A artista está presente
Marco Antonio Spinelli*
A artista plástica e
performer Marina Abramovic realizou em 2010 no Museu de Arte Moderna de Nova
York, o MOMA, uma exposição inesquecível chamada “O Artista está Presente”.
Como toda ideia genial, Marina concebeu algo extremamente simples, como ficar
sentada numa cadeira olhando para uma pessoa sentada à sua frente. Quem chegava
podia sentar e ficar alguns minutos nessa troca de olhares (tem alguns vídeos
no Youtube mostrando esse trabalho, é só colocar Marina Abramovic e MOMA. Vale
a pena).
O que parecia que seria
uma performance voltada a poucos aficionados ou pessoas do meio artístico, virou
um sucesso estrondoso, com pessoas dormindo na frente do Museu para ficar
alguns minutos em contato com a artista. Filas dobrando o quarteirão. Marina
descreve, em um documentário sobre essa exposição, que fazia um trabalho
profundo de lentificação de seus pensamentos através da respiração para ficar
em estado de Presença e Atenção Plena diante das pessoas. Também conhecido como
Estado Meditativo. Recebia, nesse estado, todo tipo de resposta afetiva dos
participantes: medo, dor, simpatia, amor, tudo acontecendo como se não houvesse
ninguém no entorno. Como se as duas pessoas se olhando estivessem numa bolha,
separada do mundo.
A exposição teve tanta
repercussão que gerou interesse na comunidade científica. Neurocientistas
levaram Marina Abramovic para o laboratório para estudar o que acontecia no seu
Cérebro enquanto olhava para a pessoas à sua frente. Mas não ficava só nisso:
pegavam as estagiárias para ficarem sentadas e mediam as ondas cerebrais da
artista e das meninas. Os achados foram impressionantes: Marina tinha uma
capacidade de relaxamento e sincronização cerebral muito acima do comum. Talvez
por isso tenha ficado cerca de setecentas horas sentada imóvel diante das
pessoas que não conhecia durante semanas da exposição. Mas o mais interessante
não foi isso: os cientistas documentaram uma sincronização entre as ondas
cerebrais da artista e das pessoas que sentavam à sua frente. Como se
estivessem na mesma sintonia. Ou na mesma sincronia. Foi uma pesquisa que
levanta questões sobre a ação à distância de nossas ondas e vibrações,
manifestadas em nosso Cérebro como eletricidade mas também como ondas
eletromagnéticas. Isso quer dizer que, uma pessoa com “good vibes” cria uma
ação no seu ambiente. O estado de Atenção Plena tem um efeito “contagioso”, gerando
sincronização. Por isso gostamos de ficar perto de pessoas com essa energia
harmônica.
No trabalho
terapêutico, aprendemos a criar esse “campo” de interconexão e sintonia com a
pessoa que está à sua frente, geralmente em sofrimento. Ficar em silêncio, olhando
para o Outro, gera conexão, e um campo psíquico favorável. Tudo isso para gerar
cura e transformação.
Quando vejo as imagens
da exposição de Marina Abramovic fico sempre emocionado, por perceber que lá
reside uma espécie de cura para nossos tempos, onde estamos com os olhares
apartados pelas telas. O mais interessante foi a mesma ter sido realizada em
Nova York, que é uma espécie de símbolo de nossa vida de correria e perseguição
de resultados, onde as pessoas mal trocam olhares e andam de cabeça baixa nas
ruas. Milhares de pessoas esperaram horas para ter um contato humano e
experimentar as próprias emoções diante do olhar amoroso da artista. Troca de
olhares em tempos famintos.
Obrigado, Marina, por
estar presente.
*Marco Antonio Spinelli é médico, com mestrado em psiquiatria pela Universidade São Paulo, psicoterapeuta de orientação junguiana e autor do livro “Stress o coelho de Alice tem sempre muita pressa”
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