Salário de gestante afastada do trabalho pela pandemia pode ser pago pelo INSS
Dr. Leandro Nagliate
Divulgação
A Covid-19 acomodou o home office e os
afazeres domésticos em um mesmo espaço, fez das telas dos notebooks e
smartphones janelas para encontros remotos e decisões urgentes. Sem receio de
exagerar, podemos afirmar: em dois anos, a pandemia transformou os modos de
produção não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. A contar pela Justiça
Federal de vários Estados da União, há uma determinação que muda também a forma
de pagamento do salário das gestantes afastadas do trabalho presencial e que
exercem atividades que não podem ser realizadas remotamente.
Desde maio de 2021, quando passou a
vigorar, a Lei nº 14.151 obriga o afastamento de funcionárias grávidas da
atividade presencial enquanto durar o estado de emergência de saúde pública em
decorrência da pandemia de Covid-19, sem qualquer prejuízo à remuneração da
trabalhadora.
No entanto, já no segundo semestre do
ano passado, a Justiça Federal de vários Estados determinou que a União e o
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), e não os empregadores, paguem o
salário de gestantes afastadas que, pela natureza do trabalho, não possam
exercer atividades de forma remota.
São várias as situações em que as
grávidas não conseguem realizar em home office trabalhos para os quais são
remuneradas. De forma a não nos estendermos demais, enumeramos aqui atividades
de lazer e recreação que requerem a presença da funcionária. Podemos pensar
também nas linhas de produção das empresas, em que a atuação presencial da
gestante se faz necessária.
A Lei nº 14.151, com apenas dois
artigos, publicada no Diário
Oficial da União de 13 de maio de 2021, não estabelece diretrizes
para os cargos que só podem ser desenvolvidos de forma presencial e continua
valendo mesmo que as grávidas tenham sido imunizadas. Ocorre que os salários
das gestantes afastadas têm sido pagos pelos empresários, assim como os de
trabalhadores contratados para substituí-las. Esta situação tem comprometido a
saúde financeira e a sobrevivência das empresas, especialmente as de pequeno
porte.
Com tantos encargos e diante de um
panorama econômico nada favorável, não são poucos os empresários recorrendo à
Justiça Federal para que a União e o INSS suportem os custos das gestantes
afastadas do trabalho e que não podem desenvolver atividades remotamente.
Entre várias decisões proferidas pela
Justiça Federal, a da Primeira Vara de Corumbá (MS), em benefício do
empregador, é notável e, por esta razão, vale ser destacada. Ao analisar os
documentos de uma empresa que desenvolve atividades exclusivamente presenciais
de recreação e lazer e conta com várias empregadas, algumas delas gestantes, o
juiz federal Felipe Bittencourt Potrich destacou em sua decisão que a
Constituição Federal de 1988 confere especial proteção à saúde, à maternidade,
à família e à infância. Frisou ainda que a Convenção 103 da Organização
Internacional do Trabalho, internalizada pelos decretos 58.820/66 e 10.088/19,
estabelece que as prestações devidas em razão dessas condições devem ser
custeadas por seguros obrigatórios ou fundos públicos, e não pelo empregador.
Nas palavras do magistrado, “seja por força da Constituição Federal, seja por
norma supralegal, cabe efetivamente ao Estado a proteção dos bens jurídicos em
questão”.
O juiz lembrou ainda que o artigo 394-A
da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), na redação dada pela Lei nº
13.467/17, prevê o pagamento do auxílio-maternidade quando não for possível à
gestante ou lactante afastada exercer suas atividades em local salubre na
empresa.
Em síntese, o magistrado concedeu tutela
de urgência e autorizou a empresa a afastar as funcionárias gestantes com
atribuições não compatíveis com o trabalho a distância, na forma da Lei nº 14.151/2021,
e determinou que o empresário pague o salário-maternidade mediante compensação
com os valores devidos a título de contribuição social sobre a folha de
salários e demais rendimentos pagos.
Em sentenças proferidas com teor
semelhante, alguns juízes argumentam que deixar o ônus com o empregador é impor
ainda mais restrições às mulheres no mercado produtivo. Sem dúvida, esta é uma
situação que merece reflexão. Mais que isso, requer providências em benefício
do empregador e, principalmente, das trabalhadoras.
*Leandro Nagliate – OAB/SP 220.192. Advogado formado em 2003 pela PUC de Campinas, é especialista em direito canônico, previdenciário e tributário. Leandro é sócio da Nagliate e Melo Advogados, em Campinas (SP).
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