São Paulo tem mais de 500 rios subterrâneos, você sabia?
20% estão debaixo das casas e 10% sofreram
canalização, o que prejudica o meio ambiente
Amsterdam, cidade referência por usar
seus recursos hídricos como vias de deslocamento, tem 165 canais que totalizam
impressionantes 100 quilômetros de comprimento. A cidade de São Paulo, no
entanto, supera esse número: há quase 5 mil quilômetros de extensão de rios e
córregos, divididos em 286 bacias hidrográficas.
A razão pela qual os paulistanos veem
pouco ou quase nada das águas na selva de pedras é que cerca de 20% delas estão
debaixo de casas, edifícios e ruas, e outros 10% foram canalizados e tiveram
seu curso alterado, segundo a Fundação Centro Tecnológico de Hidráulica, ligada
à USP.
Ao todo, são 3 mil quilômetros de águas,
o equivalente a cerca de 300 a 500 rios, escondidos nos subterrâneos da
cidade.
O Vale do Anhangabaú, a avenida Nove de
Julho e a Bandeirantes são algumas das vias construídas sobre os rios. O Vale,
inclusive, recebe esse nome devido ao rio Anhangabaú, que nasce em um dos
símbolos de São Paulo: a Avenida Paulista.
Entre rios e córregos que existem na
cidade, é possível, literalmente, conhecer alguns - que foram regenerados com o
apoio popular - e desvendar aqueles que estão nas profundezas, mas que
continuam vivos apesar de tudo.
Córrego Pirarungáua (Ipiranga)
O Córrego Pirarungáua é um afluente do
Riacho do Ipiranga que foi canalizado há 70 anos. Ele fica localizado em uma
galeria no Jardim Botânico, no bairro do Ipiranga.
Em 2007, uma das paredes da galeria
cedeu, jogando luz sobre as águas límpidas do córrego novamente. A
administração do Jardim Botânico optou por revitalizar a área, introduzindo
espécies da Mata Atlântica e ameaçadas de extinção em suas margens.
No ano seguinte, a área foi reaberta ao
público e o ajudou a aumentar o número de visitantes do parque.
Córrego das Corujas (Vila Madalena)
Quem passa pela avenida das Corujas
encontra uma praça central onde se localiza este pequeno trecho de córrego
canalizado a céu aberto. Ele é limpo, não cheira mal e tem margens bastante
arborizadas, que funcionam como um sistema de contenção de enxurrada natural.
O córrego das Corujas passa por baixo de
uma simpática ponte e depois corre entre o fundo de algumas casas, até sumir
sob galerias que levam à foz do rio Pinheiros.
Após pressão dos moradores, a prefeitura
melhorou a estrutura do parque linear em volta do córrego. Hoje, o local é
ponto de encontro do bairro e já foi palco até mesmo de aniversários e
casamentos.
Rio Tamanduateí (Centro/Bom Retiro)
"Tamanduateí" é de origem tupi
e significa "rio dos tamanduás verdadeiros". O rio nasce em Mauá,
corta o ABC paulista e atravessa todo o centro de São Paulo, até desaguar no
rio Tietê, na região do Bom Retiro.
Na região central, o único vestígio que
sobrou da existência do rio Tamanduateí foi o nome de uma das vias, a Ladeira
Porto Geral. Até o início do século XX, havia de fato um porto no local, bem no
coração da capital. Por ele, chegaram as pedras usadas para erguer o Teatro
Municipal.
O cenário mudou quando o então prefeito
Antônio Prado determinou a alteração no curso do rio e a sua canalização.
Rio Saracura (Paulista/Bixiga/Centro/Bom
Retiro)
Atrás do finado hotel Maksoud Plaza, na
região da Avenida Paulista, está a principal nascente do rio Saracura. Nas
paredes das proximidades, é possível ver água vertendo pelas paredes - são as
águas do Saracura.
O rio corre em direção à escola de samba
Vai-Vai, no bairro do Bixiga - não à toa, um dos símbolos da alvinegra é a ave
saracura -, passa pelo centro e desemboca no rio Tamanduateí
Um dos únicos pontos da cidade em que é
possível observar o rio correndo é na avenida Nove de Julho, através de uma
grade no asfalto. Na avenida do Estado, ele corre a céu aberto, mas as muretas
laterais elevadas impedem que, no dia a dia, as pessoas saibam da presença do
rio.
Parque da Fonte do Peabiru (Butantã)
No cruzamento da Avenida Corifeu de
Azevedo Marques com a Rua Santanésia existe um terreno de 39 mil metros
quadrados com resquícios de Mata Atlântica e as nascentes do rio Peabiru.
O local guarda uma fonte histórica, que
foi usado como ponto de encontro por portugueses, espanhóis, bandeirantes,
jesuítas e tropeiros.
Há cerca de 15 anos, a comunidade local
busca transformar a área em um parque para preservar a natureza, manter as
características do local e evitar intervenções humanas, inclusive da
especulação imobiliária. Artistas estão envolvidos na causa, que ainda não teve
um desfecho.
Água à vista
Muito já se sabe sobre os impactos da
canalização dos rios. A ação interfere na natureza, no clima, no aquecimento
global e até mesmo na relação das pessoas com o meio ambiente.
A boa notícia é que a capital paulista
não é um caso perdido. Há exemplos bem sucedidos ao redor do mundo de
recuperação de rios urbanos.
Em Seul, na Coreia do Sul, o rio Cheong
Gye Cheon, que recebia o esgoto da cidade, foi canalizado na década de 50. Em
2003, um importante processo de reurbanização permitiu que as vias construídas
sobre o rio fossem implodidas e suas águas voltassem a correr livremente. Hoje,
o local é um dos principais pontos de lazer e turismo de Seul.
Se reproduzida no Brasil, com o auxílio de planejamento e equipamentos como bombas de água, a iniciativa pode trazer mais saúde para a população, contribuir para a sustentabilidade e até mesmo facilitar o transporte de cargas.
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