Educação domiciliar: barreira para o desenvolvimento do ser humano?
Vânia Aparecida da Costa, diretora acadêmica da
FAEP, comenta sobre essa polêmica modalidade de ensino e a relevância da escola
como lugar de desenvolvimento das competências socioemocionais do aluno
“Crianças e
adolescentes são sujeitos de direito – e não objetos de propriedade dos pais.”
Essa foi a nota emitida pelo Fundo das Nações Unidas (Unicef), no dia 20 de
maio, dois dias após a Câmara dos Deputados ter aprovado o texto-base do
projeto sobre educação domiciliar, conhecida como homeschooling.
Embora o projeto ainda deva passar pela avaliação do Senado, entre outros
trâmites, a aprovação acionou um sinal de alerta em muitos profissionais da
educação, que veem tal formato de ensino como um grande retrocesso na formação
do ser humano.
Implantado em
diversas partes do mundo, antes do surgimento das escolas, que se popularizaram
em meados do século XX, o ensino doméstico era restrito apenas às elites.
Atualmente, esse modelo educacional está presente em 60 países, segundo dados
da Associação Nacional de Educação Domiciliar (ANED), e vem dividindo opiniões
a seu respeito. O projeto de lei em tramitação aqui no Brasil defende que a
criança possa ser instruída em casa, pelos próprios pais inclusive, desde que
eles tenham ensino superior completo. O tema ganhou ainda mais força
depois que crianças e adolescentes foram obrigados a trocar a sala de aula pelo
ensino à distância no período da pandemia.
A questão é
que, no período pandêmico, os estudantes eram instruídos pelos seus
professores, seguindo uma grade curricular, e, assim que a pandemia amenizou,
eles voltaram para a sala de aula. Mas, na educação doméstica, a situação é
diferente: eles poderão ter apenas um instrutor, sem qualquer interação social
com professores e colegas de classe. Para Vânia Aparecida da Costa, diretora
acadêmica da Faculdade de Educação Paulistana (FAEP), não há como pensar em
educação sem interação:
“Ensinar vai
muito além de transmitir conteúdo. A educação deve envolver o desenvolvimento
de competências socioemocionais da criança. Para isso, o espaço escolar se
revela fundamental como o grande laboratório da vida. Portanto, privar os
pequenos desse ambiente, por meio do ensino doméstico, é impedir o avanço
dessas habilidades. ”
A diretora
ressalta, inclusive, que a interação é elemento-chave para o desenvolvimento
das dez competências gerais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
referência obrigatória para elaboração dos currículos escolares das
instituições públicas e privadas da educação básica.
Assim,
segundo Vânia, a educação necessita sempre priorizar o desenvolvimento humano e
integral de cada ser humano, respeitando suas individualidades. “Essa é a visão
da Pedagogia Waldorf, desenvolvida pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner, a
qual defende práticas educativas que associam habilidades corporais, cognitivas
e emocionais.”
Dessa forma,
essa proposta pedagógica prepara o aluno desde a infância para a formação de
uma visão crítica de mundo. Na educação infantil, por exemplo, educadores
realizam diversas atividades como o cuidado com o jardim, a modelagem infantil,
a organização dos próprios brinquedos, sempre considerando e compreendendo as
habilidades e aprendizagens de cada um.
Conforme a
criança cresce, a proposta se concretiza de outras formas, principalmente após
os 15 anos, quando o adolescente começa a desenvolver sua própria compreensão
de mundo e a organizar a vida. O assunto, inclusive, foi tema do encontro A
Pedagogia Waldorf no Ensino Médio: contribuições para a educação contemporânea,
transmitida pelo canal do YouTube da FAEP para pedagogos e estudantes de
pedagogia de modo geral.
Durante o
evento, Allan Gonçalves, professor na escola Waldorf Francisco de Assis,
docente e pesquisador na Faculdade Rudolf Steiner, abordou, entre diversas
outras questões, como a pedagogia Waldorf trabalha os conteúdos do ensino médio
a partir das próprias vivências dos educandos, priorizando o estabelecimento de
relações. De acordo com Gonçalves, isso é fundamental para essa fase de
aprendizado do aluno, pois, se antes ele olhava para a cidade, por exemplo,
como um lugar onde pessoas trabalham, a partir de então ele passa a perceber
outras questões como a diferença de classes sociais.
A partir de
todas as considerações levantadas, fica o questionamento: o homeschooling
realmente trará algum benefício para o desenvolvimento integral da criança e do
adolescente?
Para acompanhar a palestra ministrada por Allan Gonçalves na íntegra, clique aqui
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