Infância: a importância de falar sobre quem já partiu
Psicopedagoga Luciane Pires chama atenção dos
familiares para uma conversa aberta sobre morte e o passado
Pode não ser
um assunto fácil de tratar, mas é inevitável. Para a psicopedagoga Luciane
Pires, a morte deve ser, sim, inserida na conversa com as crianças em casa, mas
não somente: acontecimentos do passado também precisam ser abordados, sejam
eles bons ou ruins.
Luciane explica que falar sobre estes
temas é uma forma de incluir as crianças no contexto familiar, fazendo com que
se sintam uma parte importante do grupo. Além disto, auxilia no desenvolvimento
dos pequenos que aprendem, desde cedo, a lidar com as adversidades da vida e
ajuda a trabalhar alguma “ferida” emocional escondida no inconsciente.
A literatura infantil pode ser uma
grande aliada para a compreensão de assuntos delicados como estes. Por
isto, Luciane lança o livro Tenho
um lugar para você, que trata, principalmente, sobre a
importância de envolver a criança nos assuntos familiares.
Confira a entrevista exclusiva com a
autora e saiba mais sobre o assunto:
1. Quando e como surgiu
sua paixão pela escrita?
Ainda criança, antes de começar da
alfabetização, sentia uma vontade muito grande de ler sozinha para poder fazer
a leitura dos meus gibis. Adorava as histórias em quadrinhos e os livros de
Walt Disney. E pensava também que, assim que eu começasse a escrever, iria
anotar meu dia a dia e minhas ideias, que eram muito fluentes na mente! Sempre
gostei de fazer redações na escola e em casa gostava muito de ler livros e ter
um caderno para os resumos. Em muitos momentos na idade adulta, acordava de
madrugada com ideias na cabeça e começava a fazer alguns escritos.
2. Como e quando surgiu
a oportunidade e motivação de escrever esta obra infantil?
Especificamente essa obra veio da
necessidade de registrar a situação que vivenciei com meu filho. Ainda como
aluna do curso em constelação familiar, levei o tema da desatenção e o desânimo
na escola. E o campo da constelação mostrou o movimento inconsciente dele de
olhar para o irmão que morreu cedo.
A partir do momento em que a situação
foi olhada por mim como mãe e foi revelada a ele que, até então, não sabia da
existência desse irmão, seu comportamento na vida modificou. Meu filho ficou
mais falante, atento e alegre. Recebi, inclusive, esse feedback da escola.
Depois de algum tempo, numa tarde, me
veio a ideia da escrita desse fato como uma história para que eu pudesse ler
para ele. Assim, fiz a escrita do livro, entendendo que poderia ser mais uma
forma de elaboração dessa perda para meu filho.
3. Qual é a principal
mensagem que o livro traz aos pequenos leitores? E aos adultos?
Aos pequenos leitores, a importância de
se situar no seu lugar na família. Percebendo-se o filho como o pequeno em
relação aos pais e sabendo seu lugar junto à sua irmandade. Assim, estamos no
nosso lugar de força e de mais alegria na vida. Aos adultos, a importância do
olhar sensível para a família. Quando um membro dessa família não está bem,
pode haver alguma dinâmica inconsciente acontecendo.
Em geral, percebemos que as crianças,
principalmente os mais novos, podem se colocar a serviço da reparação de algum
esquecimento ou exclusão de uma situação/pessoa na família. Isso ocorre de
forma inconsciente e, em geral, como uma atitude muito amorosa em relação ao
que está a parte. Isso se denomina, segundo Bert Hellinger, uma transgressão à
ordem do amor, ou seja, todos fazem parte da família, mesmo aqueles que não
puderam ficar ou realizam atos condenados pela sociedade.
A isso chamamos de o “direito de
pertencer” ou “pertencimento”. Se há alguma exclusão, o sistema familiar busca
o retorno para a harmonia, fazendo com que alguém do sistema traga à tona o
tema/situação. Outro importante fator envolvido é a “hierarquia”: todos têm seu
lugar na família. Para um filho saber que ele não é o primeiro, por exemplo, o
“libera” de ter de agir de forma que lembre um primeiro irmão esquecido.
4. Teve algum escritor
ou escritora como inspiração?
Especificamente quanto ao tema, os
ensinamentos de Bert Hellinger fizeram muito sentido para mim quando comecei a
estudar sobre Constelações Familiares. “Um lugar para os excluídos”, “No centro
sentimos leveza”, “As ordens do amor”, além do livro autobiográfico “Bert
Hellinger: meu trabalho, minha vida”, publicado em 2020, são livros que posso
citar como importantes para eu me apropriar desses conhecimentos!
Mas, os livros da adolescência, que mais
marcaram foram: “Dibs em Busca de Si Mesmo”, “O pequeno príncipe” e “Fernão
Capelo Gaivota”. Todos foram leituras realizadas quando estava no Curso de
Formação de Professores, que frequentei entre 13 e 16 anos.
5. Você é psicóloga,
pedagoga e psicopedagoga. Quais são os desafios de conciliar a sua carreira com
a de escritora?
A carreira de escritora é algo muito
novo na minha vida. Resolvi aventurar-me nessa nova possibilidade a partir da
pandemia. A situação com meu filho ocorreu em 2019 mas, fiz o processo de
escrita final desse livro no final de 2020.Em janeiro de 2021 que resolvi fazer
dele um livro para que pudesse ser publicado. Estou me habituando a essa nova
carreira que trouxe bastante leveza e alegria para minha vida. Apesar de ser um
processo de muita responsabilidade, a escrita sai com facilidade e as histórias
fluem de forma que entendo que fica mais leve de repassar conhecimentos que nem
sempre são tão fáceis de lidar e explicar.
Tenho o desafio de coordenar o tempo
dedicado aos atendimentos e ao trabalho que realizo em escola com as leituras
que quero fazer. Mas estou num caminho de organização e estruturando bem esses
momentos.
6. Você fez alguma pesquisa
para escrever o livro? Quanto tempo levou para escrevê-lo?
Tudo começou por eu estar frequentando o
curso promovido por Marisa Marques e Claudia Aroucas, do antigo Instituto
Crescer, hoje, Instituto Multiportas de Práticas Sistêmicas. Naquele momento,
deparei-me com a bibliografia de Bert Hellinger, grande sistematizador das
constelações familiares sistêmicas. E também com a vivência que trouxe à tona a
questão que deu origem ao livro. Depois da escrita do livro, busquei
orientações com Solange Mesquita, psicóloga que também trabalha com
constelações familiares.
Depois da escrita do livro, a revisão
sobre a coerência dos conhecimentos sistêmicos abordado no livro foi realizado
por Wilma Oliveira do IDESV (Instituto Desenvolvimento Sistêmico da Vida), liderado
por ela e seu marido, Décio Fabio de Oliveira Jr. O casal é sócio-fundador da
Atman, editora que enviei meu livro para que fosse avaliado para uma possível
publicação. O aceite veio muito rápido e as orientações de alguns detalhes
técnicos que foram necessários para que ele fosse publicado como aconteceu. Em
2020 fiz a escrita, e em outubro de 2021 foi publicado.
7. Além deste
lançamento infantil, você já está trabalhando em um novo livro. O que os
leitores podem esperar desta nova obra?
Escrevi outro livro que ainda será
lançado. Ele também é para o público infantil, mas pode ser material de estudo
para adultos e profissionais da minha área. O tema é sobre a criança interior e
traz a história de Lucinha, que é a parte criança que existe na Lúcia - mulher
adulta que resolve olhar para uma memória do passado e cuidar dessa sua parte
criança que ainda sofria.
Também traz contribuições para a visão
sistêmica sobre a vida. O livro se chama “Isso não é meu”, ensinando o que a
criança precisa aprender quando na relação com os pais. Mostra a importância do
não envolvimento das crianças com os problemas do casal e com as questões dos
adultos. Tema que é muito recorrente nas relações entre pais e filhos e que
podem causam muito sofrimento às crianças que com sua imaturidade ficam
envolvidas nas situações que não podem ser resolvidas por elas.
Além disso, estou amadurecendo a ideia
de uma escrita romanceada sobre minhas experiências de autoconhecimento
enquanto cliente da psicologia. Afinal, para estarmos bem para realizar
atendimentos é necessário muito processo e desenvolvimento pessoal!
Para acessar o release do livro “Tenho um lugar para você” clique aqui!
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