O que a perícia pode revelar sobre o desabamento da obra do Metrô?
As fortes
chuvas que atingiram o estado de São Paulo na última semana causaram mais de 30
mortes, 13 delas no deslizamento que aconteceu em Franco da Rocha. Outro caso
que chamou atenção foi o desabamento da obra da Linha 6-Laranja do Metrô, que
abriu uma cratera na pista local da Marginal Tietê. Em ambos os casos, a perícia
criminal foi acionada para analisar os locais e descobrir os responsáveis pelas
tragédias.
O presidente do Sindicato dos Peritos
Criminais do Estado de São Paulo (SINPCRESP), Eduardo Becker,
explica que a perícia utiliza diversos métodos para buscar as causas dos
deslizamentos e do incidente na Marginal. “Dependendo da situação e do local, pode ser utilizado um
drone e um scanner 3D para reproduzir o momento do ocorrido. No caso de Franco
da Rocha, por exemplo, parte dos exames foi realizada a bordo de um helicóptero
devido aos riscos”, afirma.
Já no caso do
desabamento na obra do Metrô, a investigação tende a ser mais complexa. “É pouco provável que a causa dos
deslizamentos de terra não seja a chuva e os imóveis construídos ilegalmente em
áreas de grande declive. Já no desabamento da obra, é preciso saber se, além da
chuva, não houve uma falha na operação de maquinário ou de projeto”,
avalia.
Segundo o
perito criminal, no desabamento do Metrô serão examinados os projetos, as
ordens de serviços, a existência ou não de filmagens de câmeras de segurança,
os cronogramas de acontecimentos, os depoimentos das testemunhas, filmagens da
mídia em geral, relatórios de índices pluviométricos, além de exames no local,
de eventuais máquinas e equipamentos que estavam sendo utilizados, exames de
solo (se necessário), entre outros. “Trata-se
de uma situação tão complexa que esses locais costumam ser atendidos por uma
equipe de peritos e não apenas um. Alguns desses profissionais são engenheiros
civis inclusive, e há outros com mais ou menos experiência, mas que contribuem
na discussão e elaboração desses laudos mais complexos”,
explica. “Muitas vezes
também são feitas consultas a órgãos como a USP, o IPT (Instituto de Pesquisas
Tecnológicas), a CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), além, é
claro, dos próprios laboratórios do Instituto de Criminalística (IC)”,
completa.
Asfalto
cedeu ao lado da obra do Metrô e abriu
cratera na Marginal Tietê
(Foto: Reprodução/Reuters)
Becker afirma
que, com tamanha complexidade, o resultado das análises pode demorar bastante. “Depende da dificuldade da análise de
toda a documentação disponibilizada, resultado de exames, discussões, e tudo
isso ainda esbarra no deficit de profissionais. São poucos servidores para
atender não somente a estes casos, mas a tantos outros que surgem diariamente”,
pontua. “Por isso é
difícil, em um primeiro momento, já determinar com precisão o que ocorreu, se
há outros culpados além da chuva, etc”.
Nos casos de
deslizamento de terra nos municípios, tudo indica que a causa foi mesmo
relacionada ao excesso de chuva em locais onde havia construções irregulares.
Já na obra do Metrô ocorreu um dano na tubulação de esgoto. “Mas os detalhes das dinâmicas dos
eventos só serão especificados mais adiante. No caso do Metrô, o alto índice
pluviométrico pode ter influenciado o acidente, mas pode ter ocorrido erro de
operação, falhas no projeto, falhas de execução, falhas geológicas, problemas
de construção, com materiais utilizados. Tudo junto, apenas alguns destes,
apenas um. Somente a perícia vai determinar com exatidão a dinâmica e as
causas”, conclui o presidente do SINPCRESP.
Falta de profissionais
O
presidente do SINPCRESP, Eduardo Becker, faz um alerta sobre o deficit de
profissionais que atinge todo o estado de São Paulo e prejudica o tempo de
conclusão dos laudos periciais. “Atualmente
estamos com um deficit de 15% de peritos criminais, além dos casos de
afastamento que vêm ocorrendo por causa da covid. A defasagem de profissionais
também é reflexo da falta de reajuste salarial, que faz com que percamos
pessoal para outros estados ou até para a iniciativa privada, que remuneram
melhor. Quem sofre com isso é a população, pois com cada vez mais casos para
serem periciados e cada vez menos servidores, o serviço oferecido acaba sendo
prejudicado e o tempo para conclusão de perícias aumenta”,
adverte.
Treinamento
É
necessário que o Estado promova a atualização constante e especialização dos
profissionais para estarem cada vez mais aptos a lidar com casos mais complexos
e acompanhar a evolução tecnológica. “É
preciso ofertar cursos especializados aos peritos criminais, inclusive fora do
estado e até do país, investimentos estes que hoje não são realizados. Os
cursos para a categoria são caros e os próprios servidores, com o salário
defasado, é quem precisam pagar por eles, o que muitas vezes não é possível”,
conclui Becker.
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