Estrutura organizacional: um predador da estratégia
*Por Claudia Elisa Soares
Quando o assunto é cultura, ninguém
duvida do seu poder no ambiente organizacional. A famosa frase de Peter Drucker
mostra isso de forma escancarada: “a cultura come a estratégia no café da
manhã”. E come mesmo. A diretoria que gasta todo o tempo analisando mercado,
concorrência, novos hábitos de consumo para tomar decisões, mas esquece de cuidar
da cultura da empresa, tem um grande potencial de ver seus resultados
dissolvidos no cereal matinal.
Mas, e se eu disser que a cultura não é
a única predadora da estratégia? Falamos muito da ‘execução da estratégia’ como
aspecto fundamental de seu sucesso. Mas há um outro fator, nem sempre
discutido e que também tem alto poder de destruição dos resultados, caso
não seja adequado. Estou falando da estrutura organizacional: a distribuição de
cadeiras estratégicas e a combinação de líderes e equipe, considerando a
diversidade de idades, gênero, senioridade e até a complementaridade de
personalidades.
Justamente por ser um tema menos
abordado nas reuniões de Diretoria e de Conselho, a estrutura organizacional de
uma empresa é, muitas vezes, mantida sem alterações, mesmo quando há mudanças
de estratégia. E o questionamento deve ocorrer, afinal, “structure follows
strategy”. Logo, é um erro grave, rediscutir a estratégia sem rediscutir a
estrutura.
Uma determinada estrutura organizacional
pode ser considerada inadequada para a estratégia de uma empresa por diversos
motivos. Mas eu gostaria de destacar um fator que parece sempre assombrar as
diretorias: a composição desequilibrada de talentos com diferentes níveis de
senioridade. Se em algumas empresas as decisões estratégicas estão sendo
comprometidas pela juniorização dos cargos, em outras, os resultados não chegam
justamente porque só há seniores nas cadeiras.
A solução é um tanto óbvia, apesar de na
prática não ser tão simples assim. A composição ideal de uma boa estrutura
organizacional passa pela combinação de profissionais mais experientes com
aqueles que ainda estão no início de suas carreiras. Isso vale, inclusive, para
as posições de liderança. Uma empresa pode optar por um líder sênior amparado
por uma equipe de profissionais mais júniors ou, ainda, pela promoção de um
talento menos experiente mas com muito potencial, e que contará com o amparo de
uma equipe de pessoas experientes.
Essa foi a minha vivência quando assumi
um cargo de gerente de operações, logística e finanças da Ambev (na época
Brahma), em 1993. Eu tinha 25 anos e ao meu lado estava o Tinoco, gerente de
vendas e marketing, com seus 50 anos de idade. Nossa parceria foi fantástica,
justamente porque nós nos complementamos com nossas diferenças de idade,
experiências, habilidades e personalidades.
Eu trazia para a gestão a minha audácia,
o arrojo, a vontade de implementar coisas diferentes. E o Tinoco tinha uma
visão de grande disciplina e temperança. Enquanto eu chegava com novas ideias,
ele entrava com a ponderação. Por outro lado, quando sua cautela travava um
pouco os processos, eu o ajudava a avançar com minha visão otimista. Havia
respeito mútuo e uma vontade real de aprender um com o outro.
Éramos, enfim, a dose correta de coragem
e temperança. E a prova disso é que, naquele ano, ganhamos o Programa de
Excelência da Ambev. Nesse caso, a estrutura organizacional não apenas
viabilizou a estratégia da empresa, como contribuiu para a melhoria dos
resultados. Transformamos o predador em aliado. Não é muito mais inteligente?
*Claudia Elisa Soares tem mais de 30 anos de experiência profissional, atualmente é Conselheira Empresarial no IBGC, Even, Tupy SA, Grupo Roldão Atacadista, Grupo Cassol, Bernoulli e Gouvêa Ecosystem, liderando Comitês de Estratégia & Inovação e de Pessoas. Atua também como Advisor e Mentora de Scale-ups, Empreendedores e Executivos. Já atuou como C-level em Finanças, Gestão da Qualidade Total, RH, Marketing, Planejamento Estratégico, M&A e Desenvolvimento de Novos Negócios, em empresas como FNAC, GPA, Via Varejo, AMBEV, Votorantim Cimentos, EMS, entre outras. Formada em administração de empresas, com MBA no INSEAD, Claudia Elisa fez diversos cursos de extensão e aperfeiçoamento em Harvard, INSEAD, MIT, IBGC, FIA, Tavistock Institute, MindValley e outros.
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