Pesquisador do IAC fala sobre transgênicos X HLB
Em palestra, serão apresentadas as possibilidades científicas frente à solução da doença, que está em todo o Estado de São Paulo
A expressão bala de prata refere-se a algo capaz de resolver um grande problema, de maneira rápida e fácil. É sobre este anseio do setor citrícola em torno da realidade do HLB e as possibilidades existentes na esfera científica que o pesquisador irá falar ao público da Semana da Citricultura, o maior evento do Brasil nesse segmento.
Segundo ele, um dos milagres esperados viria da transgenia. Porém, “ela não tem chance de ser a bala de prata”. A explicação é complexa e virá mais para frente, mas, em resumo, a transgenia poderá não resolver por conta de o mercado oferecer sérias restrições para o consumo de fruta transgênica. Até chegar à solução via transgenia, requer um longo trabalho científico, que poderá não ser aproveitado, em razão da falta de aceitação do consumidor. “A questão da percepção pública é crítica, seria o primeiro transgênico de consumo direto”, diz o pesquisador, que também é coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Genômica para o Melhoramento de Citros.
De acordo com Machado, diretor do Centro de Citricultura “Sylvio Moreira” do IAC, a ciência ainda não descobriu as armas para combater a bactéria causadora do HLB. “Os americanos tentam com antibióticos, mas não existe ainda o alvo, por isso precisamos entender como funciona a bactéria”, explica. Ele afirma que é necessário encontrar este alvo e descobrir como fazê-lo percorrer dentro do floema da planta até chegar à bactéria. O pesquisador diz que pode ser via transgenia, ou por antibiótico, ou por pulverização ou ainda por aplicação no solo. “Esta é a bala de prata que temos que descobrir qual é e como utilizá-la”, resume.
Após essa descoberta viria a etapa de regulamentação do processo , que pode variar de seis a dez anos para fazer a regulamentação experimental, “porque a resposta da planta demora.” A fase posterior a esta seria a regulamentação comercial do material. Além de moroso, o processo de liberação de transgênico tem alto custo porque há muitos testes para serem feitos pela instituição responsável pelo desenvolvimento e também por entidades fiscalizadoras. “É necessário provar a performance agronômica e ambiental, que envolve os impactos para o solo, os animais, os insetos e para a saúde humana”.
Segundo Machado, esse processo teria quer ser feito em todos os tipos de laranja. “E isso não é trivial, em alguns casos é possível, em outros é mais difícil e em outros, inviável”, diz. O pesquisador também comenta que há a possibilidade de, após todos esses esforços, a ciência descubra a bala de prata e o produto, mas o setor poderá perder o mercado, por conta da rejeição. “Todo mundo espera um pênalti no último minuto”.
Por enquanto, não há fonte de resistência ao HLB dentro da família de citros. Porém, o setor citrícola precisa de plantas que consigam conviver com a doença. Não é necessário que elas sejam resistente. “O interesse é ter plantas não doentes, não sintomáticas”. O poncirus, considerado um primo do citros, serve como porta-enxerto — parte onde é enxertada a planta, dando-lhe sustentação, mas sem ter contato com os frutos. Porém, o poncirus não serve como copa da árvore. Com este perfil, abre-se uma estratégia que é produzir o porta-enxerto transgênico, atribuindo resistência ao HLB, onde seria enxertada uma copa de árvore não transgênica. Esta técnica tem sido adotada no cultivo de maçãs. “No caso do porta-enxerto, a resistência da opinião pública seria menor”, opina.
Como estão os trabalhos no IAC
No Instituto Agronômico, as equipes de pesquisadores estão buscando a bala de prata em várias frentes, incluindo plantas transgênicas. A próxima etapa será fazer a liberação planejada no campo, a partir da autorização da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Outra frente no Centro de Citricultura do IAC é o uso da ferramenta de edição de genoma, chamada CRISPR (do inglês Clustered regularly interspaced short palindromic repeats) que, resumidamente, permite recortar e colar genes, passando-os de uma de uma planta para outra. Esta técnica modifica um gene que está dentro da planta. “É uma nova tecnologia e o resultado final é um gene original modificado”, explica. Segundo Machado, no conceito da nova legislação, não se trata de transgênico.
Outra ferramenta é chamada RNA de interferência, que traz a possibilidade de silenciar ou inibir a expressão do gene, evitando a manifestação da doença. “Temos que ter informações e a partir destas, tirar bons alvos como, por exemplo, alterar a zona de conforto da bactéria; para isso precisamos conhecê-la muito bem”. Estas são, segundo o pesquisador do IAC, as tecnologias do futuro próximo.
Para ele, a transgenia no sentido clássico irá continuar existindo para as grandes culturas, como a soja. Outra possibilidade para a ciência é fazer com que a planta produza substância que espante o inseto vetor da doença. O Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus) tem feito um trabalho com esta abordagem.
“Para construir a bala de prata, temos que passar por todas essas etapas e — ao final — ter aceitação pública”, assevera. O pesquisador destaca que é necessário grande volume de recursos. Para ele, além de todos os obstáculos, há o muro do tempo, considerando que na citricultura o ciclo produtivo é de 15 anos. “Quanto tempo seria necessário para substituir os pomares?”, questiona.
Mas o pesquisador lembra que esta é uma nova necessidade do setor, assim como, por conta da ocorrência do CVC, veio a exigência de produção de mudas em estufas, o que era impensável no passado, mas passou a ser totalmente incorporado.
O HLB
De acordo com o último levantamento, feito em 2015, cerca de 23% dos talhões paulistas estavam infectados. Os talhões são unidades com características semelhantes, com extensão que pode variar de um a dez hectares. O manejo adequado é necessário para controlar a evolução da doença dentro da propriedade, controlando o inseto vetor por meio de inseticida, o que aumenta o custo em torno de 20% a 25%, além do custo ambiental alto. “O que se faz é o controle do vetor, que é tão mais efetivo quanto mais extensivo for feito e menos efetivo quanto mais pomares vizinhos forem infectados”, explica Machado.
Entretanto, o manejo do HLB não é sustentável a longo prazo, em razão da seleção natural dos insetos mais resistentes, por meio do uso contínuo dos inseticidas. O controle biológico com parasitoides, segundo o pesquisador, é mais efetivo em áreas pequenas, como chácaras. Essas ações têm grande importância, por conta do foco do vetor, que pode estar perto de uma grande propriedade. Não se sabe muito desse patossistema, o conhecimento aumentou na última década, antes estava restrito à Ásia. “A complexidade é muito alta, similar ao câncer humano”, exemplifica.
O HLB é caracterizado pelo desenvolvimento de sintomas de amarelecimento da planta que surgem inicialmente de modo setorizado em algumas folhas e evoluem para ramos e frutos, até tomar conta da planta inteira. Os sintomas assemelham-se àqueles desenvolvidos pela deficiência de cálcio, nitrogênio, zinco e boro, com clorose internerval clara, evoluindo para clareamento das nervuras foliares. Ocorre desfolhamento do ramo afetado. Frutos dos ramos afetados têm crescimento reduzido, tendem a apresentar mancha verde claro e deformação. Ocorre um desenvolvimento irregular do fruto mais de um lado do que de outro, com consequente deformação da porção central branca do fruto, que cai com grande facilidade.
“O estudo de porta-enxertos é um dos principais objetivos do programa de melhoramento genético de citros do IAC e certamente contribuirá nesse cenário do HLB. É o esforço da pesquisa paulista para auxiliar o setor produtivo, como recomenda o governador Geraldo Alckmin”, diz o secretário de Agricultura, Arnaldo Jardim.
SERVIÇO
39ª Semana da Citricultura, 48º Dia do Citricultor, 43ª Expocitros
Data: 5 a 8 de junho de 2017.
Local: Centro de Citricultura “Sylvio Moreira” do IAC - Rodovia Anhanguera, km 158, Cordeirópolis
Nenhum comentário