Jornadas reduzidas de trabalho são realidade em empresas brasileiras
Especialistas
do escritório SAZ Advogados explicam as
razões que levam empresas a reduzirem o número de horas de seus empregados sem
impactar no salário
A redução das
horas de trabalho da equipe por uma empresa de tecnologia da cidade de Franca,
interior de São Paulo, movimentou a discussão na mídia sobre a jornada de
trabalho. Ainda em fase experimental, a proposta oferece mais um dia de folga
no meio da semana, além de um bônus de R$ 400 para o lazer dos empregados. Os
sócios da SAZ Advogados, Fabiana Zani e Rodrigo Salerno,
explicam como esse tipo de contratação é possível e os benefícios para as
empresas. E também apresentam a experiência positiva da Solpack Agronet, de Rio
das Pedras, que implantou uma jornada de trabalho de, no máximo, 6 horas por
dia.
A importância
do ócio, tempo
livre e do lazer é defendida por muitos filósofos, mas no mundo
mercadológico a premissa da saúde e bem-estar dos empregados e colaboradores da
empresa costuma passar por estratégias bem claras. “A Síndrome Burnout, que é
considerada uma doença ocupacional, foi um dos assuntos mais debatidos nos
últimos dois anos no mundo corporativo. Isso porque, afetando a saúde do
trabalhador, traz inúmeras consequências indesejadas para o empregador. Este
não é o único motivo para diversos negócios repensarem seu ambiente de trabalho
e a forma de relação com os contratados”, afirma o advogado Rodrigo Salerno.
De acordo com Salerno,
trabalhadores de todas as áreas podem produzir menos e em menor qualidade
quando estão sob pressão e exaustão, mas existem funções que dependem muito da
capacidade criativa. “Não é por acaso que as empresas de tecnologia são as que
mais se destacam em propor formas de trabalho não convencionais. Com isso, elas
ganham em diversas frentes, no desejo de seus melhores contratados em
continuarem no cargo, na publicidade do negócio, no interesse de outros
profissionais em fazer parte da equipe, no aumento de repertório e criatividade
de seus colaboradores e, consequentemente, no crescimento da produção e da
satisfação com a empresa”.
O advogado
ainda explica que cada setor pode desenvolver estratégias próprias. “Todavia, é
importante que todos os acordos sejam estabelecidos por contrato”.
Com exceção de
momentos de crise, no qual empresas reduzem sua produção e precisam encontrar
alternativas em relação a demissões, o principal objetivo da redução de jornada
é promover entre seus empregados e colaboradores mais momentos de descanso,
lazer e a possibilidade de contato com produções culturais ou atividades
esportivas.
Este é o caso
da empresa de Franca, que estampou sites de notícia por reduzir a jornada de
trabalho. A NovaHaus, além de não diminuir os salários dos profissionais,
devido ao número menor de horas trabalhadas, ainda oferece um valor para que
eles invistam em consumo de músicas, filmes, livros e teatros. “Sabendo que a
criatividade é uma habilidade que se adquire quando há tempo para observação,
reflexão, construção de um repertório social e cultural, autoconhecimento e
associações entre conhecimentos, o gestor consegue ter uma visão mais ampla
sobre o retorno que estes empregados podem lhe oferecer”.
Outro exemplo
de empresa que adotou jornada reduzida de trabalho é o da Solpack Agronet, de
Rio das Pedras/SP. Desde abril de 2022, todos os 300 empregados da fornecedora
cumprem um período de, no máximo, 6 horas por dia. A diminuição das horas
trabalhadas começou pela produção, em março/2020, e o setor
administrativo se juntou a eles neste ano.
Para seguir os
exemplos de jornada reduzida, de acordo com Fabiana
é preciso conhecer o próprio negócio e como a legislação funciona. “A empresa
de tecnologia que virou notícia por reduzir a jornada de seus contratados
escolheu oferecer um dia de folga no meio da semana, na quarta-feira. Mas não é
incomum vermos propostas de uma redução diária da jornada, com os empregados
trabalhando 6 ou 5 horas por dia, como é o caso da Solpack”, explicou a
advogada.
Diferentemente
da proposta em experimentação da NovaHaus e do que foi adotado pela Solpack
Agronet, o mais comum é o pagamento proporcional às horas trabalhadas. “De
acordo com a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), nenhum brasileiro deve
receber menos que um salário mínimo, ou o piso de sua categoria, por uma jornada
máxima de 44 horas semanais. Mais que isso é considerado hora extra e deve ser
pago como tal. As empresas que contratam por menos horas têm amparo legal para
fazer o cálculo proporcional e pagar apenas pelas horas trabalhadas”, informou.
Mesmo com redução
do salário, a alternativa de trabalhar menos horas diárias ou semanais costuma
agradar quem busca mais tempo para ficar com a família, estudar ou ter alguma
atividade de lazer. “Se uma empresa consegue ser capaz de manter o mesmo nível
de produção e qualidade de serviço, ou até aumentar, reduzindo as horas de
trabalho de seus empregados, é interessante que, apesar da possibilidade legal
de diminuir o valor pago pelo serviço, considere manter o salário
integral”.
De acordo com Fabiana, esse será
um diferencial no mercado. “Além do mais, o empregador correrá menos risco do
seu funcionário arrumar outro trabalho para complementar a renda e assim acabar
sobrecarregado”, orientou a advogada.
REALIDADE - A Finlândia é
um país pequeno, com cerca de 5,5 milhões de habitantes. Conhecida por ser um
centro tecnológico na Europa, outros dois elementos tornam o país famoso: estar
em primeiro lugar no ranking de felicidade do World Happines Report, por cinco
anos seguidos, e ter uma legislação que permite a flexibilidade de horário do
trabalho.
“Existem
diversos países que estão adotando jornadas menores de trabalho. A média do
número de horas trabalhadas semanalmente na Finlândia não é tão diferente que a
do Brasil. Entretanto, mais de 90% das empresas permitem que seus empregados
ajustem seus horários. Já na Bélgica, os trabalhadores têm uma jornada semanal
de 38 horas, e esse período pode ser dividido entre 4 ou 5 dias de trabalho”,
relatou Salerno.
Para o auxiliar
administrativo, Victor
Luiz Prizo de Farias, poder trabalhar apenas meio período
possibilita que ele se dedique aos seus estudos. “Eu posso dizer que a jornada
de trabalho foi fundamental para incentivar meu interesse pela vaga”, relatou o
jovem de 19 anos, que trabalha em uma escola de inglês.
“Ao saber que
seriam cinco horas por dia, tive plena convicção de que não seria uma rotina
diária maçante e/ou desgastante, que afetaria diretamente meu psicológico e
minha convivência social. Eu consigo conciliar meu horário de estudos, de
trabalho e de lazer perfeitamente. Acredito que uma jornada de trabalho
parecida seria o ideal para a maioria dos empregos, visto que já foi comprovado
que muitos dos transtornos mentais, como depressão e síndrome de Burnout,
envolvem rotinas de trabalho muito longas e estressantes”.
Na outra ponta
dessa relação estão os empresários e gestores. De acordo com a gerente geral da
Solpack Agronet, Alda
Car, o projeto de redução de jornada tem valido a pena. “As pessoas
trabalham mais felizes, mais satisfeitas, com maior foco nas atividades
realizadas, além de terem mais tempo para lazer, para os estudos, para a vida
pessoal, vão aproveitar melhor o tempo, inclusive consumindo mais”. A
profissional espera que a empresa possa servir de exemplo para as demais da
região.
A opinião de Alda corresponde a
pesquisas feitas sobre o assunto. Depois de acompanhar 2.500 trabalhadores na
Islândia, a Associação de Sustentabilidade e Democracia e a Autonomy chegaram a
conclusão que o bem-estar dos empregados melhorou significativamente depois que
passaram de 40 para 36 ou 35 horas semanais de jornada. Os dados revelaram que
os processos de trabalho foram otimizados e estabeleceu-se uma cooperação mais
estreita entre a equipe. Já a produtividade, em sua grande parte, permaneceu a
mesma ou até aumentou.
SERVIÇO:
SAZ ADVOGADOS
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