A seca do Rio Amazonas e os impactos logísticos e econômicos para a região Norte
Por
Maurício Trompowsky
Uma das
vias fluviais mais imponentes do mundo, o Rio Amazonas, é parte essencial da
infraestrutura de transporte de cargas na região norte do Brasil. De acordo com
dados da Agência Nacional de Transportes
Aquaviários (ANTAQ), somente em 2022, a Região
Hidrográfica Amazônica foi responsável pelo transporte de mais de 71 milhões de
toneladas de cargas, sendo o Rio Amazonas a principal via utilizada, tendo sido
transportado por ela mais de 34 milhões de toneladas, entre alimentos,
materiais de construção, insumos para a indústria, combustíveis, entre outros.
No entanto, a severa seca que atinge o rio nos últimos anos vem desafiando a
logística de Manaus e arredores de maneira significativa.
O problema
da seca do Rio Amazonas tem se agravado nos últimos 10 anos, e registrou
recorde em 2022, de acordo com dados da Agência Nacional de Água e Saneamento
Básico (ANA), o que impactou substancialmente a navegação na região. Como
consequência, entre outubro e novembro do ano passado, houve uma restrição de
40% a 50% na capacidade de navegação pela via.
Isto
porque, independentemente do tamanho do navio, todas as embarcações sofrem
restrição de capacidade quando a profundidade fica abaixo de 14 metros. Para
profundidades abaixo de 9,5 metros, por exemplo, o risco à navegação é elevado
por impactar na manobrabilidade dos navios, gerando prejuízos à performance dos
motores e equipamentos de bordo.
Neste
sentido, a projeção é de que as restrições previstas para 2023 sejam ainda
maiores do que em 2022, podendo colocar em risco a navegação pelos trechos
críticos e, em um pior cenário, impossibilitando as viagens de/para Manaus por
comprometer a segurança das embarcações, das tripulações e do meio ambiente.
Para se
ter uma ideia, neste ano, a Marinha já restringiu a navegação noturna em pontos
críticos de rios da Bacia Hidrográfica do Amazonas por meio da Portaria Nº 158,
publicada em agosto no Diário Oficial da União (DOU), pela Capitania Fluvial da
Amazônia Ocidental (CFAOC), o que reforça a gravidade da situação na região.
O
cenário e os impactos da seca para a região
Manaus,
como a capital do estado do Amazonas e segundo maior porto nacional em
movimentação de contêineres da cabotagem,
desempenha papel fundamental na economia da região Norte do Brasil. A cidade
abriga diversas indústrias, incluindo a de eletrônicos, motocicletas e produtos
químicos, e depende fortemente de um sistema de logística eficiente para o transporte de matérias-primas e produtos
acabados.
Com o
período de estiagem, a baixa profundidade dos rios restringe o calado e
dificulta a navegação de embarcações de grande porte, impactando a capacidade
de oferta e trazendo grande risco de desabastecimento da região, tanto de
insumos básicos, como alimentos e itens de higiene e limpeza, quanto de insumos
para a produção do Polo Industrial de Manaus (PIM). Além disto, com a redução
da capacidade de transporte fluvial, as empresas enfrentam custos mais elevados
para o transporte de mercadorias, o que gera prejuízos de competitividade.
Em 2022,
as mais prejudicadas foram as empresas do setor de construção civil, com
algumas indústrias cimenteiras deixando de atender a região do Amazonas no
período da seca. O transporte de grãos, fertilizantes e combustíveis via
navegação também foi praticamente paralisado no ano passado no Rio Madeira, que
integra a bacia do Rio Amazonas, banhando os Estados de Rondônia e Amazonas.
Com um total de aproximadamente 3,3 mil quilômetros, ele é o 17º maior rio do
mundo em extensão, de acordo com dados da ANA, o que traz uma série de
problemas logísticos.
Diante
desse cenário, algumas companhias já têm procurado antecipar suas demandas,
avançando com os estoques, como forma de reduzir os impactos negativos durante
o período mais crítico da seca do Rio Amazonas, embora para produtos
perecíveis, tal estratégia não seja possível. Entretanto, essa procura ainda é
tímida e não vem refletindo o tamanho dos riscos de restrição previstos, que
podem levar a um panorama de desabastecimento local.
Fenômenos
naturais e impactos do El Niño
Por ser um
fenômeno natural, é um desafio realizar previsões de até quando esse cenário de
seca perdurará. Mas o fato é que a estiagem começou mais cedo este ano em
relação aos anos anteriores, com impactos agravados ainda pelo fenômeno do El
Niño, que, no Brasil, aumenta o risco de seca das regiões Norte e Nordeste e de
grandes volumes de chuva no Sul do país.
De acordo
com dados do Porto de Manaus, no período de 1902 a 2022, no Rio Negro, as medições
de menor profundidade aconteceram 58 vezes no mês de outubro e 47 no mês de
novembro. Ou seja, nos últimos 122 anos, as piores estiagens foram registradas
105 vezes nos meses citados acima, enquanto, em 2023, observamos um cenário de
alerta já no mês de setembro.
Entretanto,
mesmo que as forças da natureza não possam ser controladas, é fundamental que
ações mitigatórias sejam realizadas, a fim de evitar ou contornar problemas
ainda maiores. Neste sentido, a realização de batimetrias atualizadas, por exemplo,
é essencial para a segurança da navegação na região e para maior controle e
gestão da capacidade das embarcações.
Além
disto, com relação ao assoreamento, principalmente na foz do Rio Madeira, é
crucial que sejam identificadas as causas da redução das profundidades,
elaboradas medidas para evitar a continuidade deste fenômeno, bem como ações
corretivas de médio e longo prazo para reestabelecer a profundidade original
dos rios.
Nesse
cenário, portanto, é essencial que os setores público e privado trabalhem
juntos para implementar soluções sustentáveis que protejam não apenas a
logística, mas também o meio ambiente da região. Somente por meio da cooperação
e da inovação, será possível superar os desafios impostos pela seca do Rio
Amazonas e garantir um futuro próspero para Manaus e seus arredores.
Maurício Trompowsky é Diretor de Operações na Log-In Logística Intermodal, empresa de soluções logísticas, movimentação portuária e navegação de Cabotagem e Mercosul.
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