Debandada de empresas da Rússia é um bom sinal
Luiz Fernando Lucas, especialista em ESG e
Integridade
Grandes empresas já anunciaram sua saída
da Rússia após a invasão da Ucrânia. Essa decisão reflete um novo momento, uma
nova era, que eu chamo da Era da Integridade, na qual os stakeholders –
incluindo os consumidores em geral – estão mais atentos e cobrando mais
consciência por parte das empresas. Querem um capitalismo mais consciente, com
tomadas de posição que não sejam apenas discursos.
Diante de um movimento cada vez mais
forte de ESG e de ferramentas de compliance, que formam os pilares dessa
integridade corporativa, no momento da invasão da Ucrânia pela Rússia as empresas
precisam tomar uma decisão. E tal posicionamento precisa corresponder à
expectativa do mercado, dos investidores e dos consumidores.
E como isso acontece? As empresas tomam
as decisões rumo à Era da Integridade em função de sua própria consciência e de
suas aspirações em relação ao mundo, pela percepção de que isso trará
resultados melhores ou ainda pela percepção de que a não tomada de decisão
trará resultados negativos.
Nesse cenário, várias empresas tomaram a
decisão rapidamente. E a quantidade de marcas se posicionando vem aumentando a
cada dia. Em uma situação dessas, ninguém quer ficar para trás. Porque quem não
se posicionar acaba se posicionando indiretamente, como se fosse favorável à
guerra ou como se não estivesse preocupado com todas as questões que isso traz
ao planeta e à humanidade. Hoje, diante desses temas, não é mais possível se
desvincular uma atuação corporativa, empresarial, da atuação dos indivíduos que
compõem essas corporações.
A tomada de decisão por parte das
empresas tem vários significados. Primeiro: se estabelece um marco, uma
transição e uma efetiva movimentação do mundo corporativo em prol de uma
cultura de valores e de uma integridade de fato. Porque não se pode pregar uma
coisa e fazer outra. Simples assim.
Há também o simbolismo da ação, porque
deixa claro o que cada empresa tem para dizer e o quanto elas estão a favor da
humanidade, da vida, do respeito, da tolerância e da paz.
E o significado maior é exatamente a
congruência de a empresa e seus indivíduos fazerem aquilo que pregam. Isso é
muito importante, porque estabelece um novo parâmetro, uma nova forma não só de
se posicionar, mas de se tomar decisões. Nela, não apenas as questões típicas
social, ambiental e de governança, mas os valores fundamentais humanos como um
todo são levados em conta nas decisões de investimento, de perdas e ganhos,
produtos, serviços e posicionamento.
E isso, sem dúvida, vai impactar por
muito tempo novos investimentos, decisões, negócios, produtos e serviços,
certamente chegando à sociedade. As empresas, sendo mais conscientes, levam
menos desgaste para o meio ambiente e menos impacto negativo para as pessoas.
Além disso, os consumidores atentos
podem também exigir mais das empresas, fortalecendo esse ciclo virtuoso, com as
empresas tendo cada vez mais a pauta de integridade sendo considerada em sua
tomada de decisões e ações no mercado.
O movimento começou por grandes
empresas, com condição de sustentar perdas maiores ou com capacidade de se
autofinanciarem ou conseguirem dinheiro no mercado. São empresas para as quais
eventuais perdas em território russo não significam riscos para a continuidade
do negócio. É claro que nessas condições é muito mais fácil de se tomar uma
decisão do que em uma pequena empresa, para quem um rompimento poderia
significar o fim das operações.
Porém, temos visto que não é o aspecto
financeiro que tem pautado a maior parte das decisões, mas sim o alinhamento de
valores e a opinião pública. A humanidade está deixando claros os seus valores
– da liberdade, do respeito, do valor sagrado – de que não se deve invadir o
terreno do vizinho. E que não se deve matar e nem desrespeitar. Valores como
liberdade, tolerância, convivência pacífica são universais, absolutos, e as
empresas estão deixando claro é que estão decidindo primeiro e fazendo a conta
depois.
Evidentemente, as decisões estão
passando pelos CEOs e CFOs. Mas também há que se levar em consideração que o
custo de não se posicionar (ou de se tornar neutro, ou de fingir que não está
acontecendo nada e continuar fazendo negócio normalmente) pode ser muito maior
que as perdas de curto prazo, porque estamos falando de um posicionamento para
o qual a humanidade toda está atenta. Os consumidores estão olhando para quem
eles querem valorizar e ter como parceiros e fornecedores ou como clientes.
No geral, o que estamos assistindo é um apoio muito grande à Ucrânia pela
sociedade como um todo, partindo de diferentes culturas e localidades,
especialmente no mundo ocidental, porém em grande parte do mundo, com exceção
apenas daqueles que estão alienados ou ideologicamente alinhados aos
agressores. Mas a grande parte da sociedade apoia essas medidas.
Ainda vamos assistir as consequências disso no médio e longo prazo. É cedo para dizermos como será a manutenção das empresas e o reflexo de suas posturas juntos aos consumidores. Mas, dado todo o estudo que tenho feito, no sentido de elevar de consciência da sociedade, percebo que a integridade e a cultura de valores têm transformado a sociedade, e os indivíduos e as empresas são agentes importantes nessa transformação. Esperamos que os líderes ajam como homo conscious, cada vez mais pautando suas vidas pela consciência, não mais apenas pelo conhecimento como tem feito o homo sapiens. Por consciência, não há guerra, nem exploração, nem desvios de caráter ou ação que não seja embasada em virtudes, princípios e valores.
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