Carf alerta entendimento sobre o contrato de rateio de despesas e causa insegurança jurídica
* Nicholas Coppi
Na contramão do posicionamento adotado
pela Receita Federal do Brasil, a Câmara Superior de Recursos Fiscais do
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) inaugura uma situação de
insegurança jurídica ao mudar seu entendimento sobre o contrato de rateio de
despesas em um mesmo grupo econômico. Diante deste posicionamento recente, o
que se espera é que mais e mais contribuintes busquem o Judiciário para
salvaguardar o que já havia sido definido pela Receita Federal na Solução de
Divergência Cosit nº 23/13.
Quais são as condições para que se faça
o contrato de rateio de despesas? Pois bem, o contrato de rateio é celebrado
por organizações de um mesmo grupo econômico no qual definem a empresa do grupo
que será encarregada de desenvolver bens, serviços ou direitos em benefício de
todas. Ficará a cargo dessa empresa, chamada de centro de custos ou
sociedade-mãe, a centralização dos custos e despesas do grupo, com o propósito
de diminuir encargos e conseguir o máximo de resultados globais do grupo
econômico.
Tais despesas devem ser calculadas com
base em critérios de rateio razoáveis e objetivos e que correspondam ao efetivo
gasto de cada empresa e ao preço global pago pelos bens e serviços.
Assim, nos termos do Acórdão nº
1402-004.040, a sociedade-mãe tem os valores como reembolsos de despesa, e as
demais empresas os tratam como despesas a serem deduzidas da base de cálculo do
Imposto de Renda, desde que reste
“devidamente comprovado nos autos que foram contratadas, assumidas, pagas e que
correspondem a bens e serviços necessários, normais e usuais às atividades das
empresas”.
Antes da recente decisão do Carf,
tínhamos o seguinte panorama em relação à tributação desses valores para fins
de tributação de PIS e Cofins. A Solução de Divergência da Receita Federal
admitia a concentração em uma única empresa do controle de gastos relativos a
departamentos de apoio administrativo centralizado com o rateio das despesas
entre todas as empresas. Esses valores não estavam sujeitos a PIS/Cofins, por
não configurarem receita, mas sim mero reembolso de despesas adiantado pela
sociedade-mãe.
Em que dispositivos a Câmara Superior do
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais buscou apoio para o posicionamento
que contraria a solução de divergência da Receita Federal?
Para responder a esta pergunta é
necessário tecer alguns breves comentários sobre o tema. Por maioria de votos,
a 3ª Turma do Carf decidiu que valores recebidos por empresa de grupos
econômicos como reembolso ou ressarcimento de custos e despesas com serviços
compartilhados, tendo como base o contrato de rateio, integram as bases de
cálculo de PIS/Cofins. No entendimento do Carf, os valores recebidos como
reembolso teriam, na verdade, natureza de receitas com prestação de serviços.
A posição majoritária do Carf concorda
não haver dispositivo legal que trate de rateio de despesas comuns no Brasil, e
se fundamenta no artigo 123 do Código Tributário Nacional, que veda a
modificação do sujeito passivo das obrigações tributárias por meio de
convenções particulares. O Julgado ainda cita que no ordenamento jurídico
brasileiro, somente nos casos de consórcio (Lei nº 6.404/76) e mandato (Lei nº
10.406/2002) é que um gasto pode ser realizado por uma pessoa jurídica e o
custo repassado a para outra sem que se caracterize despesa, o que para o voto
vencedor não é o caso do contrato de rateio.
Ainda de acordo com o voto vencedor do
Conselheiro Luiz Eduardo de Oliveira Santos, a Solução de Divergência nº 23/13
da Receita Federal do Brasil não vincula os Conselheiros do CARF, trata de
assunto em que a própria RFB já se manifestou em sentido contrário, e não se
aplica automaticamente ao caso, uma vez que trata especificamente sobre gastos
de “apoio administrativo” dentro do contrato de rateio.
Ainda mais uma vez é importante
enfatizar. Ao concluir que os valores recebidos pela sociedade-mãe no contexto
do contrato de rateio de despesas constituem receita e, portanto, passíveis de
tributação por PIS/Cofins, a Câmara Superior do Carf inaugura um episódio de
insegurança jurídica. Ao contribuinte não resta alternativa, a não ser se
socorrer no Judiciário.
*Nicholas Coppi é advogado, especialista (IBET) e mestre em Direito Tributário (PUC/SP). Professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Nenhum comentário