As leis municipais e o plástico de uso único
A “inquisição contra o plástico de uso único” parece não ter fim, sendo que as investidas parecem que saíram do prisma do uso consciente de um produto fruto de anos de investimento em tecnologia em material inerte, com alto teor de reciclabilidade e/ou passível de recuperação energética, para o prisma político eleitoreiro.
A velocidade da
propagação de notícias falsas relacionadas com o “meio ambiente” e o suposto
vilanismo do plástico chega ao ponto de influenciar os legisladores que, na
maioria das vezes, desavisados, iludidos e induzidos ao erro, produzem normas
inconstitucionais inviabilizando setores inteiros e gerando desemprego.
Outra norma em
discussão no Judiciário (STF) é uma lei municipal da cidade de Marília,
interior de São Paulo, vale dizer, a Lei Municipal nº 7.282/2011, que
estabelece, no âmbito do Município de Marília/SP, a obrigatoriedade de
utilização, pelos estabelecimentos daquela localidade, de embalagens plásticas
(sacolas e sacos de lixo) confeccionadas em material biodegradável ou
reciclado, bem como estabelece os requisitos para que tais embalagens sejam
consideradas compatíveis com o padrão estabelecido pela norma, como também que
a participação do Poder Executivo na política fica restrita à fiscalização do
cumprimento e aplicação das penalidades, de acordo com o contido nos seus respetivos
artigos.
Referida norma afeta
diretamente as empresas que fabricam máquinas para esse tipo de produto, pois
ao proibir a utilização dos denominados “plásticos de uso único”, na prática
está inviabilizando a fabricação desses produtos e, por consequência lógica, a
indústria brasileira de máquinas desses setores (plásticos). Neste contexto a
ABIMAQ apresentou manifestação no processo e que está no STF (RE Nº
732.686-SP), em sede de repercussão geral, cujo tema é o de nº 970, e visa a
análise das inconstitucionalidades formal e material da lei municipal que
dispõe sobre o meio ambiente.
A intenção é levar aos
ministros do STF, maiores elementos e informações que possam contribuir com o
debate da forma mais isenta possível, sem preconceitos, pois diante da sua
importância como entidade de grande representatividade e relevância do setor de
bens de capital no contexto da economia brasileira, qualquer decisão que o STF
der ao caso, repercutirá na atividade econômica de grandes setores da indústria
nacional.
A simples vedação de
utilização/fornecimento de um produto estampada não é razoável nem proporcional
e contraria a Política Nacional de Resíduos Sólidos que prevê a
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, sendo um dever
a sua implementação, de forma individualizada e encadeada, abrangendo
fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores e os
titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos
sólidos. E, no âmbito da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos
produtos, cabe ao titular de serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de
resíduos sólidos, observado, se houver, o plano municipal/estadual de gestão
integrada de resíduos sólidos.
Leis que buscam vedar
produtos legais, em tese, sempre terão um semblante de inconstitucionalidade,
pois o verdadeiro vilão não é o plástico de uso único, mas sim o próprio poder
público que é omisso nas suas atribuições basilares de políticas públicas de
educação ambiental com relação ao uso e descarte consciente de produtos de
plástico fabricados com o objetivo de descarte após o primeiro uso, além do
cumprimento das diretrizes quanto ao incentivo e implantação da coleta seletiva
nos municípios previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Plástico é um material
versátil, constituído de polímeros que possuem duas categorias principais,
aqueles que podem ser modificados sem danificar sua estrutura molecular, com a
exposição ao calor (termoplásticos) e outros que terão sua organização
molecular desestruturada quando submetidos a determinadas temperaturas
(termofixos). Suas características físico-químicas, permitiram a maior
conservação de alimentos, água, medicamentos, inclusive quando submetido a
choques de temperatura ([1]).
Não há garantias de que
as medidas propostas em legislações municipais e estaduais eliminarão as causas
raízes que levam ao descarte irregular de resíduos sólidos, alcançando rios e
mares. Proibições desse tipo com evidente ausência de embasamentos técnicos
sobre sua eficácia e análise dos impactos ambientais ao longo do ciclo de vida
dos materiais propostos para substituir o plástico (que podem proporcionar
maior consumo de água e geração de efluentes, além de prejuízos à saúde
pública) demonstra que estamos no caminho contrário ao que significa “Economia
Circular”.
A ausência por parte do
poder público denota uma afronta ao art. 225, § 1º, VI, da Constituição
Federal, que estabelece a promoção da educação ambiental e a conscientização
pública para a preservação, conservação e recuperação do meio ambiente no
Estado.
*Caio Cesar Braga Ruotolo é
advogado e sócio do escritório Luiz Silveira Sociedade de Advogados. Consultor
Jurídico da ABIMAQ. Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São
Paulo. Membro do Conselho de Assuntos Tributários da Fecomércio em São Paulo.
Foi Coordenador Jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
Foi membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/SP (2017/2018) e da
Comissão de Assuntos Fiscais da CNI (2014-2020). Pós Graduado com
Especialização em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
e em Direito Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional e em
Gestão de Recursos Humanos. Experiência consultiva e contenciosa nas áreas de
direito tributário, empresarial, ambiental, aeronáutico e crimes contra a ordem
tributária.
[1] https://royalsocietypublishing.org/doi/pdf/10.1098/rstb.2008.0304
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