Novo marco ferroviário está à deriva
José Manoel Ferreira Gonçalves*
Uma das muitas iniciativas
improvisadas e inconsequentes do governo Bolsonaro, o novo marco ferroviário
está sem rumo no Congresso. De forma irresponsável, o Senado fez aprovar em
outubro a proposta contida no PLS 261/18, sem que houvesse um debate
aprofundado, com a participação da sociedade, sobre o assunto. Agora, é a
Câmara dos Deputados que acena com uma rápida aprovação do projeto, sem a
devida avaliação do impacto negativo que a medida – tratada como inovadora pelo
governo – acarretará no futuro de nossas ferrovias.
Em linhas gerais, o
novo marco ferroviário que se quer empurrar goela abaixo em Brasília cria a
figura da autorização, pela qual empresas privadas poderão assumir a operação
de ferrovias apenas para atender a seus interesses, sem se ater ao uso público
dos trens ou mesmo abrir a possibilidade de que outros operadores privados
venham empregar a infraestrutura – pública, em sua natureza – para
transportarem outros produtos e matérias-primas.
Caso seja levado
adiante da forma como foi aprovado no Senado, o novo marco não trará qualquer
incentivo ao modelo de concessão, pelo qual o Estado tem a oportunidade de
exercer seu papel de organização e planejamento do setor, de acordo com uma
política pública de transporte. Será fortuita a abertura de licitações, pelas
quais o governo pode fazer valer os interesses estratégicos do país no que diz
respeito às ferrovias, inclusive no tocante à necessária recuperação e
ampliação da atual malha de trilhos.
Ao texto que já se
encaminha para a apreciação da Câmara se sobrepõe recente portaria do
Ministério da Infraestrutura (Portaria 131/21), que reforça o modelo cartorial
com que está sendo encarado o sistema ferroviário no Brasil. Pelo texto, basta
solicitar uma autorização que uma empresa ganhará o direito de explorar uma
linha férrea, sem estudos de interesse público e da pertinência dessa precária
concessão à iniciativa privada, sem contrapartidas que venham beneficiar, por
exemplo, o transporte de passageiros.
Enfim, o roteiro
traçado pelo governo e pelo Legislativo para nossas ferrovias é sombrio.
Aprovado o marco legal nesses moldes, o caminho estará aberto para a exploração
de interesse privado de nossas ferrovias por mais 40, 50 anos.
Como consequência, as
ferrovias deixarão de ser uma alternativa para a integração nacional,
exatamente no momento em que o modal ferroviário se torna ainda mais
importante, diante da necessidade de redução na emissão de gás estufa, definida
na última conferência global sobre mudanças climáticas, em Glasgow.
A falta de projeto e
política pública de Brasília será fatal para o futuro das ferrovias no país.
*José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro e presidente do PDT do Guarujá. É também integrante do Engenheiros pela Democracia e presidente da Ferrofrente – Frente Nacional pela Volta das Ferrovias.
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