Saúde mental dos estudantes no pós-pandemia impõe maior acolhimento na rotina escolar
Uma pesquisa
realizada pelo governo de São Paulo em parceria com o Instituto Ayrton Senna
revelou que dois em cada três (ou seja, 70%) estudantes do 5º a 9º ano do
ensino Fundamental e Ensino médio da rede estadual de São Paulo apresentam
sintomas de depressão e ansiedade. O levantamento contou com a participação de
642 mil alunos no âmbito do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do
Estado de São Paulo (Saresp).
Ainda não foram
divulgadas pesquisas sobre o tema em Minas Gerais, mas nos últimos meses, foram
registrados
diversos
casos
de violência
nas escolas
do estado. Conforme dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança
Pública, em 2022, com a volta total das atividades – exceto na rede do Estado,
cujo ano letivo começou em abril por conta de greve –, houve 68 ocorrências de
lesão corporal e outras 82 de agressões.
Segundo avaliação da
psicóloga escolar do Sistema Gabarito de Ensino, Maria Carolina Rodrigues Tomé,
a questão do bullying e da violência se aprofundaram em resposta à pandemia.
“Antes da pandemia, esse movimento já estava acontecendo, com episódios de
intolerância às diferenças e diversidade de opiniões. Dependendo do nível
escolar, principalmente no Fundamental 2, fase na qual as crianças estão
começando a desenvolver sua identidade jovem, a exclusão acontece de maneira
mais intensa, até como um sintoma de insegurança e sentimento de inadequação
dos jovens de 10 a 14 anos. Esse fenômeno ganhou uma superdimensão porque as
pessoas ficaram isoladas em suas casas e deixaram de estabelecer relações
sociais de qualidade, voltando para a escola com resquícios de uma vivência
muito individualista/individualizada. Então, lidar com a opinião do outro, com
o convívio social, com as diferenças, com regras e com a mediação de conflito,
gerou um cenário mais delicado e complexo de gerir”, avalia.
A questão do impacto do
isolamento social no comportamento humano vem sendo estudada há um tempo pela
psicologia social: a questão dos transtornos de ansiedade e depressão, a
sensação de pouca motivação, de fracasso, irritabilidade, insônia, tudo já era
previsto em situações de falta de contato social. “Quando você isola as pessoas
do contato humano – porque nós somos essencialmente sociais – você tira delas a
essência de sua humanidade, então o corpo e a mente começam a responder de
maneira aguda. Nesse cenário, realmente o avanço e crescimento dos transtornos
mentais foi assustador, com muita busca por atendimentos na área de saúde
mental. Nunca foi tão nítido e concreto a noção de que precisamos do outro para
nos constituir, essa perspectiva cabe, também à escola e à aprendizagem”- diz a
psicóloga.
Volta às aulas
Com o retorno às
atividades escolares, as instituições de ensino precisaram se adaptar à nova
realidade para promover o acolhimento dos alunos. “Desde o início do ano nós
estamos discutindo com toda a equipe pedagógica ações dentro de sala de aula
que gerem acolhimento ao aluno. Ao professor foi orientado que abrisse espaço
de debate sempre que o tema surgisse para privilegiar a escuta ativa. O
Gabarito sempre teve espaço de acolhida, nós promovemos a psicologia escolar
como um lugar de acolhimento, orientação de pais e aluno, e agora nós estamos
com um projeto muito interessante que chama Gente
em Rede para todas as pessoas que fazem parte da formação do aluno,
como funcionários, professores, gestores pedagógicos e famílias com a
possibilidade de fazer diagnósticos entendendo onde nosso aluno está e para
onde que nós devemos ir. Então são movimentos da instituição entender de forma
generalizada a importância do acolhimento”, concluiu.
As escolas podem
contribuir também para uma melhor saúde mental dos alunos quando percebem que
houve uma “defasagem” cognitiva e geram a possibilidade de conquista desse
aprendizado. Com calma, construindo isso com os alunos para que eles se sintam
seguros na aprendizagem. “Eu percebo que os estudantes chegaram com muitas
questões de aprendizagem e isso gera muita ansiedade, então muitos alunos
perderam ou diminuíram a capacidade de escrita, de leitura, de produção de
texto, de capacidade lógico matemática, e quando chegam na sala e têm que
desenvolver um raciocínio mais complexo e não conseguem isso gera uma ansiedade
enorme, um sentimento de fracasso. Portanto se a escola conseguir evitar que
isso aconteça já é meio caminho andado.” argumenta Maria Carolina.
Aos familiares dos estudantes orienta-se compreender e ter tranquilidade de que o aprendizado que foi perdido vai ser ganho aos poucos. Se a família entende isso vai cobrar menos do aluno e vai também entrar no processo de acolhida, de compreensão, que esse conhecimento vai ser ganho aos poucos. “Mas ao mesmo tempo, é muito importante que as famílias fortaleçam a autonomia dos filhos, estabeleçam boas rotinas de estudo, entendam que mesmo que o filho esteja muito fragilizado ele vai conseguir se resgatar e se reconstruir, então a família acolhe, mas também gera o impulso que estimula a autonomia. A base das nossas relações são nossas famílias, a partir da crença familiar, do apoio, é que o filho vai caminhar”, finaliza a psicóloga.
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