Revolução pelo afeto de Nise da Silveira chega ao Sesc Belenzinho
Após passar pelo CCBB do Rio de Janeiro e de
Belo Horizonte, exposição em homenagem a grande nome da psiquiatria brasileira
chega à capital paulista, onde fica aberta ao público do dia 9 de dezembro até
26 de março
Nise
e frequentadores do ateliê trabalhando nos jardins
(Arquivo
Pessoal Nise da Silveira/ SAMII )
A partir do dia 9 de dezembro, o Sesc
São Paulo traz à capital paulista a mostra Nise da Silveira: a revolução pelo afeto,
que celebra e discute o legado da psiquiatra alagoana responsável por uma
profunda transformação no campo da saúde mental. Após passagem pelo CCBB do Rio
de Janeiro e de Belo Horizonte, a exposição fica aberta à visitação até o dia 26 de março no Sesc
Belenzinho. O projeto também já esteve em Muriaé, no interior de Minas Gerais,
por iniciativa da Secretaria de Saúde da cidade.
A curadoria do Estúdio M’Baraká,
com consultoria do psiquiatra Dr. Vitor Pordeus e do museólogo Eurípedes
Júnior, propõe uma experiência a partir de três eixos principais: contexto, dor & afeto,
que levanta questões do debate sobre loucura e “normalidade”, assim como pontua
o princípio da resistência aos métodos violentos dos hospitais psiquiátricos; ser mulher, ser revolucionária,
que enfoca a trajetória pioneira e combativa de Nise da Silveira; e Engenho de Dentro: inconsciente e
território, com maior ênfase nas obras realizadas pelos
artistas-pacientes de Nise na instituição carioca e os caminhos abertos pela
psicologia analítica.
A expografia de Diogo Rezende,
designer e sócio do Estúdio M’Baraká, traz ambientes preenchidos por
sobreposições que contrastam a frieza da instituição de clausura – sob
constante vigilância – com o calor, a humanidade e a liberdade do trabalho que
a doutora Nise realizou nos ateliês do Engenho de Dentro, hospital psiquiátrico
na capital do Rio de Janeiro, hoje renomeado em sua homenagem. Esse
tensionamento é perceptível, por exemplo, ao se percorrer um trecho da mostra
em que os precursores da arteterapia e os tratamentos psiquiátricos agressivos
aparecem enquanto contemporâneos de uma mesma época.
Atenta às discussões e pesquisas não só
da psiquiatria, mas dos estudos científicos ligados à subjetividade, Nise da
Silveira contribuiu para reposicionar o debate sobre internação e tratamento da
esquizofrenia. Para isso, incluiu as práticas com materiais expressivos na
rotina dos internos que estavam sob sua responsabilidade, observando tanto o
modo como manejavam ferramentas artísticas e realizavam suas obras quanto as
imagens que surgiam desse trabalho criativo.
“A Nise criou um método clínico centrado
no afeto. Ela é herdeira de Juliano Moreira, de Baruch
Espinoza, de Sigmund Freud, de Carl Gustav Jung. E Jung foi aluno de
Freud e professor da Nise, na
Suíça. Homens revolucionários, que abandonaram a ideia do corpo máquina e trabalharam com
a abordagem centrada na subjetividade, na emoção, na identidade, na simbologia, nas narrativas que
restauram as memórias.
A nossa dificuldade hoje é não deixar o afeto se apagar em um momento em
que tudo virou máquina”,
situa o consultor Dr. Vitor Pordeus, que trabalhou no Instituto Municipal Nise
da Silveira, de 2009 a 2016, e é um dos fundadores do Hotel da Loucura.
Além de conhecer a trajetória de Nise,
condecorada como Heroína da Pátria em 2022 pelo Congresso Nacional, os
visitantes do Sesc Belenzinho vão apreciar de perto as obras de emblemáticos
artistas do acervo do Museu de Imagens do Inconsciente, como Adelina Gomes,
Emygdio de Barros, Carlos Pertrius e Fernando Diniz. Junto a elas, também há
produções de artistas contemporâneos como Lygia Clark e Carlos Vergara. Dentre
as novidades desta edição da mostra em São Paulo, estão quatro obras de Aurora
Cursino dos Santos e três obras de Ubirajara Ferreira Braga, todas do acervo do
Museu Osório Cesar.
Para Isabel Seixas, produtora e sócia do
Estúdio M’Baraká, “a exposição
busca apresentar essa personagem e sua importância simbólica ontem e hoje. Nise
é uma mulher revolucionária e representa um pensamento vanguardista brasileiro
na ciência e, pela especificidade de seu trabalho, consequentemente, nas artes.
Nise da Silveira (devemos reverberar esse nome) permitiria múltiplas abordagens
– valorizar seu gesto revolucionário, a partir do afeto, é potente nos dias de
hoje”.
Sobre Nise da Silveira_ Nise da Silveira nasceu em Maceió, no
dia 15 de fevereiro de 1905, filha de um professor de matemática e jornalista
com uma pianista. Desse modo, cresceu em uma casa que prezava pela cultura e
pelo afeto, frequentada por gente da imprensa, estrangeiros e artistas. A
futura psiquiatra estudou no Liceu alagoano e, em 1921, foi para a Faculdade da
Bahia, em Salvador. Ingressou no curso de medicina aos 15 anos e se formou em
1926, sendo a única mulher entre 157 homens daquela turma. Nessa época, também
se casou com o médico sanitarista Mário Magalhães, colega de faculdade com quem
viveria até o fim da vida. Juntos, optaram por não ter filhos e, assim,
dedicar-se prioritariamente à medicina.
Em 1927, já sem a mãe e sofrendo pelo
falecimento do pai, Nise decidiu se mudar para o Rio de Janeiro com seu
companheiro, pois lá teriam melhores oportunidades de trabalho. No ano de 1933,
enquanto finalizava sua especialização em psiquiatria, colaborou com a clínica
neurológica de Antônio Austregésilo. Ao concluir essa etapa de formação, foi
aprovada em concurso e começou a trabalhar no Serviço de Assistência a
Psicopatas e Profilaxia Mental do Hospital da Praia Vermelha.
Na década de 1930, militou no Partido
Comunista Brasileiro, mas foi expulsa da célula sob a acusação de trotskismo.
Seu engajamento levou a uma denúncia por posse de livros marxistas, o que
ocasionou a prisão de Nise da Silveira em 1936. Dessa época até meados da
década de 1940, permaneceu com o marido em condição semiclandestina, afastada
do serviço público.
Ao retomar suas atividades, em 1944, foi
integrada ao Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Engenho de Dentro, no
Rio de Janeiro, onde combateu técnicas agressivas utilizadas nos pacientes da
saúde mental. Nesse contexto, criou ateliês de pintura e modelagem para
estimular a vinculação dos sujeitos por meio da expressão simbólica. Assim,
tornou-se revolucionária em seu campo de atuação, alcançando resultados
reconhecidos internacionalmente pela comunidade médica e científica.
Em 1952, Nise fundou o Museu de Imagens
do Inconsciente, no Rio de Janeiro, espaço que ainda hoje exerce a função de
resguardar o legado da visionária e de ser um centro de estudo e pesquisa que
preserva os trabalhos produzidos nos ateliês psiquiátricos. Em 1956, surgiu
ainda a Casa das Palmeiras, clínica voltada à reabilitação de antigos pacientes
de instituições psiquiátricas.
Nesse percurso, a médica também se
aproximou dos estudos jungianos das mandalas, uma vez que essas imagens eram
recorrentes na produção dos internos que acompanhava. Já em 1954, iniciou uma
troca de correspondência com Carl Gustav Jung que resultaria em um diálogo
bastante produtivo para seu trabalho. Jung deu importante estímulo a Nise para
que ela realizasse uma mostra com a obra de seus pacientes.
Assim, em 1957, ocorreu a exposição “A
arte e a esquizofrenia”, que ocupou cinco salas do II Congresso Internacional
de Psiquiatria, realizado em Zurique. Na ocasião, o mentor da psicologia
analítica incentivou Nise a estudar mitologia como forma de ampliar as
ferramentas de leitura de seu trabalho. A psiquiatra então embarcou em um
período formativo no Instituto Carl Gustav Jung, na Suíça, que ocorreu em duas
fases – de 1957 a 1958, e de 1961 a 1962. Ao retornar ao Brasil, criou o Grupo
de Estudos Carl Jung, que presidiu até 1968. Nesse mesmo ano, publicou a
primeira edição do livro Jung:
vida e obra.
Ainda em vida, Nise da Silveira recebeu
diversas homenagens e prêmios, como a Ordem de Rio Branco, pelo Ministério das
Relações Exteriores, em 1987; o Prêmio Ciccillo Matarazzo, na categoria
Personalidade do Ano, da Associação Brasileira de Críticos de Arte, em 1992; a
Medalha Chico Mendes, do Tortura Nunca Mais, em 1993; e a Ordem Nacional do
Mérito Educativo, pelo Ministério da Educação e do Desporto, em
1993.
Já aos 94 anos, em 1999, a alagoana veio
à óbito devido a uma pneumonia, deixando um imenso legado para humanidade, que
nunca será esquecido.
Sobre o Sesc São Paulo_ Com 76 anos de atuação, o Sesc –
Serviço Social do Comércio – conta com uma rede de 45 unidades operacionais no
estado de São Paulo e desenvolve ações com o objetivo de promover bem-estar e
qualidade de vida aos trabalhadores do comércio, serviços, turismo e para toda
a sociedade. Mantido pelos empresários do setor, o Sesc é uma entidade privada
que atua nas dimensões físico-esportiva, meio ambiente, saúde, odontologia,
turismo social, artes, alimentação e segurança alimentar, inclusão, diversidade
e cidadania. As iniciativas da instituição partem das perspectivas cultural e
educativa voltadas para todas as faixas etárias, com o objetivo de contribuir
para experiências mais duradouras e significativas. São atendidas nas unidades
do estado de São Paulo até 30 milhões de pessoas por ano. Hoje, aproximadamente
50 organizações nacionais e internacionais do campo das artes, esportes,
cultura, saúde, meio ambiente, turismo, serviço social e direitos humanos
contam com representantes do Sesc São Paulo em suas instâncias consultivas e
deliberativas. Saiba mais em sescsp.org.br/sobreosesc.
Serviço:
Nise da Silveira: a revolução pelo afeto
Local: Sesc Belenzinho
Período expositivo: 9 de dezembro de 2022 a 26 de
março de 2023
Horário de funcionamento: Terça
a sábado, das 10h às 21h. Domingos e Feriados, das 10h às 18h
Acessibilidade: Rampas, elevadores, pisos tátil,
banheiros adaptados e outros equipamentos acessíveis.
Classificação indicativa: Livre | Entrada gratuita
Estacionamento: De terça a sábado, das 9h às 21h.
Domingos e feriados, das 9h às 18h
(Valores do estacionamento: credenciados
plenos do Sesc: R$ 5,50 a primeira hora e R$ 2,00 por hora adicional. Não
credenciados no Sesc: R$ 12,00 a primeira hora e R$ 3,00 por hora adicional.)
SESC BELENZINHO
Endereço: Rua Padre Adelino, 1000.
Belenzinho – São Paulo (SP)
Telefone: (11) 2076-9700
sescsp.org.br/Belenzinho
Transporte Público
Metrô Belém (550m) | Estação Tatuapé (1400m)
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