Um potencial imenso desperdiçado
Carecemos de ações coordenadas entre os setores público e privado que divulguem e deem segurança para quem quer conhecer os inúmeros atrativos do nosso País
Em 2014, o Brasil recebeu 656 mil turistas americanos. Eles vieram ocupando cerca de 40 poltronas por dia, espremidos entre 208 brasileiros em cada avião. São cinco brasileiros para cada americano em rotas majoritariamente da Flórida, Atlanta, Dallas e Houston. Segundo a revista Época, a média de 1.800 americanos circulando nos aeroportos brasileiros por dia representa 0,5% do total de americanos que viajaram para fora do seu país. Mais ou menos na mesma época, a Índia recebeu pouco mais de 1,2 milhão de turistas americanos. A Índia também exige e cobra pelo visto de turista dos americanos e fica muito longe dos Estados Unidos, fala um inglês todo especial para um turista de Arkansas, e suas condições de locomoção estão longe de se parecer com as autobahns alemãs. A alimentação oferece desafios sérios aos paladares menos acostumados ao “diferente” e o calor e as distâncias a serem percorridas a pé podem acabar com suas férias. Por que fazem todo este sacrifício, então, os 1% de viajantes internacionais norte-americanos? Porque a Índia oferece uma experiência que não pode ser vivida em nenhum outro lugar, só na Índia – e isto tem um preço. Em 2014, os indianos cobraram esse preço a 23 milhões de turistas, e significou quase 7% do PIB do país e cerca de 37 milhões de pessoas empregadas.
Mas por que eu estou falando tanto da Índia? Porque muitos dos meus pares acreditam que as dificuldades do Brasil no cenário turístico mundial se devem ao fato de estarmos longe, de não falarmos inglês, do visto que exigimos e da nossa indigesta feijoada. Vamos falar de outra coisa então. Segundo o governador da Flórida, Rick Scott, falando para hoteleiros, operadores de receptivo, restaurantes e transportadores turísticos, em 2014, 97 milhões de turistas visitaram Orlando, sendo 1,5 milhão de brasileiros, ou seja, 1,54% do total, segundo a globo.com. Somando a eles os britânicos, japoneses, canadenses e mexicanos, chegaremos ao percentual de cerca de 85% de turistas americanos na Flórida. Porque tantos americanos assim? Porque, para ir lá, os americanos, não precisam de passaporte, falam a mesma língua, não têm uma barreira gastronômica, e obviamente, por uma liberdade semântica minha, porque dá para ir a Disney “a pé”, se você morar no "Sul profundo" americano. No caso do Brasil, esse é o mesmo motivo para que a arrasadora maioria de brasileiros vai a Porto Seguro, Foz do Iguaçu, Salvador, Fortaleza e no Rio de Janeiro.
Na década passada, eu ouvi do então prefeito de Curitiba que “a cidade boa para os turistas é a cidade boa para seus habitantes”, e que os melhores investimentos que você pode fazer em promoção turística são os investimentos na qualidade de vida da sua população. Nos dias de hoje, a tecnologia da comunicação tornou suas sábias palavras ainda mais evidentes. Imagens ao vivo na CNN mostram arrastões na praia no Rio de Janeiro. O surto de dengue e a microcefalia? Na Fox News, o diretor do hospital de Fortaleza reclama da falta de recursos. Na capa dos New York Times, aparece o enésimo político flagrado tungando a merenda. Consequentemente, as autoridades americanas avisam: “Está pensando em ir ao Brasil? Pense de novo...”
Pense agora no que o cinema fez às nossas cabeças quanto ao nosso desejo de visitar a Índia, Paris, Flórida e Nova York. Já a nossa propaganda mais “eficiente” no cinema são as imagens e diálogos de Dadinho e o capitão Nascimento em Cidade de Deus. Ou seja: tendo inúmeros lugares entre os mais belos do mundo, apenas conseguimos vender nossos problemas e deficiências sociais. A política de turismo que precisa ser implantada inclui, é claro, um film comission atuante, publicidade e feiras internacionais, isenção de tarifas para charters etc. Carecemos de uma ação coordenada que dê segurança e tranqüilidade para quem quer curtir um samba, dançar um forró ou qualquer um dos atrativos de nosso país. Este não é um caso de varejo – se uma cidade ou outra é mais ou menos segura –, mas sim de atacado. Precisamos que nossa imagem seja reconstruída com urgência sob pena de dependermos dos nossos próprios bolsos ou da oscilante balança do turismo entre o Brasil e a Argentina.
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