Crise global de suprimentos e os desafios para pequenos importadores
As demandas que foram reprimidas durante dois
anos contribuíram para restringir o fluxo de caixa das importadoras, que estão
correndo contra o tempo para se recuperar
Caio Gelfi, cofundador e diretor comercial da Vixtra/Divulgação
Os ministérios da Economia e Relações
Internacionais reduziram as tarifas de importação em 10% até dezembro de 2022,
com o objetivo de conter a inflação de 10,74% acumulada nos últimos 12 meses.
Com o desabastecimento que estamos vivendo por causa da falta de contêineres e
navios de carga, que não conseguem descarregar os insumos, os especialistas
acreditam que este impacto econômico pode ser pior que a crise financeira
mundial de 2008. Os motivos por trás dessa crise são os mais variados, mas que
giram em torno dos eventos ocasionados pela pandemia da COVID-19, como a
variante Ômicron descoberta na África e que já chegou a outros países. As
demandas que foram reprimidas durante dois anos contribuíram para restringir o
fluxo de caixa das importadoras, que estão correndo contra o tempo para se
recuperar e arcar com as necessidades dos clientes e os custos fixos, como
salários de funcionários, despesas com os fornecedores e pedidos em geral.
A escassez dos 400 mil caminhoneiros na
Europa, cujas as empresas de transporte estão encontrando dificuldades em
contratar novos motoristas, por causa dos baixos salários e das péssimas
condições de trabalho, é um dos exemplos que estão dificultando a retomada das
importadoras, após a flexibilização da pandemia. Se em terra firme, o cenário
não é dos mais animadores, o transporte marítimo, que representa cerca de 80%
do comércio mundial, está atravessando por um mar em ressaca. De acordo com o
Relatório Sobre o Transporte Marítimo 2021, da Conferência das Nações Unidas
sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), se o aumento do frete for mantido,
os preços de importação mundial devem crescer 11% e, consequentemente, o índice
de preços ao consumidor em 1,5 ponto percentual adicional na média até
2023.
Além do congestionamento de navios nos
portos, estão faltando contêineres para transportar as mercadorias. Como não
estão retornando para o local de origem, o preço do frete marítimo chegou a
custar recentemente US$ 10 mil para cada contêiner, com origem da China e
destino para o Brasil, mas o valor pode variar dependendo da rota. Na ocasião
em que o levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) foi
divulgado, em julho, os especialistas já previam que a situação poderia piorar.
Atualmente, o uso das big bags,
uma espécie de sacolas gigantes para carregar produtos médios e pequenos, estão
mais comuns nos portos, a fim de contornar a situação que estamos vivenciando,
mas que não está sendo o suficiente para mitigar essa crise. As importadoras
precisam receber os insumos e commodities para uso próprio, pois são o
principal tipo de mercadoria importada para 45.83% das empresas, segundo dados
internos.
O transporte aéreo tem sido uma
alternativa extremamente importante às importadoras em meio a esse caos
logístico que o mundo está atravessando. Mesmo assim, já há relatos de
dificuldade por parte dessas empresas que podem ser justificados com os números
da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA, na sigla em inglês). Em
setembro de 2021, a demanda global, medida em toneladas de carga vezes
quilômetros voados (CTKs), mostra que houve um aumento de 9.1% em comparação a
setembro de 2019.
Muitas importadoras estão enfrentando um
ambiente de capital de giro ainda mais restrito, após a flexibilização da
pandemia. À medida que os fornecedores internacionais também estão enfrentando dificuldades
para produzir a mercadoria e exportá-las, é comum solicitar o pagamento
antecipado com até 180 dias de antecedência em algumas cadeias, gerando uma
necessidade de capital de giro ainda maior para o importador. O confinamento
ensinou os consumidores a comprar virtualmente e os eventos de final de ano,
por exemplo, o Natal e o Revéillon, intensificam esse desejo por compras. No
entanto, este ano pode ser atípico, devido a elevação do preço ou ausência dos
produtos nas prateleiras e dos bloqueios nos portos que impedem os insumos de
chegarem no seu destino final.
Mesmo com a expectativa da taxa de
câmbio em R$ 5,50 para 2022, que pode afetar diretamente as importadoras, é
importante esclarecer que se trata de uma estimativa dos economistas. Dessa forma, os
pequenos importadores precisam ficar atentos com a variação das taxas ao longo
do ano e aproveitá-las quando estiverem mais acessíveis, sempre considerando
uma “gordura” no câmbio para absorverem essas variações sem inviabilizar os
seus produtos repentinamente. O futuro da cadeia logística ainda é incerto,
eventos inesperados como o da nova variante podem ser capazes de desencadear
problemas em sequência na logística mundial, no entanto, governos e empresas
estão se unindo para manter a rota em atividade. Exemplo disso é o Brasil, com
o projeto chamado BR do Mar, que visa a flexibilização do afretamento das
embarcações estrangeiras para serem utilizadas na cabotagem e que será possível
aumentar o volume de contêineres transportados por ano.
Sobre o autor
Caio Gelfi é formado em administração de empresas pela FGV. Hoje é cofundador e diretor comercial da Vixtra, uma fintech de comércio exterior
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