Mediadores evitam 76% dos processos, mas são os únicos que 'pagam para trabalhar'
No Dia do Mediador, categoria ainda luta para
que seu trabalho seja remunerado pelos tribunais
Um dos maiores
problemas do Judiciário brasileiro é a lenta tramitação da maioria dos
processos, provocada pelas 80,1 milhões de ações em andamento, segundo dados do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O Censo da Justiça, realizado em 2018
apontou que cada um dos 18 mil magistrados brasileiros na ativa é responsável
por 4,4 mil processos. “É
humanamente impossível decidir sobre tantas ações em um tempo razoável. O
resultado desse acúmulo é que um processo judicial pode se prolongar por anos,
considerando o período de ajuizamento da ação até o efetivo cumprimento da
sentença, isso quando ela chega a ser cumprida, o tão famoso ‘ganha, mas não
leva’”, revela Márcia Cristina da Silva Cambiaghi, presidente do Sindicato dos
Mediadores e Conciliadores do Estado de São Paulo (SIMEC-SP).
É caótico, mas poderia
ser pior. Quase oito em cada dez disputas não chegam a integrar o acervo de
processos do Judiciário, graças ao trabalho dos mediadores e conciliadores de
conseguirem acordos ainda na fase pré-processual. Dados do Tribunal de Justiça
de São Paulo (TJSP) revelaram que, em 2021, das 34.792 audiências de
conciliação realizadas nas Varas Cível e Família, 26.434 terminaram em acordo.
O índice de sucesso do trabalho dos 3 mil mediadores e conciliadores paulistas
chega a 76%.
A economia para os
cofres públicos é gigantesca: “Cada
processo na justiça gratuita custa para o Estado em torno de R$ 2 mil,
considerando todo o gasto com o aparato do Judiciário para processamento da ação.
São bilhões economizados anualmente”, calcula o advogado e assessor jurídico do
SIMEC-SP, Rafael Rocha Martins.
Mediarores evitam 76% dos processos na
fasse pré-processual
Apesar disso, a
profissão sofre com o descaso do Governo do Estado e do Poder Judiciário, que
não destinam recursos para remunerar os mediadores que atendem às demandas da
justiça gratuita, ou seja, da população que não tem condições financeiras de
pagar as custas de um processo.
Esse problema se
arrasta há anos, tanto nas esferas estadual e federal. Sem nenhuma previsão de
resolução, a situação desestimula a permanência do profissional na sua função. “Além de não receberem pelo trabalho,
os mediadores ainda têm que pagar por todos os custos com transporte,
alimentação e cursos de aperfeiçoamento e atualização obrigatórios, tudo para
estarem na linha de frente dos fóruns, em atendimento à população”,
afirma Márcia.
Tratamento
desigual
Peritos,
oficiais de justiça, intérpretes, leiloeiros e psicólogos que atuam nos
processos da justiça gratuita de todos os tribunais de São Paulo recebem por
seus serviços. Os mediadores e conciliadores são os únicos profissionais que
“pagam para trabalhar”.
A população é quem perde.
“A desvalorização
profissional dos mediadores e conciliadores impede, na prática, que a Justiça
seja mais ágil, pois desestimula o trabalho de quem pode reduzir o número de
processos e aumentar o número de acordos”, comenta Fileto Albuquerque, vice-presidente
do SIMEC-SP.
Instituída para
fomentar a cultura de paz no país, a Lei de Mediação (Lei federal 13.140) foi
aprovada em 2015 e desde então vem sendo implementada em todos os tribunais. No
mesmo ano, o governo do Estado de São Paulo aprovou a Lei n° 15.804/2015, que
passou a prever uma forma de remunerar os mediadores judiciais dos Centros
Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs). “Consta no orçamento do TJSP uma verba
de R$ 1 milhão para o pagamento dos mediadores, mas até hoje nem Estado nem
Tribunal realizaram um pagamento sequer. Com o argumento de que o valor é
insuficiente para remunerar todos os mediadores, ninguém recebe”,
completa Márcia.
Atualmente, o Brasil
tem 1.382 Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs) nas
justiças estaduais, sendo 233 apenas no Estado de São Paulo. Desde 2014, o
número de centros cresceu 281% no país. A tendência é crescer ainda mais, mas,
para tanto, é imprescindível que seja estabelecida uma política de valorização
desses profissionais. “A
mediação não representa só economia, mas também conscientiza e colabora para
criar, na sociedade, um senso de cidadania em que o diálogo vem antes da
disputa. A redução do número de processos colabora com credibilidade da própria
Justiça, que fica mais ágil e eficiente”, conclui a presidente
do SIMEC-SP.
Celebração na
ALESP
Nesta
quinta-feira, Dia do Mediador e Conciliador, o Simec promove, na Assembleia
Legislativa de São Paulo (Alesp), um evento para homenagear os profissionais
que resolvem conflitos e desafogam o Judiciário. A solenidade contará com a
participação do integrante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Dr. Richard
Pae Kim; do desembargador Kazuo Watanabe; da Coordenadora do Núcleo Permanente
de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), desembargadora Maria
Lúcia Pizzotti; do Secretário de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo,
Dr. Fernando José da Costa, e do diretor da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), Martim Hahn.
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