Falta de planejamento antecipado para a gestão patrimonial pode ser motivo de disputas judiciais no caso de incapacidade civil do titular
- por Felipe Russomanno e Julia
Spinardi
Empresário à frente de grande grupo
econômico é acometido por doença incapacitante e não há consenso na família
sobre a condução do patrimônio ou não há cônjuge ou herdeiros para assumir o
encargo. Em razão da disputa ou da falta de pessoa habilitada, é nomeada pessoa
estranha à família para conduzir os negócios de seu titular. No curso do
demorado processo de interdição, medidas precisam ser tomadas, mas a prática de
atos societários fica prejudicada, impedindo a tomada de decisões urgentes, o
que pode importar até mesmo a bancarrota patrimonial.
Histórias como essa não são raras.
Nessas condições, a gestão patrimonial deve ser confiada a quem for nomeado
pelo Poder Judiciário, e a pessoa incapacitada sujeita-se à curatela
(interdição). Quem exerce a administração do patrimônio é o curador, sendo sua
função, inclusive, exercer direito de voto em sociedades empresárias.
A questão atinge contornos complexos se
for considerado que o artigo 1.775 do Código Civil prevê a ordem de quem está
legitimado ao exercício da curatela. O cônjuge ou companheiro, não separado de
fato ou de direito, é prioritariamente curador. Na sua falta, são chamados pai
ou mãe e, sucessivamente, os descendentes. Se não houver familiares, a escolha
fica ao livre arbítrio do Poder Judiciário, que normalmente nomeia um curador
dativo para administrar os bens da pessoa interditada.
Não é difícil imaginar que a previsão
legal pode revelar embates familiares e prejudicar a condução patrimonial.
O legislador previu mecanismos que
protejam o patrimônio da pessoa incapaz –fiscalização da curatela pelo
Ministério Público, dever de periodicamente serem prestadas contas do exercício
da curatela, necessidade de autorização judicial para alienação de bens – mas
que, por outro lado, travam-no. E mais: esses instrumentos de proteção não
tornam uma pessoa sem qualificação em
expert para administração patrimonial, assim como não garantem uma
gestão que vise ao melhor interesse de seu titular.
Diante disso, passou-se a reconhecer a
viabilidade de instrumentos que salvaguardem a condução dos negócios durante a
enfermidade de seu titular. Admite-se que, no gozo de suas faculdades mentais,
o titular do patrimônio possa apontar quem ele deseja que administre o
patrimônio, entre outras medidas a serem tomadas em eventual incapacidade.
Por isso, a formalização de documento
para indicação de curador(es), contendo, inclusive, recomendações de medidas
patrimoniais e societárias que deverão ser observadas em eventual incapacidade
e a nomeação de quem deverá responder, e em qual medida, pelo patrimônio da
pessoa enferma até a nomeação judicial de curador, se mostram possíveis e
recomendáveis. Embora a nomeação de curador seja prerrogativa do Poder
Judiciário, a manifestação de vontade do titular do patrimônio garante
importante embasamento para as decisões judiciais, razão pela qual é aceita
nesses casos.
Como se pode ver, a gestão patrimonial
em caso de incapacidade de seu titular é tema delicado, mas que pode ser
definido previamente ao surgimento de doença incapacitante. Para tanto, é
recomendável que seja consultado profissional especializado para que, após
verificar as peculiaridades do caso concreto, possa ser proposta solução
jurídica mais adequada para instrumentalização da vontade de seu titular e
perenização do patrimônio.
* Felipe Russomanno e Julia Spinardi são
advogados associados do Cescon Barrieu Advogados na área de Planejamento
Patrimonial e Sucessório | Família e Sucessões
Sobre o Cescon Barrieu
O Cescon Barrieu é um dos principais escritórios de advocacia do Brasil, trabalhando de forma integrada em cinco escritórios no Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Brasília) e, também, em Toronto, Canadá. Seus advogados destacam-se pelo comprometimento com a defesa dos interesses de seus clientes e pela atuação em operações altamente sofisticadas e muitas vezes inéditas no mercado. O objetivo do escritório é ser sempre a primeira opção de seus clientes para suas questões jurídicas mais complexas e assuntos mais estratégicos. www.cesconbarrieu.com.br
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