O imbróglio jurídico em torno do setor de óleo e gás no Brasil
* Por Júlio Cepêda
O setor de óleo e gás no Brasil convive há 20 anos com uma grande insegurança jurídica no que diz respeito às regras tributárias que regulam a indústria. Desde a edição da Lei no 9.478, que permitiu a abertura do mercado, mas não trouxe regras fiscais específicas para o setor, até os dias de hoje, com a exposição a ações locais como o recente cancelamento das regras sobre o tratamento de importações e exportações com base no Repetro pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, as empresas que atuam na área enfrentam uma série de alterações – e omissões – legislativas que acabam afastando investidores e comprometendo a cadeia de fornecedores. Além disso, cria-se um ambiente que inviabiliza o bom planejamento e a execução dos investimentos de longo prazo, típicos do segmento de óleo e gás.
As discussões tiveram início em 1997 com a referida Lei no 9.478, que dispôs sobre as políticas nacionais para o aproveitamento racional das fontes de energia, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, instituiu o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo. Ela permitiu a entrada de outras empresas no setor, além da Petrobras que detinha o monopólio. Já em 2002, visando aumentar a arrecadação, o estado do Rio de Janeiro, um dos principais produtores de petróleo do país – que tem 30% do PIB oriundos dessa área –, sancionou a Lei n° 3.851. Conhecida como Lei Valentim, ela permitida a cobrança de ICMS na importação, seja sob admissão temporária ou não, de bens a serem utilizados na produção de petróleo no litoral do Estado. Em 2003 foi publicada uma outra lei, de número 4.117, a chamada Lei Noel, que determinava a incidência de ICMS sobre a operação de extração de petróleo.
Entre questionamentos a respeito da inconstitucionalidade das referidas leis iniciados pelos órgãos e associações do setor, a indústria passou quase uma década sem saber o que realmente aconteceria com relação à cobrança do ICMS no Rio de Janeiro. Para apaziguar essa situação e atrair investidores, o governo do Rio editou o Decreto n° 41.142, de 23 de janeiro em 2008, que determinava a isenção e redução de base de cálculo do ICMS em operação com bens ou mercadorias destinadas às atividades de pesquisa, exploração ou produção de petróleo e gás natural.
Entretanto, a calmaria aparente e esperada pelo setor começou a ter fim quando se deu início a outras duas discussões: a redistribuição da receita oriunda dos royalties do petróleo, que é uma compensação paga pela extração do produto, diminuindo o repasse de dinheiro para estados e municípios produtores e aumentando para os não produtores; e a queda abrupta do preço do petróleo no mundo. Diante dos sinais de crise financeira e numa nova tentativa de aumentar a arrecadação com a extração do petróleo, o estado do Rio ainda editou a Lei n° 7.183, de 30 de dezembro de 2015, que ficou conhecida como a “nova lei Noel”.
Ela determina a cobrança da alíquota na etapa compreendida entre a extração do petróleo no estado do Rio de Janeiro e a passagem pelos pontos de medição da produção, sob a alíquota total de 20%. Ao apagar das luzes do ano de 2015, o governo fluminense editou a Lei n° 7.182, instituindo a Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização Ambiental das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Produção de Petróleo e Gás (TFPG).
Os contribuintes imediatamente questionaram as exigências perante o Poder Judiciário, dando-se início a uma nova enxurrada de discussões judiciais com o objetivo de suspender os efeitos. Não satisfeito, como já mencionado o Estado do Rio de Janeiro acabou cancelando o especial tratamento de importações e exportações sob o Repetro para fins de incidência do ICMS. Dessa forma, estrangula-se um setor que utiliza intensivamente a mão de obra, impactando a renda e afetando, principalmente, a cadeia de fornecedores nacionais. Tudo isso pode acabar acarretando a perda da competitividade do Rio para outros estados, como São Paulo, que já estão se organizando para receber a indústria.
O que se pretende ressaltar aqui é a necessidade de uma discussão mais profunda sobre a insegurança jurídica que o setor de óleo e gás vive há mais de 20 anos não só no Rio de Janeiro, mas no país todo. Vale lembrar que nessa briga com a indústria, há décadas, por causa das idas e vindas da cobrança do ICMS, a origem do problema está na Constituição Federal, que determina que arrecadação deste imposto estadual vá não para o estado produtor, mas sim para o estado de destino. São medidas que estão penalizando os estados produtores, os quais suportam riscos muitas vezes desconsiderados, como o impacto ambiental da atividade em seus territórios. Dessa forma, o Brasil precisa se posicionar de forma definitiva se quer estimular ou não um dos setores de maior relevância para impulsionar a economia brasileira.
* Júlio Cepêda é sócio da área de tributos em óleo e gás da KPMG
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