ANÁLISE SETORIAL | O lucro privado e os danos públicos dos investimentos: o viés perverso do mercado
Análise do economista Luciano Gurgel,
diretor-executivo da Artemisia, aponta que os investidores demoraram muito
tempo para entender que para além do retorno financeiro há riscos que devem ser
considerados quando decisões de investimentos são tomadas. Criou-se, na década
de 1950, a famosa matriz risco x retorno. Muito tempo passou, e os atores do
mercado de investimentos começam a perceber que ela precisa ser atualizada. Até
hoje, os impactos negativos das empresas foram tratados como não pertencentes
aos investidores e acionistas. Os lucros, ao contrário, são privados, enquanto
os impactos negativos gerados pelas empresas investidas são públicos, portanto,
pertencentes a toda a sociedade.
São
Paulo, 2022 | O
mundo vivencia a internalização de um novo eixo importante para a análise dos
investimentos, algo análogo ao que ocorreu após a Crise de 1929 – quando se
descobriu que deveríamos pensar que existe risco associado ao retorno esperado.
Naquela época, incorporou-se, portanto, o segundo eixo ao processo de análise
de investimentos, que passou a ser uma matriz do binômio risco x retorno. Hoje,
vivemos a incorporação de uma terceira chave de leitura, que vai formar o
trinômio risco, retorno e impacto. Na percepção do economista Luciano Gurgel,
diretor-executivo da Artemisia, os investidores globais demoraram quase 90 anos
para entender que não é somente o retorno financeiro que deve ser considerado
nas avaliações de investimento; os riscos também entram em cena com um peso
decisório considerável, como foi pós-29.
Segundo Gurgel, até hoje, os impactos
negativos das empresas foram tratados como não pertencentes aos investidores e
acionistas. Os lucros, ao contrário, são privados, enquanto os impactos
negativos gerados pelas empresas investidas são públicos, portanto,
pertencentes a toda a sociedade. “Nesta concepção míope, caberia ao Estado
mitigar e prevenir os danos gerados pelas empresas, algo que tem mudado ao
longo dos anos, a partir da criação de políticas de responsabilização
individual dos danos causados pelas corporações, especialmente os ambientais.
Entretanto, os danos sociais ainda não entraram nesta equação; as empresas tabagistas
e as de bebidas alcoólicas, por exemplo, não assumem os custos do Estado com a
saúde”, afirma o economista.
“Gerar energia com uma usina
termelétrica movida a carvão é bem mais barato do que com uma usina
hidrelétrica. Uma estrada que atravessa uma área de gestão demanda menos
custo do que uma área preservada para nascentes de rios. Usar metais
pesados em processos de mineração é mais barato do que adotar técnicas sem
referência. A questão fundamental é que, historicamente, no mundo dos investimentos,
os retornos sempre foram vistos como privados – e detidos pelos investidores –,
enquanto os impactos socioambientais gerados por decisões de investimento são
vistos como públicos. Portanto, pertencentes a toda a sociedade”, salienta
Gurgel.
Na análise do diretor-executivo da
Artemisia, essa discussão passa pela dimensão do poder regulatório e punitivo
do Estado e pela Taxa Interna de Retorno Social (TIR). Ou seja, ao produzirmos
negócios que resolvam problemas socioambientais, aliviaremos a carga tributária
futura, que é o meio pelo qual o Estado vai financiar as medidas de mitigação e
reparação dos danos causados por decisões de investimento que estão sendo
feitas hoje.
Na percepção do economista, os negócios
de impacto socioambiental respondem a essa demanda urgente. “São iniciativas
empresariais, portanto, sustentáveis do ponto de vista financeiro e que ajudam
a resolver problemas sociais contemporâneos. No futuro, essa atuação alivia a
carga que seria gerada sobre os ombros de todos os contribuintes e da sociedade
como um todo. Ao se analisar a viabilidade financeira e os retornos gerados
pelos negócios de impacto, é necessário ir além da empresa e envolver análises
de externalidades positivas (impacto socioambiental positivo) que estes
negócios geram”, defende.
SOBRE OS NEGÓCIOS DE IMPACTO | São empresas que oferecem, de forma
clara e intencional, soluções para endereçar um problema social e/ou ambiental
por meio da sua atividade principal. Atuam de acordo com a lógica de mercado,
com um modelo de negócio que busca retornos financeiros e se comprometem a
medir o impacto que geram. Em resumo, os negócios de impacto seguem os
seguintes critérios: intencionalidade de resolução de um problema social e/ou
ambiental; a solução de impacto é a atividade principal do negócio; busca de
retorno financeiro – operando pela lógica de mercado –; e têm compromisso com
monitoramento do impacto gerado.
ARTEMISIA | A
Artemisia é a organização pioneira no apoio a negócios de impacto social
no Brasil. Tem como foco de atuação identificar e potencializar negócios que
criam soluções para problemas socioambientais e provocam impacto social
positivo por meio da sua atividade principal. Fundada em 2005, a Artemisia
possui atuação nacional e já impulsionou mais de 650 iniciativas de impacto de
todo o Brasil em seus diferentes programas.
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