Trânsito pós-pandemia eleva riscos com alto consumo de álcool
Casos ocorridos em BH e Rio no final de semana
não são isolados e comprovam aumento da imprudência no trânsito
As sequelas
que a Covid-19 vão deixar no trânsito brasileiro devem durar bem mais do que a
própria pandemia, que se encaminha para o fim. Já dá para medir os reflexos
desses dois anos de mudanças drásticas na nossa sociedade, sobretudo na
percepção de que mais motoristas estão dirigindo depois de beber. Durante o
Carnaval, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) registou um aumento de 225% nas
autuações pela Lei Seca. Como resultado, o número de mortes cresceu 18% em relação
ao ano anterior. Além disso, a ocorrência de brigas e discussões no trânsito
vêm se tornando cada vez mais frequentes.
Prova do
aumento do abuso de álcool e da agressividade no trânsito aconteceu no final de
semana. No Rio de Janeiro, um homem alcoolizado atropelou um grupo de pessoas
que estava em um bar. Em Belo Horizonte, um motorista também alcoolizado bateu
o Porsche que dirigia em nove carros. Desequilibrado, o homem ainda tentou
agredir uma mulher que teve o carro danificado por ele, insultou e ameaçou os
policiais.
Não são casos
isolados. Segundo o especialista
em Medicina do Tráfego Alysson Coimbra, a escalada desse
comportamento imprudente e criminoso é consequência do aumento do consumo de
álcool registrado durante a pandemia.
“A pandemia aumentou principalmente os casos de ansiedade e outros transtornos
e isso provocou um aumento do consumo de álcool. Esse cenário preocupa tanto
pelo impacto na saúde física, quanto pela mudança de comportamento no trânsito.
Motoristas que dirigem alcoolizados provocam mais acidentes e mortes e isso é
um problema de todos nós”, afirma o médico, que é diretor
científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra).
Segundo o
Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, de 2019
a 2020 houve aumento de 18,4% nos registros de mortes relacionadas a
"transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool".
Coimbra
explica que o uso do álcool altera diferentes funções cognitivas, emocionais e
motoras, como percepção, comportamento, julgamento, atenção, memória e
motricidade (conjunto de funções nervosas e musculares que permitem movimentos
voluntários ou automáticos). “Essas
alterações são ainda mais significativas em pessoas que fazem uso regular de
álcool, podendo apresentar sintomas frequentes como confusão mental, amnésia
parcial e perda da coordenação e equilíbrio dos movimentos musculares
voluntários”, comenta.
Os números da
indústria também confirmam que o brasileiro está bebendo mais. Segundo o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção de bebida
alcoólica cresceu 17,6% nos primeiros quatro meses de 2021, em comparação com o
mesmo período de 2020.
Tudo isso tem
reflexo direto no trânsito: beber e dirigir triplica a chance de mortes,
segundo o programa Respeito à Vida, do governo de São Paulo.
Autuações pela Lei Seca cresceram 225% durante o Carnaval
(Foto: Freepik)
Alerta
O consumo
de álcool aumentou de forma perigosa no últimos dois anos no Brasil. Segundo
levantamento Global Drug Survey de 2021, o Brasil pulou do 24º para o 10º lugar
em número de ocasiões em que as pessoas ficaram alcoolizadas no último ano. O
resultado fica acima da média mundial. Segundo os Alcoólicos Anônimos, busca
por ajuda triplicou em 2020, atingindo a marca de 100 pedidos de apoio por dia.
CNH
Durante os
exames periciais para renovação ou obtenção da Carteira Nacional de Habilitação
(CNH), médicos e psicólogos especialistas em Tráfego conseguem identificar
sinais diretos e indiretos de que o motorista ou candidato cometem abuso de
álcool e outras substâncias. Diante desses indícios, é feito um trabalho de
orientação e encaminhamento para acompanhamento especializado.
Nesses casos,
o processo de renovação ou obtenção da CNH é interrompido temporariamente.
Posteriormente, nova avaliação é realizada e, se não for constatado que o
problema foi resolvido, a inaptidão para dirigir é mantida. “O trabalho dos médicos e psicólogos
especialistas em Tráfego, somado à fiscalização maciça, maior rigor da lei e o
uso de novas tecnologias, como os drogômetros, são essenciais para que o
aumento de mortes e sinistros graves registrados durante o Carnaval não se
repita em outras épocas do ano”, afirma Coimbra.
Alysson Coimbra é médico e diretor científico da Ammetra
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