Dentistas colocam pacientes em risco ao realizar cirurgias plásticas irregulares
Edson Silva, de 32 anos, foi uma das vítimas desses profissionais. Atraído pelo baixo custo do procedimento e pela inexistência de cortes, como os que acontecem na cirurgia plástica adequada, recorreu a um dentista para corrigir a curvatura exagerada de suas orelhas.
Cirurgias estéticas
realizadas em consultórios dentários estão causando um enorme transtorno a
pacientes que, muitas vezes, se confundem sobre qual o limite do trabalho
estético facial de profissionais de odontologia. Uma resolução do Conselho
Federal de Odontologia admite que dentistas apliquem toxina botulínica e outros
preenchedores faciais em procedimentos de beleza, com delimitação de
determinadas áreas da face. Entretanto esse limite tem sido ultrapassado
não só por dentistas, como por outros profissionais não habilitados na área de
saúde (farmacêuticos, biomédicos, fisioterapeutas, enfermeiros e esteticistas) que
têm se aventurado em “operar” orelhas, narizes e outras partes do rosto, o que
pode causar danos irreversíveis aos pacientes.
Edson Silva, de 32 anos, foi
uma das vítimas de um dentista. Atraído pelo baixo custo do procedimento e
pela inexistência de cortes, como os que acontecem na cirurgia plástica,
recorreu a um consultório dentário para corrigir a curvatura
exagerada de suas orelhas – as chamadas orelhas de abano. Percebeu o
erro durante a cirurgia, quando o “procedimento estético” que deveria durar
até 20 minutos, já havia passado de duas horas. O que aconteceu em seguida foi
ainda pior: Depois de sentir muita dor no local afetado, as orelhas
ficaram infladas e ainda mais chamativas. Insatisfeito com o resultado, pediu
uma revisão cirúrgica. Só piorou: além de ficarem mais estranhas, o abano
voltou totalmente em somente uma orelha. Em nova intervenção pediu a reversão
total da cirurgia com a retirada dos pontos. Mas o dentista não conseguiu
retirá-los, pois seria necessário fazer incisões. Ele conta que essa
situação causou trauma, aborrecimentos e mais gastos, já que teve que buscar
solução junto a um cirurgião plástico especializado.
A crescente procura por esses
profissionais decorre da ampla divulgação que não-médicos têm feito nas mídias
sociais com resultados de antes e depois. Os médicos, ao contrário, são
proibidos pelo Conselho Federal de Medicina de fazer este tipo de marketing.
Enquanto uns podem tudo, outros são cerceados pela lei e pelo código de ética
médica. Em geral, os pacientes desconhecem essas diferenças e passam a
acreditar que médicos não têm resultados para mostrar e que não-médicos, ao
contrário, são os profissionais corretos para realizar esses procedimentos.
Para burlar a
legislação e não serem enquadrados no exercício ilegal da
medicina, profissionais não habilitados prometem uma solução rápida,
barata, sem cortes e usam a criatividade. No caso da otoplastia, por
exemplo, uma busca na internet e já é possível encontrar serviços com nomes de
“harmonização das orelhas”, oto modelação, ear shutt, ear face, ear dream,
entre outros, oferecidos por dentistas ou não-médicos. Dessa forma, os
pacientes são confundidos, já que em todos os casos, trata-se de otoplastia –
cirurgia de correção da orelha de abano – que só pode ser realizada por
cirurgião plástico habilitado. Dentistas ainda se apoiam nas resoluções de 2016
e 2019 do CFO, que os autoriza a procedimentos estéticos não invasivos,
entretanto, trata-se apenas de harmonização facial e não podem ser feitos
cortes ou pontos nos pacientes, além de ter a área bem delimitada na face - do
osso hióide, na base da garganta, até o ponto násio, que são os ossos do nariz.
O cirurgião plástico Mauro
Speranzini conta que tem se tornado cada vez mais frequente que pacientes
procurem sua clínica, em São Paulo, em busca de consertar problemas estéticos
causados por cirurgias realizadas por profissionais não habilitados e explica
que, ao decidir por esse tipo de serviço clandestino, o paciente pode cair em
uma grande cilada e ter sérios problemas, além de precisar de um procedimento
reparador que, nem sempre conseguirá resolver o problema. “Uma cirurgia expõe o
paciente ao risco de reação alérgica, queda de pressão, infecção, sangramento e
quelóide em pessoas suscetíveis; quando feita por um profissional não
habilitado, esse risco pode ser ainda maior”, orienta o médico que emenda sobre
situações irreversíveis em maus resultados: “Dizer aos pacientes que fizeram
uma escolha errada e que as sequelas não podem ser reparadas, é devastador”.
Nova Resolução e penalidades
Depois de muitas denúncias ao
CFO, sobre profissionais que estariam extrapolando os limites de atuação,
especialmente na prática do que é popularmente conhecido como harmonização
facial, foi publicada no Diário Oficial da União, do último mês de maio, a
Resolução nº 237/2021, do Conselho Federal de Odontologia, que regulamenta a
possibilidade de suspensão cautelar das atividades do cirurgião-dentista, em
virtude da prática profissional que coloque em risco a saúde ou a integridade
física dos pacientes, ou que estejam na iminência de fazê-lo.
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