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Médicos Sem Fronteiras conclui projeto de saúde mental em Petrópolis

Na semana passada, organização encerrou o treinamento de cerca de 250 pessoas da área de saúde, educação, assistência social e lideranças comunitárias

Médicos Sem Fronteiras atua em Petrópolis com projeto de saúde mental
Diego Klein/MSF

Em resposta à maior tragédia já provocada pelas chuvas em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, nos últimos 90 anos, Médicos Sem Fronteiras (MSF) montou uma operação pós-desastre para fortalecer as atividades locais na área de saúde mental. Foram capacitados cerca de 250 profissionais de saúde, educação e assistência social, além de lideranças comunitárias e representantes da sociedade civil. O trabalho foi encerrado em 26 de março. “É uma ação pontual e emergencial, na qual nós reforçamos a capacidade instalada local em relação à resposta médico-humanitária em contextos de emergências e desastres naturais”, explicou Bruno Alcântara Cardoso, coordenador do projeto.

Em fevereiro deste ano, uma tempestade provocou deslizamentos de terra e o transbordamento de rios, causando a morte de mais de 200 pessoas e deixando centenas de desabrigados. Segundo as autoridades, esse foi o maior desastre já registrado na cidade.

“Eu não sei descrever o que aconteceu. Eu não consigo nem olhar muito para aquele espaço ali. Naquele espaço vago é... duro de falar.... mas eu tinha um afilhado de casamento, compadres, o afilhado do meu marido. É um momento de muita dor”, conta Maria Dutra de Moura, moradora de Petrópolis. Ela aponta para o Morro da Oficina, no bairro de Alto da Serra, que desabou, destruindo várias casas.

Poucos dias após a tragédia, profissionais da organização chegaram à região para identificar as principais necessidades. Com experiência em contextos de emergência e catástrofes socioambientais, MSF percebeu que os protocolos de atendimento em saúde mental poderiam ser ajustados e desenvolveu momentos de aprendizagem e trocas de experiências junto aos atores locais. “Em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde e com a Fiocruz, conduzimos atividades focadas em saúde mental. Percebemos que há muita capacidade técnica e muito conhecimento da região, mas, no momento de emergência, aqueles que estão mais adaptados a este tipo de situação e que não viveram diretamente os impactos da tragédia são de grande valor para colaborar na recomposição dos processos”, afirmou Bruno.

O treinamento aumenta a capacidade de resposta psicossocial local, para que o apoio chegue até a população. “O projeto tem como objetivo apoiar o município em sua estratégia de saúde mental. Criamos espaços de diálogo e de troca de experiências sobre atuação nesta área, trazendo conteúdo técnico sobre resposta de saúde mental e suporte psicossocial em cenários de emergência e desastre”, explicou Álvaro Palha, coordenador de saúde mental do projeto de MSF.

Maria Aparecida da Silva foi uma das lideranças locais que passou pela formação. Embora a sua casa não tenha sido atingida, ela conhece muitas pessoas que sofreram com os impactos da chuva. “Foi muito triste, já moro aqui há quase 50 anos e ninguém esperava por isso. Petrópolis está de luto, mas estamos tentando nos erguer. Acho que a gente tem que ter força para ajudar o vizinho, um amigo ou até um cachorro”, disse.

Muitos dos desabrigados foram acolhidos no Centro de Defesa de Direitos Humanos de Petrópolis, do qual Carla de Carvalho é coordenadora. Ela conta que a cidade está traumatizada. “Qualquer chuva ou ameaça de temporal, todo mundo entra em pânico. Ninguém pode sequer ouvir o anúncio da Defesa Civil de que vai chover. Há duas semanas aconteceu novamente. As pessoas estão com seus empregos ameaçados, com as suas casas ameaçadas e com as suas famílias ameaçadas”, relatou Carla. Com a cidade ainda se recuperando da tempestade de fevereiro, um novo temporal atingiu a região no domingo, 20 de março, causando novas inundações, deslizamentos e vitimando mais pessoas.

Carla também participou do treinamento em saúde mental de MSF. “Um grupo de fora traz vivências, experiências e olhares que a gente que está dentro do furacão não consegue parar para perceber. Então acho muito interessante. Saber que o acolhimento que a gente faz é algo que reflete psicologicamente na pessoa. Às vezes achamos que estamos simplesmente tratando a pessoa bem, dando o donativo que ela precisa, acolhendo dentro do que a gente entende, mas a gente não percebe que isso pode influenciar para que ela fique melhor ou pior”, explicou.

Crise climática e o aumento das tragédias humanitárias

Esta é a segunda vez neste ano que Médicos Sem Fronteiras realiza uma ação de capacitação na área de saúde mental em contexto de emergências e desastres no país. Entre os dias 21 de fevereiro e 11 de março, as equipes da organização também estiveram em Itabuna, na Bahia, treinando cerca de 500 profissionais da linha de frente para identificar e referenciar pacientes que necessitassem de atendimento em saúde mental. Mais uma vez, as chuvas torrenciais provocaram mortes e impactaram o bem-estar psicossocial da população.

Assim como nestas ações realizadas no Brasil, MSF tem atuado ao redor do mundo em ambientes vulneráveis à ação do clima. Em muitos países onde a organização trabalha, as equipes médico-humanitárias já estão respondendo a situações relacionadas com as mudanças no meio ambiente, que resultam em alterações nos padrões de chuva, temperatura e eventos climáticos extremos mais frequentes, como ciclones, furacões, secas e enchentes.

“As equipes de MSF são compostas de profissionais médico-humanitários, não de cientistas climáticos, mas testemunhamos diretamente como a mudança climática agravou crises sanitárias e humanitárias em diversos contextos onde atuamos”, afirma Carol Devine, conselheira para assuntos humanitários e líder de inteligência climática de MSF.

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