Criatividade: o mito do dom
*Victor de Almeida Moreira
Imagine-se assistindo a uma partida de
futebol em um bar com os amigos e, de repente, vê Neymar dando um drible
incrível, deixando toda a defesa do time adversário desarmada, “esse menino
nasceu com uma criatividade incrível”, você pensa.
Após o jogo, na volta para casa,
esperando o Uber, com o celular na mão, você pensa “o cara que inventou esse
aplicativo de transporte tinha o dom da criatividade”.
As cenas descritas acima não são
incomuns. Com frequência vemos e usamos da criatividade vinda de resultados do
que outras pessoas fizeram e, imediatamente, caímos no mito do dom.
O mito do dom acontece quando imaginando
que toda a criatividade dessas pessoas é algo inato, intrínseco. Que nascem com
o talento como um “presente dos deuses” dado a elas.
Mas, esta é uma grande armadilha. Na
ideia de Nietzsche, declarar que alguém possui um dom ou é um gênio da
criatividade, por exemplo, é o mesmo que afastar de nós mesmos a
responsabilidade por nos tornarmos criativos, de desenvolvermos um talento e
construirmos nossa excelência em algo.
A criatividade, assim como muitas outras
virtudes que reconhecemos em figuras que admiramos, pode ser treinada e
desenvolvida. A maior prova disso, encontrei no estudo conduzido pelo sociólogo
estadunidense Daniel F. Chambliss, intitulado The Mundanity of Excellence [A mundanidade da
excelência, em tradução livre].
Chambliss analisou a diferença entre
nadadores de elite (medalhistas olímpicos) e aqueles que não passaram de
campeonatos regionais. A grande conclusão do artigo foi que os grandes feitos
de um ser humano e a conquista da excelência nada têm a ver com alguma
característica extraordinária ou inata.
São antes, como escrito no estudo, “a
confluência de dezenas de pequenas habilidades ou atividades, aprendidas ou com
as quais nos deparamos, que são cuidadosamente treinadas e incorporadas como
hábitos e depois encaixadas em um todo sintetizado”.
Essa ciência me abriu os olhos para o
fato de que a busca pela excelência é gerenciável e pode ser construída e
desenvolvida, inclusive a criatividade. Em meu livro, chamo essa habilidade de
gerenciamento de consistência, que é a repetição acompanhada de um método,
seguindo os seguintes passos:
- Exponha-se a atividades
criativas,
- Escreva as etapas da atividade,
- Identifique em quais dessas etapas
estão os pontos que você pode aprimorar; e
- Teste novas estratégias para
melhorar cada etapa.
Repita esses passos incansavelmente.
Sua criatividade é gerenciável e se você
tiver a consistência para desenvolvê-la vai entender o que Steve Jobs estava
analisando quando disse que “todas as coisas ao seu redor, as quais você chama
vida, foram feitas por pessoas que não eram melhores que você. E você pode
mudar, pode influenciar, pode construir as próprias coisas para que outras
possam usar”.
*Victor
de Almeida Moreira é engenheiro de produção,
com MBA em Engenharia de
Custos, gestor de projetos da Mineração Rio do Norte (MRN)
e autor do livro
(Auto)liderança Antifrágil, publicado pela Editora Gente.
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