"PL de licença compulsória pode gerar instabilidade internacional e afetar a produção de medicamentos", avalia presidente da Interfarma
Para Elizabeth de Carvalhaes, primeira consequência seria a redução de investimento em Pesquisa e Desenvolvimento no país, afetando produtos de oncologia complexa, doenças raras, doenças crônicas e sistêmicas, bem como diabetes e doenças cardiopulmonares
São Paulo, setembro de 2021 - O Projeto de Lei 12/2021, que muda as
regras do licenciamento compulsório no Brasil, pode ter um efeito negativo no
combate à pandemia. O impasse acontece porque as patentes não estão registradas
no Brasil e isso pode gerar instabilidade no cenário internacional. Aprovado
pelo Congresso Nacional, o texto aguarda agora a sanção presidencial. A
presidência da República tem até esta quinta-feira (2) para decidir se veta ou
sanciona o PL.
A preocupação do setor farmacêutico está
nos percalços que a execução do PL, se sancionado, deve enfrentar, como a
dificuldade em desenvolver uma cópia das vacinas Covid-19 e a demora para
construir (ou adaptar) instalações industriais e ter uma equipe preparada nessa
nova ciência, principalmente se considerarmos as tecnologias mais inovadoras e
modernas.
Para a presidente da Interfarma,
Elizabeth de Carvalhaes, a motivação do PL foi a emergência sanitária causada
pela Covid-19, mas ele pode justamente atrapalhar o combate à pandemia.
“Naturalmente, se não tivesse a pandemia, essa proposta não ia estar em
discussão. Se a questão é a licença compulsória, não teria nenhuma necessidade
de nova legislação porque a Lei de Patentes brasileira e o Acordo Trips - do
qual Brasil é signatário, já preveem a licença compulsória de patentes”,
analisa.
De acordo com Elizabeth, a proposta traz
conteúdos impensáveis de execução, como a criação de lista de patentes sujeitas
a licença compulsória de ofício e a possibilidade de o Congresso Nacional
emitir essas licenças. Uma patente é uma proteção por tempo determinado para
uma ciência complexa, altamente custosa e de pesquisa prolongada. O processo de
análise é de extrema responsabilidade e cuidado.
“O PL 12/2021 é uma trava para o setor
farmacêutico. Uma patente não é para ser comercializada, determinada ou passar
por uma licença compulsória em um ambiente de debate altamente aberto como o
Congresso Nacional que todo mundo pode opinar. O que está acontecendo é um jogo
de interesses”, diz a presidente executiva da Interfarma.
Encomenda tecnológica
Para que a produção dos medicamentos
aconteça no Brasil - principalmente dos imunizantes mais modernos contra a
Covid-19 - é preciso que ocorra uma adaptação das instalações existentes ou até
mesmo o investimento em novas fábricas. Isso ocorreu com os institutos de
pesquisa nacionais, que já produzem vacinas para outras doenças.
O Butantã e a FioCruz tiveram que
preparar suas instalações para produzir os imunizantes. Chamada também de
encomenda tecnológica, esses repasses acontecem em diferentes níveis. Cada
contrato tem um tempo de análise, o que pode levar anos até que as vacinas
começam a ser comercializadas.
Um levantamento feito pela Interfarma,
aponta que nos últimos 27 anos, os laboratórios farmacêuticos foram capazes de
produzir apenas seis vacinas. “São pesquisas de muitos anos e muito custosas. A
vacina da Covid-19 surgiu com a união de todas as startups, institutos de
pesquisa e laboratórios farmacêuticos e investimentos mundiais”, explica.
Riscos
A flexibilização com a quebra das
patentes em solo brasileiro pode afetar as relações exteriores e investimentos
em parcerias, uma vez que, uma pesquisa leva anos para ter o produto em
circulação no mercado. Isso pode gerar uma crise no desenvolvimento dos
medicamentos, seja em laboratório público ou privado devido a fragilidade
nacional em que se encontraria a regulamentação das patentes no país.
“A primeira consequência seria a redução
de investimento do patenteado no país afetando produtos de oncologia complexa,
doenças raras, doenças crônicas e sistêmicas, diabetes, doenças
cardiopulmonares. Todo esse ramo será impactado em não trazer o medicamento
mais moderno para o país porque a lei nacional não estará de acordo com as
regras internacionais. É uma opção do inventor patentear seu produto. Patente
não é uma obrigação”, destaca a presidente da Interfarma.
Segundo Elizabeth, o PL 12 traz
insegurança jurídica e pode afetar novos acordos de transferência de tecnologia
ou parcerias, como os já realizados pela AstraZeneca e Pfizer/BioNTech.
“Estamos trabalhando intensamente e temos esperança e convicção de que o
presidente não proceda com essa sanção porque do ponto de vista jurídico e
temático não tem a menor condição de apoiar uma proposta dessa”, finaliza.
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