Setor quer rentabilidade maior em transmissão
A ausência de ofertas para quatro empreendimentos no
primeiro leilão de transmissão após a aprovação da Lei 12.783 (Antiga MP 579,
da prorrogação das concessões), na sexta-feira, é um indicativo do novo cenário
do mercado elétrico. Para especialistas, as empresas, principalmente a
Eletrobras (a mais afetada pela lei), ainda estão analisando os efeitos da medida,
aceitando menos riscos e exigindo taxas de rentabilidade mais adequadas à nova
realidade.
Dois participantes frequentes dos leilões de transmissão, o
grupo Eletrobras e a Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista
(Cteep), que aderiram à proposta do governo de renovação onerosa das
concessões, não adquiriram novas linhas na sexta-feira. A Cteep inclusive nem
se inscreveu para o leilão. A fraca competição se traduziu em um deságio médio
de 11,96%, considerado baixo para o histórico dos leilões da Agência Nacional
de Energia Elétrica (Aneel).
"O resultado pode indicar desajustes no modelo, pois os
leilões de linhas de transmissão sempre foram um bom medidor de temperatura do
ambiente regulatório", afirmou o coordenador do Grupo de Estudos do Setor
de Energia Elétrica (Gesel/UFRJ), Nivalde Castro. Para ele, o leilão é
repercussão dos efeitos da Lei 12.783.
Segundo Castro, o caso da Cteep é o mais
"emblemático" porque três dos quatro lotes que não receberam ofertas
estão situados em São Paulo, área de forte influência da companhia. A empresa,
inclusive, poderia obter ganhos de escala entre os novos projetos e
empreendimentos que fazem parte de sua carteira, como o sistema de escoamento
da energia das hidrelétricas do Rio Madeira (RO) para a subestação Araraquara 2
(SP).
No mercado, comenta-se que o comando da Cteep, controlada
pela colombiana ISA, está insatisfeito com o desdobramento do processo de
prorrogação das concessões. Em dezembro de 2012, o conselho de administração da
companhia reviu sua decisão de rejeitar a proposta do governo, com a promessa
de que receberia uma indenização adicional por seus ativos, devido à
reconsideração dos investimentos residuais anteriores a 2000. Até agora, no
entanto, esse ponto ainda não foi regulamentado.
"Quanto a não participação no último leilão de
transmissão, a Cteep reitera que irá readequar o perfil da dívida da companhia
ao novo nível de receita e aguarda também a definição sobre o valor da
indenização de ativos não amortizados anteriores a maio de 2000 para a retomada
de seu ciclo de crescimento", informou a empresa, em nota.
O sócio-diretor da consultoria Tempo Giusto e ex-presidente
da AES Brasil, Eduardo Bernini, chamou a atenção para outro fator de
desestímulo: a baixa taxa de retorno nominal para o setor de transmissão, da
ordem de 5%, o que representa um prêmio muito pequeno em relação a
investimentos mais conservadores, como os títulos do Tesouro.
"Não me parece que o governo tem sido claro ao
considerar o rol de riscos de investimentos, não só em energia elétrica, mas em
infraestrutura em geral, ao definir o que é a taxa mínima de
atratividade", afirmou Bernini.
A baixa taxa de retorno pode explicar a ausência no leilão
de empresas que não sofreram impactos da Lei 12.783, como a gigante chinesa
State Grid. A companhia, que no ano passado declarou interesse nos sistemas de
transmissão de energia da hidrelétrica de Belo Monte (PA), não disputou dois
lotes que fazem parte desse pacote e foram ofertados na sexta. Essas concessões
foram arrematadas pelas espanholas Abengoa e Isolux.
A State Grid, porém, informou em nota que "neste
momento está focada na incorporação das concessionárias adquiridas da ACS
[Actividades de Construcción y Servicios] e nos projetos que mantém com seus
parceiros Furnas e Copel ". A empresa ressaltou que continua avaliando a
participação em futuras oportunidades de investimentos.
Segundo o diretor-executivo da Associação Brasileira de
Grandes Empresas Transmissoras de Energia Elétrica (Abrate), César de Barros
Pinto, a falta de ofertas para os lotes e a ausência de empresas no leilão
"vale como um alarme para refletir sobre a regulação do setor". Ele
acrescentou que o segundo leilão de transmissão do ano, cujo edital está em
audiência pública, está muito próximo e não haverá tempo hábil para
aperfeiçoamentos.
Outro problema da falta de ofertas para os quatro lotes é o
risco para o sistema elétrico brasileiro. De acordo com o Programa de Expansão
da Transmissão (PET) 2013-2017, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética
(EPE) e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), esses empreendimentos
precisavam entrar em operação entre janeiro deste ano e maio de 2015. Como o
prazo de construção estimado no PET para esses projetos é de 24 meses, todos
eles iniciarão a operação com atraso em relação ao marco previsto inicialmente.
Barros, da Abrate, lembrou que, como o edital do próximo
leilão já está em audiência pública, aparentemente não será possível incluir
esses ativos na licitação. O diretor da Abrate, no entanto, disse que a
situação ainda não chega a ser preocupante.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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