Sua Majestade, o Caixa
* Por Manoel Pereira de Queiroz
Um dos chavões mais difundidos no
mercado financeiro é a expressão “Cash
is King”. Quem a usa com frequência como eu, quer chamar a atenção
dos administradores para a importância de se manter um robusto colchão de caixa
na empresa, que possa fazer frente às despesas inesperadas numa emergência. Tal
afirmação é sobretudo importante para empresas intensivas em capital, ou seja,
que precisam de um grande volume de dinheiro para produzir, estocar e vender
seus produtos. Não precisa ser um especialista para concluir que, dada a
sazonalidade, organizações do agronegócio, em sua maioria, se enquadram nesta
definição.
Apesar de tudo, não é fácil os
administradores se convencerem disso. O principal questionamento a essa prática
é quanto ao custo do carrego, que nada mais é que a diferença entre o que a
empresa paga de juros em seus empréstimos e o que ela recebe de juros em suas
aplicações. Carregar caixa custa caro!
Sim, carregar caixa realmente custa
caro, mas como tudo em economia e finanças temos que olhar a relação
custo/benefício. Acompanho as finanças de empresas e empreendimentos do agro há
mais de 20 anos. Nesse período, presenciei várias crises, seja por excesso de
oferta, jogando os preços das commodities abaixo do custo de produção, seja por
frustração de safra, ou até mesmo devido aos chamados “Cisnes Negros” (acontecimento
de impacto desproporcionado ou evento raro aparentemente inverossímil, para lá
das expectativas normais históricas, científicas, financeiras ou
tecnológicas). Em relação aos cisnes, vale notar que em um intervalo de
menos de 12 anos tivemos dois: a crise do subprime
em 2008 e a pandemia do coronavírus, ambos atingindo todos os
setores da economia, isso sem considerar ainda a recente invasão da
Ucrânia pela Rússia. Não é menos importante lembrar que o Brasil, por ser um
país com fragilidades macroeconômicas estruturais, está sempre mais sujeito a
crises econômicas que os países desenvolvidos.
Por experiência própria, posso afirmar
categoricamente que, via de regra, as empresas que possuíam caixa robusto,
passaram incólumes por todas as crises que presenciei, fossem elas setoriais,
nacionais ou globais, enquanto as demais sempre sofreram em alguma medida,
algumas tendo sido forçadas a pedir recuperação judicial ou chegando até a ter
sua falência decretada. Assim, costumo dizer que o custo de carrego tem que ser
encarado como um prêmio de seguro.
Adicionalmente, além de servir como um
seguro contra situações desafiadoras de mercado, quem carrega caixa consegue
gerenciar melhor sua cadeia de suprimentos, carregar estoque para entressafra,
consegue janelas de fixação e limites maiores nas tradings, além de taxas e prazos mais
competitivos em empréstimos e financiamentos. Sim! Bancos também adoram
clientes com caixa! Não à toa, empresas de primeiríssima linha não veem
qualquer incômodo em carregar um caixa expressivo. Veja alguns exemplos de
companhias abertas em 31 de dezembro no ano passado: Brasilagro, caixa de R$
563 milhões, equivalente a 1,13 vezes sua dívida financeira de curto prazo; São
Martinho, caixa de R$ 1,5 bilhões, 2,23 vezes; Suzano, caixa de R$ 5,2 bilhões,
2,79 vezes.
Sim, carregar caixa realmente custa
caro, mas como tudo em economia e finanças temos que olhar a relação custo e
benefício. Ter um caixa bem dimensionado diminui o risco, aumenta o poder de
barganha e torna a empresa mais fácil de administrar.
Vida longa ao Rei!
*Manoel Pereira de Queiroz é Superintendente de Agronegócio do Banco Alfa, membro do Conselho Superior do Agronegócio da FIESP e conselheiro da ADEALQ.
Nenhum comentário