Como as empresas devem lidar com as inúmeras normas tributárias no Brasil?
Caio Ruotolo*
Não é novidade que o
contribuinte no Brasil precisa lidar com um emaranhado de normas das diversas
esferas tributárias (União, Estados, DF e Municípios), o que confere ao nosso
sistema tributário um grau de extrema complexidade.
No Brasil sempre
vivemos a inflação normativa tributária, são cerca de 831 normas tributárias
criadas por dia útil, gastamos quase 1400 horas somente para o preenchimento de
obrigações acessórias com a finalidade de cumprir as normas e recolher os
tributos, cuja carga chegou em 33,9% do PIB.
Estudo do Instituto
Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT)[1]
demonstrou que para uma empresa estar em dia com suas obrigações tributárias,
precisa cumprir o que consta em 4.626 normas, quantidade essa que se fossem impressas,
em folha de formato A4, certamente ocupariam a avenida Paulista, ida e volta,
cerca de 6,5 quilômetros de extensão!
Fora isso, no Brasil
cerca de 2,21 norma tributária é editada por cada hora útil. São mais de 3 mil
palavras por norma[2].
Um mesmo contribuinte,
por exemplo, na maioria das vezes, tem que lidar com a legislação federal,
estadual e municipal, tentando estar em compliance com essas normas para seguir
com o seu negócio. Não é uma tarefa fácil, em termos de legislação tributária e
fiscal a complexidade é enorme.
As propostas de reforma
e simplificação do sistema tributário e redução do contencioso tributário estão
em curso, mas ainda caminham a passos de tartaruga e são muito tímidas, além de
enfrentarem as costumeiras barreiras criadas pelas próprias administrações, sob
o useiro e vezeiro fundamento de se evitar queda na arrecadação.
Fato é que para se
chegar ao efetivo recolhimento do tributo, o contribuinte precisa passar por
uma “via crucis”, cumprindo uma série de obrigações e normas acessórias para
apresentar ao fisco, as quais são alteradas periodicamente dando a sensação de
que se está correndo atrás do próprio rabo numa guerra sem fim.
Diante desse cenário,
em que pese nossa busca contínua e incessante pela simplificação e pela reforma
tributária, sabemos que tais alterações não virão da noite para o dia, de modo
que a orientação consultiva e preventiva é a melhor forma de lidar com tais
questões para o contribuinte não ser pego de surpresa quanto às obrigações
acessórias, palco de inúmeras autuações por parte do fisco.
Estar em conformidade
tributária é adotar ações internas nas empresas, com as respectivas áreas
envolvidas (tributária, fiscal, compras, TI), para que a informação final que o
fisco receberá esteja de acordo (em compliance) com o que ele (o fisco) espera,
sob pena das “pontas” ficarem soltas originando as costumeiras autuações
fiscais por inconsistências de informações e obrigações.
O cruzamento de
informações, num cenário de constante inflação normativa, deve ser muito bem
mapeado evitando o envio de dados equivocados que colocam o contribuinte em
risco.
Neste sentido, hoje as
empresas têm dois caminhos a trilhar, o corretivo e o preventivo.
No corretivo, a empresa
trabalha com a autorregularização, fazendo um mapeamento das inconsistências e
adotando um plano de ação percebendo o que precisa ser mitigando antes do fisco
iniciar sua ação fiscal (evitando autuações desnecessárias).
Por sua vez, no
preventivo, a empresa busca olhar para o futuro ao adotar as medidas de
compliance como forma de um planejamento contínuo para que não incorram em
erros com as mudanças na legislação, mantendo um histórico saudável.
O fato de a
administração tributária ter prazo de 5 anos para fiscalizar o contribuinte,
não pode ser motivo para deixar de adotar as medidas corretivas e mitigadoras,
bem como as preventivas no processo de preenchimento das obrigações acessórias,
evitando autuações que sempre serão retroativas, com a inclusão de juros e
multas.
Ao adotar um plano de
ação, com a participação das principais áreas envolvidas no cumprimento das
obrigações tributárias, o contribuinte estará em conformidade, pois, além de
mitigar riscos, evitando perda de recursos, existem contrapartidas
interessantes, tem-se, como exemplo, o programa da Secretaria da Fazenda e
Planejamento do Estado de São Paulo denominado “nos conformes”, e a recente
possibilidade de apropriação de créditos acumulados do ICMS de forma mais simplificada,
mas tão somente para aqueles contribuintes que estão em conformidade com as
normas estaduais de ICMS.
A conformidade
tributária é um investimento de suma importância para as empresas, seja na área
fiscal, tributária, TI, sistemas, consultorias externas de apoio etc., pois o
compliance tributário melhora a concorrência, traz transparência e aumenta a
visibilidade positiva das empresas, conferindo maior competitividade ao
negócio.
[1] Estudo
do IBPT sobre quantidade de normas tributárias é citado em diversas matérias
jornalísticas - IBPT Instituto. Acesso 13.09.2022.
[2] Em
comemoração aos 33 anos da Constituição Cidadã, IBPT divulga novo estudo - IBPT
Instituto. Acesso 12.09.2022.
*Caio Cesar Braga Ruotolo é
advogado e sócio do escritório Luiz Silveira Sociedade de Advogados. Consultor
Jurídico da ABIMAQ. Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São
Paulo. Membro do Conselho de Assuntos Tributários da Fecomércio em São Paulo.
Foi Coordenador Jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
Foi membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/SP (2017/2018) e da
Comissão de Assuntos Fiscais da CNI (2014-2020). Pós Graduado com
Especialização em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
e em Direito Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional e em
Gestão de Recursos Humanos. Experiência consultiva e contenciosa nas áreas de
direito tributário, empresarial, ambiental, aeronáutico e crimes contra a ordem
tributária.
Nenhum comentário