Reindustrialização do País exige muito mais que discurso
O governo federal vem
anunciando, em especial nas palavras do vice-presidente e ministro do
Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, um programa
de reindustrialização do país, baseado na competitividade e no aumento de
produtividade.
É, sem dúvida, um
discurso direcionado mais ao setor do que à sociedade. Falta, entretanto,
detalhar tal iniciativa que não se sustentará nem a curto nem a médio prazo sem
clareza nas medidas a serem adotadas porque promessas e intenções não são
capazes, por si só, de aumentar a competitividade industrial e, muito menos, de
transformar o setor.
O Brasil, embora esteja
honrosamente entre a 10ª e 12ª maiores economias do mundo, ocupa a vergonhosa
61ª posição no ranking de competitividade (é a 5ª pior entre as 65 nações
objeto do estudo). Além disso, é apenas o 87º colocado no Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) e amarga a 6ª pior posição no mundo no Coeficiente
de Gini, que mede a desigualdade socioeconômica dos países.
É difícil acreditar que
os investidores e os industriais do setor privado se convençam da seriedade da
promessa do governo sem conhecer sequer a carga tributária à qual o país será
submetido, em especial o setor produtivo, como resultado da reforma tributária
em tramitação no Congresso Nacional.
Mas não é só. O setor
ainda desconhece qual a política de austeridade fiscal a ser aplicada para o
controle da inflação e da redução drástica do déficit público, hoje em torno de
R$ 800 bilhões/ano. Também não sabe com clareza qual é o programa do governo de
redução de custos e como serão obtidos os recursos para investimento em
infraestrutura portuária, ferroviária, rodoviária e saneamento básico.
Tampouco há clareza
quanto à política do Banco Nacional de Desenvolvimento e Social (BNDES), suas
prioridades e taxas para empréstimos de longo prazo.
Embora o novo governo
já tenha entrado no segundo semestre de gestão, muitos pontos de suas ações
anunciadas ainda permanecem obscuros. E isso não é bom. Políticas industriais
necessitam de segurança jurídica, pois a maturação somente se dá em longo
prazo, em 10 a 15 anos.
Sem isso o Brasil não
conseguirá deixar a vexatória posição que ostenta no ranking mundial de
competividade, elaborado pelo IMD Competitiveness Center, em parceria com a
Fundação Dom Cabral e recentemente publicado pelo jornal Valor Econômico. Esse
índice aponta que, entre 65 nações analisadas, superamos penas a África do Sul,
Mongólia, Argentina e Venezuela.
O estudo do IMD
examinou cerca de 300 dados econômicos e sociais dos países e realizou 6.000
entrevistas com executivos, concluindo que os resultados negativos são fruto da
percepção negativa sobre a legislação tributária e sobre o nível de facilidade
de fazer negócios. Outros fatores importantes também foram analisados,
como inovação, marcos regulatórios e a revolução do sistema educacional.
Mais do que promessas
genéricas, o Brasil precisa de uma política agroindustrial clara e inovadora.
Não se pode perder de vista a importância econômica para o país das atividades
provenientes do solo e do subsolo. Agrobusiness, agroindústria, mineração e
metalurgia, juntos, são responsáveis por irrigarem a economia nacional.
O agrobusiness,
sozinho, é responsável por mais de 25% do nosso Produto Interno Bruto (PIB).
Responde, ainda, por 30% das exportações e oferece 21% dos empregos no país. A
indústria mineral e a dos combustíveis de petróleo ou de minerais e óleos
brutos de petróleo ou minerais crus, somados, garantem mais de 5% do PIB, 26% das
exportações e de 10 a 12% dos empregos. Em resumo, o solo e o subsolo são
responsáveis por mais de 30% do PIB, quase 60% das exportações e 1/3 dos
empregos formais no país.
Esses números dão a
dimensão da importância do meio ambiente e dos recursos naturais para a
economia brasileira. Fundamental, portanto, que o haja segurança jurídica para
o agrobusiness e para a indústria mineral, com regras ambientais claras,
transparentes e duradouras, englobando financiamentos, plano safra e combate às
invasões de terras produtivas, dentre outras medidas.
No setor industrial, a
baixa produtividade é um problema indisfarçável que precisa ser enfrentado com
urgência. Enquanto a produtividade média da indústria sul-coreana nos últimos
50 anos cresceu à taxa de 4,3% ao ano, no Brasil esse crescimento patinou em
meros 0,7% ao ano, o que acarretou inclusive enormes reflexos negativos nos
salários e, portanto, na renda familiar dos cidadãos. O aumento da
produtividade na Coréia do Sul representou aumento médio real de remuneração de
4,3% ao ano, os brasileiros tiveram aumento real médio de apenas 0,3% ao ano.
Não é preciso dizer em qual país houve melhoria na qualidade de vida e no
processo distributivo de renda.
Eis, nesse particular
do crescimento da produtividade, intrínseca relação com a questão educacional.
O Brasil nunca priorizou a educação e sem ela não alcançaremos os índices de
produtividade e sociais dos países desenvolvidos e dos emergentes asiáticos. Em
todos eles, a educação universal e de qualidade foi mola mestra do
desenvolvimento.
O Brasil pode caminhar
para mudança de patamar se implementar uma profunda mudança, com adoção de
ensino fundamental e ensino médio em tempo integral; investimentos em novas
escolas para alunos em tempo integral, remuneração digna de professores com
plano de cargos e salários estabelecidos, fiscalizados e cumpridos, acompanhado
de capacitação, reciclagem e incentivos; adequação da grade curricular com
disciplinas voltadas às novas tecnologias e exigências do mercado de trabalho;
estabelecimento e cumprimento de metas.
Em educação não cabe
política entre amigos e nem partidária. O verdadeiro salto nesse segmento exige
política de estado, afinal é a base de tudo. Mais que isso: é o único caminho
para a redução da vergonhosa desigualdade de renda e capaz de gerar aumento do
valor adicionado da economia dentro do país.
Todos aspiramos a
eliminação do abismo social que diferencia cidadãos da mesma nação,
discriminando e penalizando a maior parte da população. Todos aspiramos ser
brasileiros de classe única.
*Samuel Hanan é engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário, e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002). Autor dos livros Brasil, um país à deriva e Caminhos para um país sem rumo. Site: https://samuelhanan.com.br
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