Ativismo versus oportunismo minoritário na gestão de empresas
Alexandre Gossn Barreto e Victor Guita
Campinho*
Nas últimas décadas, o legislador e, em
especial, o regulador buscaram facilitar aos acionistas a fiscalização e
contribuição ativa na orientação dos negócios sociais em prol do
desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro. Para tanto, a Lei das S.A. garante
instrumentos – e a regulamentação da CVM facilita – aos minoritários direitos
como o de solicitar informações, convocar de assembleias gerais, propor ação de
responsabilidade contra administradores, indicar membros para os conselhos de
administração e fiscal, entre outros.
Investidor ativista é aquele que faz uso
das prerrogativas para monitorar a gestão da companhia e busca influenciar no
processo decisório a fim de garantir que seus direitos e o interesse social
sejam observados.
Nesse sentido, os ativistas, que visam à
geração de valor no longo prazo, cumprem importante papel no aprimoramento da
governança da companhia e na supervisão da aplicação da Lei e da
regulamentação. Por outro lado, apesar do tabu em torno do tema, o minoritário
não pode ultrapassar os limites dos direitos que lhes são conferidos de modo a
gerar prejuízos à companhia, devendo tais abusos ser coibidos com o mesmo rigor
que aqueles cometidos pelo controlador.
Interessante notar, no entanto, que nos
mais de 45 anos de história da CVM não foi identificado um único processo
sancionador julgado pela autarquia envolvendo abusos cometidos por acionistas
minoritários.
Nota-se que com a evolução do nosso
mercado, deu-se o amadurecimento dos stakeholders, uma dispersão cada vez
maior das bases acionárias das empresas e, em paralelo, a evolução da
regulamentação da CVM e da autorregulação de forma a viabilizar o exercício
efetivo de direitos por minoritários.
Por outro lado, todos esses fatores
somados à absoluta ausência de precedentes na CVM levados a julgamento apurando
a responsabilidade por eventuais abusos de minoritários, contribuem não só para
o crescimento do ativismo – mas também para sua distorção, o comportamento
oportunista e predatório.
Isso porque, não obstante tal inexistência
de precedentes, tem sido cada vez mais frequentes as ações de minoritários em
claro desacordo com o interesse social, abusando do direito de requerer
informações, ao inundar a companhia de notificações, apresentar denúncias
vazias e reclamações sem substância, exclusivamente com o intuito de tumultuar
o andamento dos negócios sociais e muitas vezes em momentos críticos da vida
das companhias (como em operações de combinação de negócios ou reorganizações
societárias). O interesse é um só: extrair da companhia e controladores, sob
pressão, vantagens particulares no curto prazo. A situação é agravada no
cenário atual, no qual a disputa acontece não mais nos autos dos processos,
mas, principalmente, em redes sociais, com o poder de veicular informações em massa,
causando prejuízos imediatos à companhia aberta, seus acionistas e demais
agentes envolvidos, bem como à regular formação de preço dos valores
mobiliários, independentemente da veracidade dos fatos articulados.
Tais situações de evidente abuso de
minoria, espécie do gênero abuso de direito, constituem conduta ilícita
caracterizada por atos praticados em detrimento do próprio interesse social.
Significa dizer que quem arca com o custo que surge da conduta oportunista é
toda a comunidade acionária.
Ao que se nota, a necessidade de análise
casuística para a sua caracterização, ao lado dos poucos casos julgados que
tratassem do assunto tornam incipientes as discussões a respeito de abuso de
minoria no Brasil. Nada obstante, considerando evolução do nosso mercado, é
fundamental que as autoridades também passem a coibir situações de abuso
perpetrado por minoritários, com vistas à preservação justamente do salutar
ativismo responsável, que traz benefícios não só à companhia, mas ao mercado de
capitais como um todo, ao garantir sua estabilidade.
*Alexandre Gossn Barreto e Victor Guita Campinho são, respectivamente, sócio e associado sênior de Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados
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