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A impossibilidade de utilização das taxas médias de mercado para a revisão de contratos de empréstimos

* Marcela Batista Fernandes e Waldiney de Oliveira Fernandes em colaboração com Márcio Cavenague

O poder judiciário vem pacificando entendimento de que, embora as instituições financeiras não estejam sujeitas à limitação das taxas de juros remuneratórios, conforme Súmula 596, do STF, os magistrados devem fazer análise da taxa de juros contratual com as médias de mercado apresentadas pelo Banco Central (BACEN) no mês da formalização do empréstimo.

Com a liberação da cobrança das taxas de juros, o Judiciário absorveu a obrigação de verificar da existência de abusividade no que tange às relações consumeristas com instituições financeiras. Para a verificação de abusividade de um valor de taxa de juros remuneratórios é necessário um parâmetro de comparação, sendo que a jurisprudência se inclina pela adoção das taxas de juros divulgadas mensalmente pelo Banco Central.

Ocorre que tal critério é inviável e da forma como vem sendo utilizado poderá impactar a economia nacional, pois os índices contidos no site do BACEN nada mais são do que a apuração das informações contábeis que todas as instituições financeiras, quando dos fechamentos dos seus respectivos balanços de créditos, informaram à instituição central. Ou seja, cada banco cadastrado no BACEN informa quantos contratos fez, que taxas aplicou em cada um deles e os valores que liberou de crédito. Em posse de tais informações o BACEN faz uma média e a divulga no seu sistema.

A utilização desse parâmetro em ações revisionais abre duas problemáticas principais. A primeira é que as médias são divulgadas sempre após a conclusão de um período de transações, ou seja, a média informada hoje refere-se às operações realizadas no mês anterior. Assim, a utilização desse critério impede que as instituições financeiras que passarão a compor o polo passivo tenham qualquer chance de se adequar à média, pois sequer dela tinham ciência no momento em que liberaram crédito aos seus consumidores.

A segunda é que a revisão com base nesse critério implica em constante alteração dele mesmo. Suponha-se que as instituições se baseiem pela última média disponibilizada pelo BACEN para realizar os seus contratos, cobrando exatamente a média divulgada, por exemplo, 20% ao ano, considerando que a instituição A cobrou 10% a.a e a B 30% a.a (10+30/2=20).

Se um consumidor ingressar com ação revisional de contrato, de acordo o entendimento atual da jurisprudência, logrará êxito em rever o seu contrato ao patamar de 20% de juros. Ocorre que, neste momento, a média de mercado não será mais 20%, pois para se chegar a esse valor foi considerado na média os 20% anteriormente aplicados, no caso de 30 a 10. O novo valor da taxa de juros média dessa operação considerando apenas dois bancos passou a ser de 15% ao ano (10+20/2=15).

Isso abre margem para que haja novo ingresso de uma ação revisional, quando a instituição B, que já reduziu os seus juros para 20%, tenha que novamente fazer esta redução, pois a nova média, calculada pelo teor das decisões judiciais, implica que ela está novamente cobrando encargos abusivos, e assim sucessivamente, até que tenhamos retornado ao limite dos juros a 12% ao ano e 1% ao mês, previstos na Lei de Usura. Torna-se um clico vicioso, pois a cada vez que o judiciário limita a taxa de juros à média do BACEN essa média é alterada e novamente ensejaria o ingresso de nova demanda para ajuste aos novos parâmetros, à nova média.

Afirmar que as instituições financeiras se encontram restritas às médias de mercado, que nada mais são do que o valor apurado pelas práticas dessas mesmas instituições, por isso, não há como se dizer que sejam inválidas as taxas aplicadas justamente por aqueles que contribuíram para a formação da média divulgada. A cada revisão de juros que o judiciário faz, proferindo sentenças que limitem os juros à média de mercado, a nova média não é calculada e, se fosse, outras instituições estariam passíveis serem polos passivos em demandas revisionais, pois estariam em desacordo com essa nova média, e por fim, teríamos um recálculo contínuo, num processo complexo e de difícil gestão, que abalaria toda a economia do país.

É contraditório que nosso ordenamento declare que não há fixação de taxas de juros e pleiteie limitá-las justamente à média, que nada mais é do que a apuração dos valores já praticados no mercado, incluindo-se aqueles que estão expostos à apreciação do judiciário para revisão de valores. O estabelecimento das taxas de juros contratuais à média de mercado fere o princípio constitucional da livre concorrência, prevista em seu artigo 170. Foi justamente primando pela observância desse dispositivo que se revogou as legislações que limitava as taxas de juros praticadas no mercado financeiro.

Limitar as taxas de juros a uma média, que será constantemente alterada a cada decisão do judiciário que reformar um único contrato, dentre milhões que são feitos diariamente, é um retrocesso e trará a médio prazo impactos econômicos gigantescos se não revisada a forma de sua utilização.

Marcio Alexandre Cavenague é advogado gestor do Bancário, Financeiro e Recuperação de Crédito do escritório Küster Machado. Formou-se em Direito (1998) pela UNIPAR (Universidade Paranaense de Umuarama). Tem especialização em Prática para exercício da Advocacia Previdenciária pelo Centro Europeu.

Marcela Batista Fernandes é Assistente Administrativa e Waldiney de Oliveira Fernandes, Assistente Técnico do Küster Machado.

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