Mais de 60 anos do consórcio: O que mudou na modalidade financeira e como a tecnologia tem impactado o mercado
Bruno Pinheiro*
Apesar de possuir mais de seis décadas
de idade, o consórcio ainda pode ser considerado novo, pois foi apenas em 2008 que teve início a
regulamentação no mercado pelo Banco Central, permitindo a regulação e criação
de regras definidas por uma entidade do sistema financeiro. A partir disso, o
consórcio ganhou um status de produto financeiro, o que trouxe segurança para o
próprio produto e para o setor, possibilitando seu crescimento.
Diante disso, um fator que pode
transformar a modalidade de consórcio de uma vez por todas é ter a clareza de
sua definição. Hoje em dia, o mercado é fortemente dividido entre aqueles que
acreditam que o consórcio é um produto de investimento e aqueles que acreditam
que é um produto para compra de bens e serviços, sendo que é um pouco dos
dois.
A definição fornecida pelo Banco Central
para consórcio é “autofinanciamento”, pois mistura os dois lados, investimento
e poupança com crédito. O produto do consórcio pode ser usado dessas duas
maneiras, e quando a população entender tal conceito, a modalidade passará a
ser vista com outros olhos. O problema que acontece atualmente é que a falta de
explicação sobre o serviço faz que os clientes se frustrem e consequentemente
cancelem o consórcio.
Uma outra questão que precisa ser
melhorada dentro do setor é a tecnologia, que parece que não chegou ao mercado
de consórcio. Afinal, em todos esses anos, poucas iniciativas foram iniciadas
com base em recursos tecnológicos. O produto é entregue para o cliente da mesma
forma de quando a modalidade foi criada, sendo vendido pelo valor do crédito
pretendido ou pela parcela que o cliente pode pagar. Essa ação gera uma entrega
massificada, pois não considera interesses individuais do cliente e muito menos
suas particularidades.
Tal atitude até passava despercebida há
15 anos, pois era uma época em que as ferramentas de dados e análise estavam
começando a se desenvolver e faltava acesso à informações. No entanto, nos dias
de hoje, não faz sentido não usar tecnologia nos processos, pois as ferramentas
e os recursos estão à disposição, sendo possível trabalhar com dados e
analytics, para tomar uma decisão diferente para o produto, sendo possível
entregá-lo para cada perfil de cliente de forma individual, o que é uma grande
vantagem.
No entanto, mesmo com poucos recursos
tecnológicos, o consórcio continua fazendo sucesso, principalmente nas classes
de renda menor. Por ser uma alternativa ao crédito, torna-se uma opção viável
para quem quer comprar um bem ou serviço. Em países em desenvolvimento, como o
nosso, o crédito costuma ser escasso ou caro, por isso o consórcio faz sentido.
No Brasil, o consórcio é um produto bastante rentável e vem sendo incentivado
por administradoras, que estão ligadas a grandes instituições financeiras.
O Consórcio também equaliza as
oportunidades entre as classes sociais. No crédito, os clientes com maior
renda, que apresentam um risco menor para a instituição financeira, recebem uma
taxa de juros menor que os clientes com baixa renda. Contudo, no consórcio,
independente da classe social, tendo a capacidade de renda necessária para
arcar com as parcelas, todos os clientes do grupo têm a mesma taxa de
administração, que é o custo da operação. Então, diferente do crédito que
discrimina os clientes, o consórcio equipara e traz condições iguais entre os
participantes.
Por essa razão, o momento atual do
consórcio é positivo, pois quanto mais caro ou mais escasso o crédito é, mais o
produto se destaca. Se falarmos sobre custos e compararmos o produto de
financiamento e o produto de consórcio para compra de um bem, o consórcio fica
mais barato. A exemplo do cenário promissor, dados da Associação Brasileira de
Administradoras de Consórcios (ABAC), apontam que os primeiros seis meses deste
ano bateram recorde de cotas vendidas com 1,85 milhão; foi o melhor resultado
para o período nos últimos dez anos. Além disso, os números superaram em 12,1%
o acumulado no mesmo período do ano passado, quando houve o registro de 1,65
milhão. No entanto, é claro, deve-se levar em consideração que existe o custo
financeiro dentro da modalidade, que é a taxa de administração da operação, mas
esta também compensa e apresenta vantagens.
Visto isso, a minha expectativa no curto
prazo para o mercado de consórcios está na melhora na regulação e observância
dos players do mercado, principalmente na conta de quem está à frente da
operação oferecendo esse produto. É preciso garantir que todos os profissionais
tenham uma maior qualificação, o que permitirá um aumento da qualidade do
serviço e também mais transparência.
Já no longo prazo, percebo que o
consórcio terá uma alavancada e entrará cada vez mais na carteira e na vida
financeira dos clientes, permitindo a compra do que desejam, já que o produto
vai oferecer uma operação menos custosa e mais programada. A tendência é que o
consórcio evolua e traga melhorias com o passar do tempo, sendo mais
personalizado para entregar e atingir de uma maneira melhor e mais fácil os
objetivos dos clientes, o que vai gerar um mercado cada vez maior, cheio de
inovações e possibilidades.
*Bruno Pinheiro é fundador e CEO da Turn2C Consórcio Inteligente, uma solução de inteligência artificial
(IA) para o mercado de consórcio. Formado em Engenharia Mecatrônica pela
Universidade de São Paulo (USP), Bruno acumula mais de 17 anos de
experiência em empreendedorismo no mercado financeiro, em setores de
investimento, câmbio, consórcio e banking. Seu ingresso no mercado ocorreu em
2004, ao iniciar sua trajetória profissional no Itaú Unibanco, maior banco
privado do Brasil e maior conglomerado financeiro do hemisfério sul, no qual
foi responsável por diversas áreas dos produtos de crédito imobiliário,
financiamento de veículos e, de 2010 a 2013, responsável pela vertical de
consórcios da Itaú Administradora e Fiat administradora de consórcio.
Em paralelo, o executivo criou
em 2015 a Besser Partners, fintech de câmbio para pessoas físicas e jurídicas
que permite ao cliente acessar diversos bancos usando uma única plataforma, que
foi vendida ao banco C6 SA em 2018. Bruno sempre teve um incômodo em relação ao
produto consórcio e como ele é tratado no mercado de forma massificada sem
considerar os objetivos individuais dos clientes. Com isso, decidiu fundar a
Turn2C (Turn to Client – Vire-se para o cliente), buscando usar tecnologia para
entregar de forma eficiente o produto consórcio por meio de inteligência
artificial e modelos matemáticos e estatísticos. Atualmente, a startup é a
única no mercado brasileiro a oferecer esse tipo de serviço.
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