-la) e, posteriormente, vai em busca da regularização judicial para a
situação. Não deveria ser assim.
Francisco Gomes Júnior - Sócio da OGF Advogados. Especialista em Direito Digital e Crimes Cibernéticos. Presidente da Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor (ADDP). Autor do livro Justiça Sem Limites. Instagram: https://www.instagram.com/franciscogomesadv/
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