O bug dos millennials
Marco Antonio Spinelli*
Uma cliente querida
veio trazer sua preocupação com sua filha de trinta anos, e seu trabalho numa
Agência de Publicidade: de uma semana para outra ela teve um acréscimo abrupto
de carga de trabalho, pois, segundo ela, três colegas da mesma idade “bugaram”.
Todos os três na faixa dos vinte e cinco a trinta anos, ou seja, uma idade onde
eles deveriam estar segurando qualquer bucha. O tal do “bug” deve ser
provavelmente para descrever um processo de esgotamento, que antigamente era
chamado de estafa e agora é mais elegante chamar de “Burnout”. Minha geração
torce o nariz e chama essa geração nascida e criada no entorno da virada do
Milênio de “Snow Flake Generation”, ou Geração Floco de Neve, que é lógico que
um termo pejorativo para uma geração que se desmancha rapidamente diante da
adversidade. Mas são só os milennials que estão bugando?
Outro cliente vem se
queixando da pouca efetividade de nosso tratamento. Apesar de estarmos usando
medicamentos em dose eficaz, ele fica cada vez mais cansado durante o dia,
consumindo cada vez mais café para entregar toda a produção que lhe demandam e
dormindo cada vez pior. Tudo para fazer um psiquiatra feliz. Eu lembrei a ele
de como seus sintomas estavam mais brandos e sua qualidade de vida estava
melhor quando estava desempregado. Mesmo com a pandemia, ele fazia exercícios
ao ar livre todo dia, lia e recomendava livros interessantes, fazia
consultorias que davam dinheiro para pagar suas contas e dormia sem nenhum
medicamento o sono dos justos. Tomava sol, frequentava piscinas e comia uma
comida cheia de vegetais e pouca gordura e açúcares. Bons tempos aqueles do
desemprego. Agora ele estava trabalhando full time na diretoria de uma empresa
que teve o bom senso de contratá-lo e está em mais dois boards, além de fazer
consultoria. Em vez de estar feliz, está depletado. Esse é o significado do
Burnout: uma perda/depleção de energia, com sensação diária e permanente de
cansaço, dificuldade de foco e falhas cada vez mais frequentes e importantes de
Memória. Tudo isso é sinal de falha de energia e desempenho do Sistema. Como as
pessoas reagem a isso? Geralmente colocam mais pressão em si, diminuem o tempo
de sono, tentam trabalhar com mais intensidade. Como um caminhão acelerando na
direção do precipício.
Algumas medidas para
prevenir ou reverter o burnout para millenias e para tiozinhos: cuidado com o
“zooming fatigue”. Ficar o dia inteiro pendurado em telas está esgotando as
capacidades dos Cérebros de processar informação. Sugeri ao meu cliente
desligar a sua câmera para não ficar olhando sua própria cara o dia inteiro.
Parece estranho, mas este “efeito espelho” causa ou piora o cansaço. É como
ficar olhando para o espelho o dia inteiro. Pedi para afastar a imagem dos
interlocutores e afastar a tela de seus olhos. A sensação de proximidade que
aquele carão do chefe transmite grudado na tela causa estresse e sensação de
estar sendo avaliado. Ao final das reuniões, faça um detox de tela e de
imagens. Estamos numa era de sobrecarga de estímulos e informações, o que gera
um cansaço constante. Afaste celular, tablet e computador nesse período de
detox e faça movimento: pedir para fazer exercícios ou pular corda é bem pouco
aplicável, mas uma caminhada ao ar livre, alguns alongamentos, ou dez minutos
de exercícios respiratórios/Meditação vão recarregar suas baterias. Depois de
uma consulta muito dura, eu como alguma coisa, tomo um chá e faço a respiração
do fogo antes da próxima consulta, para quebrar a energia de angústia e de dor
que se manifesta nessas situações. Isso serve para todo mundo. Fazer esses mini
breaks ajudam a separar as atividades e as energias de cada uma.
Faça uma atividade de
cada vez e “termine a corrida” (como diz um técnico de basquete: “finish the
run”). Tarefas concomitantes e inacabadas pesam como uma cruz no final do dia.
Termine uma e a tire da frente, daí passa para outra. Isso é difícil? O ambiente
corporativo é caótico e as tarefas são empilhadas na sua mesa? Outro motivo
para terminar uma de cada vez e estabelecer prioridades. Seu chefe é caótico e
a distribuição de tarefas idem? Se a sua empresa é caótica, isso é outro motivo
para a sua governança de tempo e de prioridades ser bem estabelecida. Senão,
vai todo mundo bugar junto, e a culpa normalmente recai sobre o bugado, não
sobre o sistema caótico que leva ao bug.
Como já colocado em
outros artigos, defenda seu sono como um pitbull defende seu osso. Nada de
telas na cama, nada de estimulantes como café ou red bull ou nicotina perto da
hora de deitar. Leitura (em livros), meditação e relaxamento antes de deitar
também ajuda muito.
Sobretudo: transforme o
estresse em fonte de crescimento. Ou de desafio. Ou o próximo bugado, ou
bugada, será você.
*Marco Antonio Spinelli é médico, com mestrado em psiquiatria pela Universidade
São Paulo, psicoterapeuta de orientação junguiana e autor do livro “Stress o
coelho de Alice tem sempre muita pressa”
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