Com as eleições como fica nossa democracia?
Por Francisco Gomes Júnior - advogado e presidente da ADDP (Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor)
Mesmo quando se quer analisar um assunto
sob o ponto de vista jurídico e sem nenhum viés político, se faz necessário
iniciar com uma série de esclarecimentos. O texto não tem a intenção de favorecer
nenhum dos pólos ou o centro político, não é de oposição ou situação, não é
“isentão” (como se denomina atualmente aqueles que não aderem a nenhuma
doutrina), e não há ideias pré-concebidas. A análise pensa simplesmente em um
projeto de bem para o país, a iniciar pela melhoria das condições de vida de
todos.
Iniciando pelo futuro, imaginemos o
período pós eleições (com a premissa de que elas ocorram sem sobressaltos), a
posse do novo Presidente eleito e o que esperar do novo governo. A árdua
batalha eleitoral terá acabado e agora é hora de governar o Brasil.
Supondo que o vencedor seja um
governante de esquerda, o que vem sendo dito na campanha de Lula é que a grande
tendência será a de abolir o teto de gastos, deixando em segundo plano a
responsabilidade fiscal. O discurso será o de vamos gastar porque o que
interessa são programas sociais que retirem o povo da pobreza e depois pensamos
no resto.
Só que o fim do teto de gastos e o
consequente inchaço dos gastos públicos, não são um tema meramente ideológico.
A legislação brasileira foi alterada, criando-se a lei de responsabilidade
fiscal justamente para evitar que se gaste sem medida, que se tenha sempre uma
gestão deficitária.
Obviamente que, além do mencionado, o
aumento de gastos vem acompanhado do loteamento político de cargos entre as
forças políticas que auxiliaram na eleição e outras medidas como liberação de
emendas ao parlamento, medidas que debilitarão a economia e trarão em seu bojo
o crescimento da inflação, a alta de juros como forma de conter o consumo e a
diminuição de investimentos estrangeiros e insegurança jurídica. Já vivemos
isso no passado.
Por esse raciocínio econômico podemos
concluir que a vitória da esquerda deve gerar dificuldades que poderão, em
última análise, nos levar a uma nova recessão. E isso sem mencionar ideias como
a revogação da reforma trabalhista, a revisão de desestatizações que trarão
ainda maior prejuízo.
O que pode nos desanimar é que, não
bastasse o cenário do day
after com a esquerda, a perspectiva com uma reeleição da direita
também não traz um cenário animador.
A gestão atual fez alianças (que
prometia jamais fazer) como vários governos ortodoxos anteriores, inclusive com
os mesmos protagonistas do denominado Centrão e outros partidos
tendenciosamente governistas (seja qual for o governo).
Uma vez eleito, o Presidente deve tomar
medidas que garantam seu governo até o fim do mandato, sem risco de que o
Presidente da Câmara dos Deputados aceite algum pedido de Impeachment contra
ele. Após a Constituição Federal de 1988 já tivemos o Impeachment de Fernando
Collor e Dilma Rousseff.
Denominam nosso sistema político como um
presidencialismo de coalização que certamente estará presente no próximo
governo. Escândalos como o mensalão tinham como fundamento arrecadar dinheiro
para a obtenção de apoios políticos. Descobriu-se e condenou-se, mas não
alterou a lógica do sistema.
Tivemos então o Petrolão, onde os
indicados políticos para empresas estatais (sobretudo a Petrobras) foram
cooptados por empreiteiros, que pagavam a ele propinas e também a políticos. A
operação Lava-Jato teve o mérito de expor os desvios ocorridos, mas, por erros
e atropelos de investigação e processuais, teve suas decisões comprometidas e
anuladas.
Sob o ponto de vista da população,
restou a ideia de que houve “roubos” de dinheiro público, mas, no final, todos
estão se safando. Não há a compreensão dos mencionados erros processuais, mas
sim uma brusca mudança de direção do Judiciário.
Afinal, as indicações políticas existem
também para órgãos do Poder Judiciário e a princípio tudo isso permanecerá
existindo. Os tribunais superiores são vistos e analisados com base em quem
indicou cada Ministro e não na isenção de cada um deles.
A percepção de que Tribunais Superiores
mudam de direção ao sabor do vento, traz consigo a acusação de ativismo
judicial cuja origem pode estar na Carta Magna de 1988 que, ao permitir a
interpretação vertical e horizontal das normas constitucionais, gera uma
interferência excessiva do Judiciário no dia a dia do país. Muitos dizem que
Ministros interferem demais nos outros Poderes, porém, a Constituição lhe
atribuiu essa competência. E isso, a princípio, também não mudará.
Qualquer que seja o eleito, a batalha
judicial tomará a nação. A esquerda acusando o Presidente de vários crimes de
responsabilidade e de abuso do poder eleitoral e exigindo sanções por parte da
Justiça Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal. A direita ameaça não
reconhecer o resultado eleitoral se suas exigências não forem acatadas, já que
o atual TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não possuiria imparcialidade para
conduzir o pleito e as urnas eletrônicas não são confiáveis.
Por isso, a intenção deste texto é
pensar no day after,
que acaba esquecido diante da guerra política e de acusações diárias. A questão
é: como será gerido o país no próximo e subsequentes governos, com reformas
estruturais necessárias, sendo que tudo isso ainda não surgiu nas pré-campanhas
eleitorais.
Mas há um valor fundamental para todos
os brasileiros, o de poder pensar livremente e em um regime democrático. Por
isso, guerras à parte, é fundamental que todos os cidadãos defendam a
democracia e não aceitem viradas de mesa e outros tipos de golpismos. A
premissa é a manutenção da democracia.
Após as eleições e a proclamação do vencedor,
a sociedade deve reavaliar com muita serenidade se a Carta Magna Cidadã de 88,
com nobres princípios e cláusulas pétreas, se mostra efetiva para atender aos
anseios da sociedade. O movimento de desestabilização da democracia
desenvolveu-se debaixo desse manto constitucional que permitiu que em nome da
liberdade de expressão e outras invocações se desestruturasse várias
instituições.
Caberá amplo debate sobre todos os temas
supracitados, mas é preciso governabilidade (para qualquer governo) e pensar
que eliminar o presidencialismo de coalização e ter uma reforma judicial podem
ser excelentes pontos de partida.
Francisco Gomes Júnior - Sócio da OGF
Advogados. Presidente da Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor
(ADDP). Autor do livro Justiça Sem Limites. Instagram: https://www.instagram.com/
Nenhum comentário