População fica sem medicamentos nas farmácias de alto custo. O que fazer?
*Gabriela Guerra, advogada parceria do Centro Universitário FIEO especialista em direito à saúde
A população brasileira vem sofrendo com
a falta de medicamentos nas farmácias de alto custo, tambem conhecidas como
CEAF - Componente Especializado da Assistência Farmacêutica. O serviço permite
acesso a medicamentos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e o principal
objetivo é a busca do tratamento medicamentoso integral, em nível ambulatorial,
com distribuição em todo país. Interromper um tratamento ou deixar de fornecer
um medicamento essencial para garantia da saúde de um paciente fere dois dos
princípios constitucionais mais importantes do nosso ordenamento jurídico: o
direito à vida e o direito à saúde.
De acordo com levantamento feito pelo
Movimento Medicamento no Tempo Certo (MTC), da Biored Brasil, uma rede de
defesa de pacientes, entre 1º de janeiro e 28 de fevereiro de 2022, 2.801
pacientes com doenças incuráveis, e que precisam de tratamento contínuo,
ficaram sem receber seus medicamentos essenciais.
O relatório pontou ainda que 63 medicamentos essenciais tiveram irregularidades
no fornecimento, sendo a maior parte deles de responsabilidade do Ministério da
Saúde e das secretarias estaduais. São Paulo é o líder na lista de estados com
problemas no abastecimento, com 1.663 relatos, seguido pelos estados do Rio de
Janeiro, Ceará e Minas Gerais. Entre as regiões com mais reclamações por falta
de medicamentos essenciais temos o Sudeste (70.3%), em seguida o Nordeste
(15.3%), Sul (6.1%), Norte (5.2%) e Centro-Oeste (3%).
Há uma lista com inúmeros remédios
distribuídos gratuitamente em todo território nacional. Esses medicamentos são
classificados em três grupos, de acordo com o tipo de doença: básico, incluindo
remédios para diabetes e hipertensão, estratégico, para o tratamento de doenças
como AIDS, hanseníase e tuberculose e especializado ou de alto custo, entre
eles medicamentos para o tratamento do Alzheimer, esquizofrenia, epilepsia e
esclerose múltipla e também doenças consideradas raras ou com uso contínuo como
a insuficiência renal crônica, hepatite viral B e C, osteoporose, problemas de
crescimento, espondilite anquilosante, artrite reumatóide e imunossupressão em
transplantados renais.
Na maioria das vezes esses medicamentos
têm um custo unitário elevado e como são utilizados com frequência tornam o
tratamento excessivamente caro e inacessível para grande parte da população.
O fornecimento dos fármacos é de responsabilidade
solidária do Ministério da Saúde, do Governo Federal, em conjunto com os
estados e prefeituras do país. No entanto, a má gestão e a falta de
planejamento dos responsáveis pelo fornecimento e distribuição desses
medicamentos prejudicam diretamente os vulneráveis.
No contexto que estamos, o Poder Público depende de processos burocráticos e
nem sempre tem todo dinheiro necessário para comprar os remédios. E isso
acontece por vários motivos, desde a alta flutuação do dólar, a necessidade de
realocar os recursos da assistência farmacêutica para a compra de outro
medicamento, até problemas com a logística do produto em um país de dimensões
continentais como o Brasil.
A falta dos fármacos traz inúmeros
prejuízos para a população doente, por exemplo, no caso de um paciente portador
de esclerose múltipla que utiliza mensalmente o medicamento Natalizumabe.
Os especialistas na doença de esclerose
destacam que é uma doença autoimune que afeta o sistema nervoso. Ela causa uma
inflamação que afeta o cérebro e a medula espinhal e são sintomas evolutivos. E
a descontinuidade do uso do medicamento tem como grande risco os surtos. São
crises nas quais o paciente pode desenvolver uma sequela nova, como perda de
equilíbrio e força.
Como proceder quando o medicamento não
está disponível para a população?
Diante da importância da utilização
desses medicamentos para garantir o bem-estar dos pacientes, caso o medicamento
essencial para o tratamento de determinado paciente esteja em falta, a saída é
ingressar com uma ação judicial justificando a extrema necessidade do
fornecimento dele. Será feito um pedido de tutela antecipada para que o fármaco
seja fornecido em um curto prazo sob pena de multa pelo descumprimento.
Os juízes de todo país estão cientes
que, em alguns casos, a burocracia impede que tal determinação judicial seja
cumprida com agilidade e alguns magistrados determinam que seja depositado
judicialmente o valor em dinheiro para que a compra do medicamento seja feita
pelo próprio consumidor apresentando a nota.
Importante abrir um parêntese para destacar que neste artigo trato daqueles
medicamentos de alto custo que devem ser fornecidos pelos Estados, cuja lista é
disponibilizada para a população. Quando se trata de medicamentos excepcionais
(sem registro na Anvisa), ou seja, fora da lista, o Supremo Tribunal Federal
determina que o paciente comprove alguns pontos para que as drogas sejam
fornecidas, entre eles:
- Demora da Anvisa para registro do
medicamento (mais de 365 dias);
- Existência de pedido de registro do medicamento no Brasil, salvo par a
doenças raras e ultrarraras;
- Existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no
exterior;
- Inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.
Em suma, seja por falta de estoque de algum fármaco, ausência na lista de fornecimento ou outro motivo, pelo princípio da universalidade do Sistema Único de Saúde, quando os medicamentos de alto custo não são encontrados via governo de forma administrativa, estes podem ser solicitados na Justiça e a população deve fazer uso de seus direitos para que não fique descoberta pela falta de medicamentos. Caso o paciente sofra problemas de saúde por consequência da falta de remédios que devem ser fornecidos pelo governo, cabe, em alguns casos, indenização.
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