Cai fatia do dólar em reservas globais
Por Aline Oyamada | De São Paulo
As reservas internacionais globais caminham, ainda que
lentamente, para um processo de diversificação. A mudança é um ajuste ao
reequilíbrio de forças na economia mundial. O dólar deve continuar a ser a
principal moeda nos colchões de liquidez dos bancos centrais, mas sua
participação no total, que já vem caindo nos últimos anos, tende a diminuir
mais e dar espaço a outras moedas, em especial as asiáticas.
Nos últimos dez anos, as reservas internacionais globais
subiram mais de 350%, atingindo US$ 10,94 trilhões em dezembro, segundo o Fundo
Monetário Internacional (FMI). Apesar de o dólar seguir dominante, a parcela
alocada na divisa americana caiu quase dez pontos percentuais, de 71,6% para
61,9%. Essa participação foi parcialmente absorvida pelo euro, cuja
representatividade subiu de 19,7% para 23,9% e pelo grupo de "outras
moedas", assim denominadas pelo FMI, cuja fatia subiu de 1,3% para 6,1%. A
parcela do iene caiu de 4,4% para 3,9% e a da libra subiu de 2,7% para 4%.
A abertura das reservas alocadas no grupo "outras
moedas" não é divulgada pelo FMI, mas acredita-se que o maior peso esteja
em moedas de países da Ásia e da Oceania, como o won coreano, o dólar
australiano e o dólar neozelandês, e dos demais países do G-10 (grupo que reúne
dez das economias mais desenvolvidas do mundo).
Para Jan Dehn, codiretor de pesquisa da Ashmore, gestora
britânica especializada em mercados emergentes, as moedas mais beneficiadas
foram o dólar australiano, o canadense, o neozelandês e as coroas sueca e
norueguesa.
Marco Freire, diretor de renda fixa da gestora americana
Franklin Templeton, destaca que uma parcela relevante das reservas está na Ásia
e, dado o fortalecimento do comércio entre os países da região, "era de se
esperar o crescimento das reservas em moedas asiáticas". Ele aponta, além
do iene, o won coreano e o dólar australiano.
O renminbi chinês ainda não é forte nas reservas
internacionais devido aos controles de capital impostos pelo país. Por outro
lado, embora o banco central da China não divulgue a composição de suas
reservas, sabe-se que boa parte está alocada em dólares. O país é o maior
detentor de títulos da dívida americana. Segundo dados do Tesouro dos EUA, em
dezembro de 2012, a China possuía 22% do Treasuries americanos (US$ 1,22
trilhão), ante 9,6% há dez anos.
O aumento da participação de outras moedas nas reservas
internacionais globais não implica um encolhimento do volume absoluto em
dólares, que subiu 213% nos últimos dez anos. Os bancos centrais continuaram a
acumular depósitos em dólares, mas passaram a dar um espaço maior para outras
divisas. Esse comportamento é reflexo da ascensão de outras economias e da
maior liquidez oferecida por seus ativos. Para analistas, a queda da
participação da moeda americana é uma tendência. "A participação do dólar
vai atingir 50% das reservas e pode cair ainda mais. A diversificação se
pronunciará quando a inflação começar a subir nos Estados Unidos", afirma
Dehn, da Ashmore.
Para Lupin Rahman, vice-presidente-executiva do portfólio de
mercados emergentes da Pimco, a menor representatividade do dólar deve-se a um
fator estrutural e um cíclico. "O estrutural é a necessidade de
diversificar o portfólio para além do dólar, à medida que a economia global se
torna mais balanceada e passa a ser influenciada por outras regiões, como a China
e os mercados emergentes", diz.
O aspecto cíclico está relacionado às políticas de
afrouxamento monetário conduzidas por Federal Reserve, Banco Central Europeu
(BCE) e Banco do Japão, que causaram uma corrida por ativos com retornos mais
altos, e pelas "questões de crédito não resolvidas nos EUA e na Europa,
que estão levando os investidores a buscar alternativas" em outras
economias.
Freire, da Franklin Templeton, diz acreditar que essa seja
uma mudança estrutural. Porém, afirma que, mesmo com a diversificação, no longo
prazo o dólar ainda será a principal moeda nas reservas dos bancos centrais
"dada a importância geopolítica dos EUA e a liquidez dos seus
mercados".
Não há dados do FMI sobre parcela das reservas alocada em
real, já que a divisa brasileira faz parte do grupo "outras moedas".
No entanto, a participação da moeda brasileira ainda parece ser exígua.
"É difícil argumentar que os gestores de reservas
coloquem recursos em ativos denominados em reais, dada a proibitiva taxa de 6%
de IOF [Imposto sobre Operações Financeiras] cobrada em transações de renda
fixa. Isso está limitando significativamente a maturação do real como,
eventualmente, uma moeda de reserva", afirma Lupin, da Pimco.
Se a parcela das moedas emergentes nas reservas globais
ainda é baixa, o mesmo não pode ser dito de quem detém esses depósitos. Segundo
os dados do FMI, em dezembro, 66,3% das reservas globais pertenciam aos países
emergentes. Há dez anos, essa parcela era de 40%. Boa parte do crescimento
deve-se à China, cujas reservas internacionais contabilizavam US$ 3,31 trilhões
no fim do ano passado - 30% do total do mundo. Os Estados Unidos contavam com
US$ 148 bilhões; o Brasil, US$ 379 bilhões; a zona do euro, US$ 675 bilhões e o
Japão, US$ 1,26 trilhão.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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